domingo, 9 de junho de 2013

Frei Chico lança dicionário com 8,5 mil verbetes sobre a religiosidade popular brasileira

Fonte: Estado de Minas (clique aqui)

 (Lira Marques/divulgação)Em 1967, quando frei Chico 
veio da Holanda para o Vale 
do Jequitinhonha, aquela região 
de Minas Gerais era considerada 
um dos três lugares mais pobres 
do mundo. 

Diante de tanta miséria, o holandês 
descobriu riqueza cultural sem 
precedentes. “Aquilo deu sentido à 
minha permanência no Brasil”, 
revela o frade franciscano. 

Em seus 10 anos como pároco da 
diocese de Araçuaí, ele contabilizou 
15 mil folhas de registros da cultura 
do povo relacionada à fé e à experiência 
espiritual. 
Somado a pesquisas realizadas na Europa, esse vasto material foi a base de um 
ambicioso projeto, o Dicionário da religiosidade popular: cultura e religião no Brasil. 

Com 1.150 páginas, a obra de referência chega agora ao público, reunindo 8,5 
mil verbetes, 6 mil notas de rodapé e 350 ilustrações.

Lançado pela Editora Nossa Cultura, o livro surgiu por acaso na vida de Francisco 
van der Poel, o popular frei Chico. “Para poder servir, havia de conhecer aquele povo”, 
resume ele. A inspiração veio do canto de Filó, a cozinheira da casa paroquial, 
em Araçuaí. Era algo belo e incomum. “Filó gostava de cantar e resolvi gravar as 
músicas em fitas cassete, as mesmas que serviram para o repertório do Coral dos 
Tangarás. 

Há 43 anos, tive a honra de fundar o grupo, que continua até hoje”, orgulha-se ele.

As viagens a municípios da região de Araçuaí – “em lombo de burro velho, nos fins 
de semana” – trouxeram novas descobertas. A amizade com a ceramista Maria 
Lira Marques está entre elas. “Lira abriu as portas da sabedoria popular para mim, 
o estrangeiro que acabara de chegar”, conta o religioso. 

Frei Chico viveu 10 anos naquela região. Nesse período, cuidou de registrar as 
peculiaridades do povo simples com olhar antropológico e visão humanista. “Quando 
cheguei a Araçuaí, tudo era tão diferente da minha terra, a língua, a cultura, a maneira 
de tratar as doenças... Ouvia aquela gente se referir a problemas de saúde como carne 
quebrada, vento virado, espinhela caída e mau-olhado. Comecei a ficar curioso”, diz frei 
Chico. Cada nova descoberta dava origem a uma anotação.

O Dicionário da religiosidade popular: cultura e religião no Brasil reúne essas descobertas. 
“Não tinha parâmetro para ele, não há outro livro parecido. Precisei inventar uma 
fórmula. Coloquei, por exemplo, todo o depoimento do povo – entrevistas, cantos e histórias 
– em itálico para o leitor perceber onde está a parte mais importante”, informa. À medida 
que o projeto ganhou consistência, o frade percebeu que em Minas não havia pesquisadores 
com interesse semelhante. 

A certeza do pioneirismo do dicionário se confirmou depois da aproximação de Chico com o 
folclorista Câmara Cascudo e com Carlos Rodrigues Brandão, antropólogo da Universidade 
de Campinas (Unicamp), responsável pela introdução do livro.

Inicialmente, frei Chico pensou em escrever um manual da religiosidade popular. Tentou 
esboçar algo nessa linha, mas concluiu que não seria possível sintetizar cultura tão vasta. 
Assim surgiu o dicionário. “A função do dicionarista não é resolver problemas, mas registrar. 
Aprendi que não é a lógica que manda, mas o bom senso e a busca de coerência. Preocupei-me 
não em fazer uma síntese, mas algo orgânico”, detalha. A intenção é conduzir o leitor por 
uma espécie de viagem rumo ao universo do povo. “As pessoas começam a ler e, de repente, 
já estão com os 10 dedos no dicionário, marcando links de interesses”, afirma.

Nos últimos 40 anos, frei Chico pesquisou dentro e fora do país assuntos ligados à cultura e fé 
popular. 
Chegou à Europa, vasculhou antigos arquivos de Portugal em busca de pistas que pudessem 
elucidar questões ligadas aos saberes do povo humilde do Vale do Jequitinhonha. “Consultei 
livros de história, de farmacopeia medieval e até de bruxaria. Reuni 2 mil volumes. Quando 
concluí o dicionário, doei esse material para a biblioteca da PUC Minas, em Belo Horizonte”, 
informa o frade.

A pesquisa demorou, mas o livro ficou do jeito que frei Chico sonhou. “Continuo dizendo: o 
resultado é apenas o começo do princípio de alguma coisa”, garante ele. “Passei por uma 
reciclagem de ideias. Deparei-me com saberes marcantes e eles mudaram a minha noção 
de historiografia, a maneira de me relacionar com Deus e com o próprio significado da 
palavra cultura.” Não é à toa que os verbetes preferidos dele explicam o significado de 
simples e de sabedoria.

DICIONÁRIO DA RELIGIOSIDADE POPULAR: CULTURA E RELIGIÃO NO BRASIL
De Francisco van der Poel (frei Chico) Ilustrações: Lira Marques. Editora Nossa Cultura, 

1.150 páginas, R$ 290
Informações: www.nossacultura.com.br
Frutos da terra
Publicado no Passadiço Virtual, de Diamantina

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