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quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Quanto vale a palavra de torturadores?

Quanto vale a palavra de torturadores?
Emir Sader* O Superior Tribunal Militar abriu o processo da Presidenta eleita, Dilma Rousseff, que um órgão da imprensa – aquele cuja executiva disse que a mídia é o partido político da oposição – buscava afoitamente na reta final da campanha eleitoral.

O que teremos nesse processo? A versão que os torturadores davam das suas vítimas, dos torturados. Essa mesma imprensa que reclamava, com razão, da censura, vai agora acreditar no que os verdugos diziam do crime monstruoso da tortura, que praticavam? E do comportamento das vitimas indefesas desse crime hediondo?

É como se levassem a sério o que os censores devem ter escrito sobre as publicações que censuravam e os jornalistas. Nós nunca os tomaríamos a sério, utilizamos os documentos da censura para denunciar ainda mais o obscurantismo da ditadura.
O processo tem que ser mais um instrumento de denúncia da tortura – crime imprescritível – e não instrumento de manipulação política justo do jornal que emprestou carros para que a órgãos da ditadura, disfarçados de jornalistas, cometessem suas atrocidades. O mesmo órgão que considerou que não tivemos uma ditadura, mas uma “ditabranda”.

O processo é um testemunho dos agentes do terror, daqueles que assaltaram pela força o Estado, destruíram a democracia e se apropriaram dos bens públicos para transformá-los em instrumentos dos crimes hediondos que cometeram – em nome da “democracia”.
Nas mãos de democratas, se transformará em mais uma prova da brutalidade dos crimes cometidos pela ditadura militar contra seus opositores. Nas mãos dos que foram complacentes e se beneficiaram da ditadura, será instrumento político torpe. A mídia que acreditar no que diziam os torturadores, será conivente com eles, ao invés de denunciar os crimes que eles cometeram.

Para os que se sujaram com a ditadura é insuportável que houve gente que se comportou com heroismo e dignidade. Querem enlamear a todos, porque se houve tanta gente que resistiu à ditadura, mesmo em condições limites, havia alternativa que não a conciliação e a conivência com a ditadura.
Em 18.11.2010

*Emir Sader é cientista político, professor universitário, um dos articulista do site Carta Maior.

Leia artigo e comentários no Carta Maior:
http://www.cartamaior.com.br/comentários

Comentários:
O artigo do professor Emir Sader faz referência ao acesso que o jornal Folha de S. Paulo teve à ficha completa de Dilma Roussef, durante a Ditadura Militar. Este mesmo jornal foi adversário ferrenho da presidenta eleita. Teme-se pelo uso político deste órgão de imprensa que serviu ao governo militar, nas décadas de 60 e 70, do século passado.

Se é para abrir os arquivos daqueles "anos de chumbo" eu também quero conhecer a minha ficha e o que eles escreveram sobre minhas atividades políticas. Que se abram todos os arquivos.

O Vale do Jequitinhonha e Mucuri teve vários presos políticos, torturados, executados ou exilados pela Ditadura Militar.

Os mais conhecidos foram o jornalista Nilmário Miranda, preso (Teófilo Otoni), o médico Apolo Heringer Lisboa e o estudante de arquitetura da UnB, José Prates, hoje prefeito (Salinas), exilados; e Idalísio Soares Aranha Filho (Rubim=MG), estudante executado e desaparecido na Guerrilha do Araguaia, em 1972.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Ditadura Militar: lembrar para não repetir jamais

Tristes lembranças da Ditadura Militar
31 de março de 1964: golpe militar, prisões, mortes e falta de liberdades.

"As nossas mortes não são nossas

são de vocês.

Elas terão o sentido que vocês lhes derem".

Do filme Lamentamos informar

A noite de 31 de março para 1º de abril foi uma das mais tenebrosas da história do Brasil. Até assumir um presidente civil, em 1985, o governo militar cometeu atrocidades, prendeu, matou, proibiu reuniões, manifestações, qualquer coisa que pudesse ter cheiro de liberdade.
Foram proibidos livros, revistas, jornais, comunicações que pregassem democracia, participação, solidariedade, justiça. As reuniões de grupos familiares, amigos e militantes políticos eram vigiadas.
Associações, Sindicatos, as pastorais da Igreja Católica, os movimentos de reivindicações. Tudo vigiado, pressionado, muitas vezes fechado.
Pessoalmente, cheguei em Belo Horizonte, em janeiro de 1970, e tive informações ainda piores das que chegavam pelo rádio, em Berilo e Minas Novas, no Vale do Jequitinhonha.
Matriculei-me no 1º ano de antigo científico do Colégio Estadual, no bairro Santo Antônio, onde o fervedor do movimento estudantil questionava os militares, os diretores e professores da escola que, segundo alguns alunos, eram agentes do DOPS, um órgão policial de vigilância política.
Participava de reuniões do Grêmio Estudantil, meio desconfiado e com receio de ser preso. Alguns meninos mais atrevidos sumiam da escola e o zum-zum-zum de desaparecido político rondavam em nossas cabeças e corações.
Aprendi novas lições, novos cantos, novas lutas.
Participava das manifestações de rua, contra o AI-5 ( lei militar que proibia tudo e ameaçava todo mundo), denunciando mortes, torturas, desaparecidos políticos, exílio de lideranças.
Trabalhador do Banco Real, entrei pro Sindicato dos Bancários. De leve, fomos nos organizando em um Grupo Cultural: cine-clube, teatro, exposição de artes, poesias e criações dos bancários.
Alguns filmes eram proibidos de serem vistos. Quando conseguíamos dobrar a polícia secreta e, atrevidamente, rodávamos os filmes, a película era roubada pela polícia federal.
Descobrimos dentro do nosso grupo de teatro um agente federal infiltrado e o expulsamos. Começamos a ser ainda mais perseguidos, ameaçados diretamente ou por telefonemas.
Ao entrar na faculdade em 76, caí no turbilhão político da FAFICH, na área de ciências humanas e sociais, a unidade de faculdades mais agitada da UFMG, em BH.
As idéias, as articulações, as agitações, as organizações fervilhavam ali mesmo. No murinho, nos DAs, nos Centro de Estudos, nas festas, nas reuniões infindáveis que varavam noite afora.
Nós, estudantes, fizemos o grande encontro de reorganização da UNE – União Nacional dos Estudantes, no Campus da Escola de Medicina, em um final de semana. Vieram quase mil estudantes de todo o Brasil. Quando achávamos que aquilo ali já era um começo de revolução democrática, o Exército, com a Polícia Federal e as polícias de Minas Gerais, cercaram tudo, prenderam as lideranças nacionais e os organizadores estaduais. Fizeram um corredor polonês, com saída pro Hospital Borges da Costa. Cada um de nós que passava levava pancadas e xingamentos de subversivos, comunistas, agitadores, filho da puta e outros nomes que não atrevíamos a contar para nossas mães.
Saímos pra rua e nos organizamos em passeata com gritos de Abaixo a Ditadura. Quando menos se esperava olha lá os tanques de guerra, as metralhadoras, os fuzis apontados pra nós, jovens que lutavam pelas liberdades democráticas.
Corríamos e entramos na Igreja São José. Criamos uma tática. Ao ser atacados apresentávamos a bandeira do Brasil como escudo protetor, como o toureiro se protege do touro. Os militares ensandecidos recuavam, assustados, com receio de ferir o símbolo da pátria.
E assim foi, o que muitos ainda não sabem. Meus filhos se assustam quando conto estas histórias. Incrédulos, não acreditam que tanta coisa fosse proibida de viver.
Cantamos:
“Caminhando e cantando e seguindo a canção,
somos todos iguais braços dados ou não.
Nos quartéis lhes ensinam antigas lições,
de morrer pela pátria e vive sem razão.
Vem, vamos embora que esperar não é saber,
quem sabe faz a hora não espera acontecer...”
Ouvíamos Caetano Veloso, Gilberto Gil, Elis Regina.
É claro, Geraldo Vandré.
Em 79, fizemos a primeira greve dos bancários na ditadura militar.
Antes, no dia 28 de julho de 79, no restaurante do Sindicato dos Bancários, em nossa mesa de almoço, o nosso líder Lula, metalúrgico de São Bernardo do Campo dizia: “ Sindicato pode pouca coisa pra conquistar direitos dos trabalhadores. Temos que organizar um partido nosso, que defenda os nossos interesses”. De toda forma, nos aconselhar a negociar até esgotar todos os recursos.
Na greve, pancadaria. Fechamos o Banco do Brasil. Os milicos ficaram brabos. Paritam pra cima da gente. Na rua Tamoios, pelotão de choque. Bombas de gás lacrimogêneo, cassetete, costela quebrada.
Fecharam o Sindicato, prenderam 4 líderes do Comitê de Greve. Escondi-me na casa de uma amiga.
No Vale do Jequitinhonha
No Vale do Jequitinhonha, muita gente era perseguida.

Zé Prates, atual prefeito de Salinas, estudante de Arquitetura da UnB, foi exilado pro Chile, após manifestação em frente à Embaixada dos Estados Unidos, em Brasília.
Apolo Lisboa, professor de Medicina da UFMG, também de Salinas, era exilado para a Argélia, na África.
Idalício Soares Aranha Filho foi assassinado na Guerrilha do Araguaia, em 1971. Ele era de Rubim, no Baixo Jequitinhonha. Estudou Psicologia, na UFMG, tendo sido liderança estudantil.
Nilmário Miranda, jornalista, de Teófilo Otoni, foi preso e torturado. Depois de 2 anos, foi solto.
Capitão, amigo de Inocêncio Leite, de Minas Novas, foi perseguido e assassinado pelo Exército, na Estrada Definitiva, perto do hoje Posto Chapadão.

Quem viveu e queria viver mais corria risco de morte.
A morte era a sina. Mas a vida saiu por cima.
Embora tantas mortes, tantos cortes.
Criamos o clima,
Da liberdade,
Da solidariedade,
Da manifestação,
Da libertação.
O jornalista Nilmário Miranda escreveu um livro que conta bem esta história de mortos e desaparecidos políticos dutante a Ditadura Militar. Dos filhos deste Solo é o nome do livro. De registro, documentário de páginas tristes da nossa história.
Os jovens têm muito a conhecer e aprender.