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quarta-feira, 8 de abril de 2020

Morre Ângelo Machado, o criativo escritor e professor da UFMG, durante seis décadas.



Morre o professor, entomologista e escritor Ângelo Machado

Dono de uma carreira singular, ele era uma das personalidades mais respeitadas da UFMG e da ciência brasileira

Ângelo Machado:


Ângelo Machado: relação de mais de seis décadas com a UFMGFoca Lisboa / UFMG

Morreu nesta segunda-feira, dia 6, aos 85 anos, em Belo Horizonte, o médico, professor, entomologista, ambientalista e escritor Ângelo Barbosa Monteiro Machado, uma das personalidades mais importantes da história da UFMG. Ele teve uma pneumonia aspirativa decorrente da aspiração de conteúdo gástrico para os pulmões. Seu corpo não será velado.
Ângelo Machado era professor emérito desde 2005. À época em que foi agraciado, ele declarou: "Tenho 52 anos de UFMG, pela qual sou um apaixonado. Esse título é muito importante para mim, pois vai me permitir continuar oficialmente na universidade de que gosto". Aposentado compulsoriamente em 2004, mantinha seu vínculo com a instituição como professor voluntário, recusando-se a ser incluído na categoria de "inativo". "Gosto de vir aqui todos os dias, entre outros motivos, porque o campus está cada vez mais lindo", declarou.
“O que falar sobre o professor Ângelo Machado, o que falar sobre essa pessoa encantadora, sobre esse médico, zoólogo, ambientalista, escritor, pesquisador e professor emérito da nossa Universidade? Como prestar uma homenagem à altura a essa pessoa adorável que sempre carregou consigo a marca da inventividade e da criatividade, do compromisso com a vida, com a ciência e com a UFMG, com a alegria? Ele deixa uma lacuna, um hiato na vida de todos nós, um espaço impossível de ser preenchido”, afirmou, emocionada, a reitora Sandra Regina Goulart Almeida. “Nosso compromisso é o de manter acesa a centelha inspiradora que nosso querido Ângelo nos deixa. Vamos sentir saudades, muitas saudades”, acrescentou.
Entre suas descobertas relevantes no campo da medicina, Ângelo Machado mudou, nos anos 1960, o conceito então existente sobre as lesões do sistema nervoso autônomo na doença de Chagas. Ângelo Machado também era escritor e dramaturgo, com cerca de cinco dezenas de obras publicadas, em sua maioria para crianças, e seis peças de teatro encenadas. Em 1993, ele foi agraciado com o Prêmio Jabuti.
O professor foi membro da Academia Brasileira de Ciências e da Academia Mineira de Letras, presidente do Conselho Curador da Fundação Biodiversitas, ONG especializada na conservação de espécies ameaçadas de extinção, e secretário regional e integrante do conselho da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

Charge do cartunista LOR (Luiz Oswaldo Rodrigues) em homenagem ao amigo Ângelo Machado
Ilustração do cartunista LOR (Luiz Oswaldo Rodrigues) em homenagem ao amigoLOR

PaixõesNa área de entomologia, Ângelo Machado dedicou-se ao estudo das libélulas, tendo descrito 98 espécies e 11 gêneros novos desses insetos. Foi homenageado com seu nome em 56 espécies de animais.
As libélulas, por sinal, eram uma das paixões do professor. Ele reuniu uma coleção com 35.250 exemplares de 1.052 espécies ao longo de seis décadas. Em 2015, doou o acervo à UFMG. Dono de um humor refinado, declarou, em entrevista à Revista Diversa, em 2008, que até então não tinha conseguido encaixar o inseto como protagonista de seus livros infantis. “Ela entra neles como o Hitchcock aparece em seus filmes”, brincou.
A outra paixão de sua vida era a esposa, a professora Conceição Machado, que conheceu na década de 1960. “Comecei a trabalhar com uma aluna, Conceição Ribeiro da Silva, e logo a gente descobriu que gostava um do outro. Fizemos um trabalho de namoro, de noivado, de filho, de neto (risos). Durante 30 anos, pesquisamos o sistema nervoso da Doença de Chagas. Depois, fui para a zoologia, e ela manteve o laboratório. Do ponto de vista científico, ela foi mais ativa que eu, formou 32 mestres e doutores. Mesmo atuando em áreas diferentes, a gente se ajudava. Mas, no final, a área dela foi complicando tanto que acabei me afastando de vez”, declarou ele, na mesma entrevista. Conceição Machado faleceu em 2007. Ângelo Machado deixou quatro filhos: Lúcia, Flávia, Paulo e Eduardo.
Ângelo Machado também dedicou seu talento e energia à popularização da ciência. No anos 1980, ele participou do grupo que elaborou o projeto da revista Ciência Hoje das Crianças. E foi no Laboratório de Entomologia, coordenado por ele no ICB, que, durante muitos anos, funcionou a sucursal mineira da Revista Ciência Hoje, comandada pelo jornalista Roberto Carvalho. 
Ângelo Machado foi meu professor de Anatomia Básica e Neuroanatomia , na Faculdade de Medicina, em 1976. Suas aulas eram de pura sabedoria, criativas, engraçadas, artísticas, de ensinamentos que marcaram nossas vidas de estudantes. Ele conseguia ensinar anatomia humana comparando com a natureza e sua paixão, as libélulas. Afirmava, com certeza científica: "onde vocês encontrarem uma libélula voando perto de uma fonte d'água, pode beber que a água é boa". Ele registrou essa passagem no seu belo livro "O menino e o rio". Ambientalista, grande defensor da vida, distribuía bom humor e alegria a toda hora. Por toda sua vida!
Divertido e midiático, Ângelo Machado concedeu várias entrevistas ao longo da vida. Eis algumas delas:

quarta-feira, 1 de abril de 2020

Líder indígena é assassinado no Maranhão, na Amazônia Real


A Secretaria de Direitos Humanos do Maranhão deslocou a Força Tarefa de Proteção a Vida Indígena (FT-Vida) para a proteção da Terra Indígena Arariboia (Foto arquivo pessoal)

Zezico Guajajara é assassinado no Maranhão

Por:  31/03/2020 às 15:53


Segundo informações apuradas pela Amazônia Real, Zezico Guajajara retornava à aldeia, em uma motocicleta quando foi alvejado por um tiro de espingarda. Ainda não há informação sobre o motivo do crime e quem é o assassino. Professor e diretor do Centro de Educação Escolar Indígena Azuru (também conhecida como Escola Zezinho Rodrigues), o líder Guajajara era também líder da Coordenação da Comissão dos Caciques e Lideranças da TI Arariboia (CCOCALITIA). Zezico assumiu a CCOCALITIA justamente nesta segunda-feira (30).
Zezico Rodrigues é o quinto indígena Guajajara assassinado em apenas quatro meses. No dia 1º de novembro, o Guardião da Floresta Paulo Paulino Guajajara foi assassinado também dentro da TI Arariboia. No dia 7 de dezembro, foram mortos os caciques Firmino Prexede Guajajara, da aldeia Silvino, da TI Cana Brava, e Raimundo Benício Guajajara, da aldeia Descendência, da TI Lagoa Comprida. No dia 13 de dezembro, o jovem Erisvan Guajajara, de 15 anos de idade, foi encontrado esquartejado na sede do município de Amarante.

Zezico Guajajara
Em novembro de 2019, Zezico Guajajara foi entrevistado pela agência Amazônia Real por ocasião do assassinato de Paulo Paulino Guajajara. Na reportagem, ele faz um relato sobre o histórico de ameaças e lembrou de outras lideranças Guajajara assassinadas nos últimos anos. Também destacou a respeito das várias denúncias feitas aos governos estadual e federal e solicitações de punições, nos últimos anos, sem obterem respostas.
“Ao longo desse período perdemos os guerreiros sem punições dos matadores. A Funai sabe toda a história, mas também sempre acobertou os casos, ou seja, não pediu maior investigação. Assim, os madeireiros foram pegando fôlego, devido não existir punições dos crimes”, afirmou a liderança na reportagem.
“As ameaças são quase contra todos nós, lideranças e caciques. O governo nunca tomou providências”, destacou Zezico.
A Coordenação da Fundação Nacional do Índio (Funai) do município de Arame, no Maranhão, solicitou no início da tarde desta terça-feira apoio urgente da Secretaria de Estado de Segurança Pública (SSP) para investigar o assassinato. A Funai no Maranhão também pediu apoio da Polícia Federal e da Força Nacional de Segurança. No entanto, a atuação da Força Nacional, conforme portaria do Ministério da Justiça do final do ano passado, restringe-se apenas a outro território indígena do Maranhão, a TI Cana Brava.

Sepultamento de Erisvan Soares Guajajara em Amarante do Maranhão no dia 13 de dezembro (Foto cedida pela família)

A Secretaria de Estado Direitos Humanos e Participação Popular do Maranhão (Sedihpop) disse, em nota à imprensa, que “lamenta o fato” e que já foram adotadas as providências legalmente possíveis para a esfera estadual. A Sedihpopo informou que acionou a Força Tarefa de Proteção a Vida Indígena (FT-Vida), órgão do governo do Maranhão, com o imediato deslocamento de equipes para a terra indígena. “Ao mesmo tempo, a Polícia Federal está sendo contatada para que assuma a investigação, em face de sua competência legal”, diz a nota.
Os indígenas Guajajara, autodenominados Tenetehára, habitam mais de 11 territórios indígenas na margem oriental do Maranhão; o maior deles é Arariboia. Eles têm uma história de contato com a sociedade não indígena de quase 400 anos marcada por revolta e tragédias. Possuem uma língua que faz parte do tronco Tupi-Guarani e sua população atual é estimada em mais de 27 mil pessoas.
Procurada, a assessoria de imprensa da Polícia Federal no Maranhão enviou nota à reportagem dizendo que “a respeito da morte do indígena Zezico Rodrigues Guajajara, a Polícia Federal foi acionada e irá apurar os fatos por meio da abertura de um Inquérito Policial”.
A assessoria de imprensa do Ministério da Justiça também foi procurada para saber se o órgão ou o ministro Sérgio Moro iriam comentar sobre o caso. A assessoria não fez enviou respostas a respeito. Sobre o pedido da Força Nacional de Segurança Pública, a assessoria do MJ disse que “não chegou nenhuma solicitação de apoio”.
Em nota divulgada em seu site na internet, o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) lamentou o assassinato e diz que “com o assassinato de Zezico Rodrigues, o número de homicídios registrados contra indígenas do povo Guajajara desde o ano 2000 chega a 49 – sendo 48 deles no Maranhão e um no Pará.”
“A situação vivenciada pelo povo Guajajara é trágica e exemplar em relação ao contexto de vulnerabilidade a que muitas comunidades indígenas estão expostas em todo o Brasil – mesmo as que vivem em terras já demarcadas e, em tese, contam com a proteção do Estado”, diz o CIMI. (Colaboraram Erisvan Guajajara e Kátia Brasil).

quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

Mortos, não pela chuva, mas pela injustiça social

 Frei * 
                                                                                     Foto: Douglas Magno / AFP


No final da penúltima semana de janeiro de 2020, choveu significativamente em várias regiões de Minas Gerais. Em 24 horas, choveu 171,8 milímetros. Chuva mansa, mas constante. Houve uma enorme mobilização da grande imprensa e de poderes públicos municipais de muitos municípios no sentido de alertar a população de que estava chegando uma grande chuva que poderia causar inundações, deslizamentos e pôr em risco a vida das pessoas.

Em Belo Horizonte, a defesa civil anunciou alerta de risco geológico e chegou-se a pedir insistentemente para as pessoas ficarem em casa dia 24 de janeiro. Muitas avenidas foram interditadas.

Segundo a Defesa Civil do Governo de Minas Gerais, em Boletim de 28/01, com o título “Mortes causadas pelas chuvas em MG”, em alguns dias de chuva: 28.893 pessoas foram desalojadas, 4.397 desabrigadas, 65 feridas, 52 foram mortas e mais de 10 estão desaparecidas , o que, segundo o boletim, são óbitos a serem confirmados. Em Belo Horizonte, entre os 13 mortos, uma mãe e três crianças. Em Ibirité, uma mãe foi encontrada morta, nos seus braços um bebê também morto.
Diante dos deslizamentos de terra, das inundações provocadas pelas chuvas, de quase 14 mil desalojados, de mais de 3 mil desabrigados, de 12 pessoas feridas e mais de 40 pessoas mortas – sem contar 19 pessoas desaparecidas -, primeiro, expressamos nossa solidariedade e conclamamos a quem puder se somar ao mutirão de apoio para ajudar as milhares de famílias atingidas e muitas golpeadas a reconquistar o mínimo necessário para erguer a cabeça e retomar a vida.
Entretanto, para que a mentira não continue cobrindo as causas mais profundas da ‘sexta-feira da paixão’ que se abate sobre o povo cada vez mais com frequência, precisamos dizer em alto e bom som a verdade, cientes de que a verdade dói, mas liberta.

É mentira a manchete divulgada pela Defesa Civil – “Mortes causadas pelas chuvas em MG”. É nojento ouvir jornalistas na grande imprensa dizerem: “a chuva está castigando …”. “A chuva está causando estragos …” Diante dos mortos, das vítimas e de milhares de desabrigados aparentemente pelas chuvas, é imoral e covarde ouvir prefeitos dando uma de Pilatos, tentando se eximir de suas responsabilidades, afirmando que “foi uma tragédia ambiental natural”, “Cada um deve cuidar da sua casa”, “Invadiram áreas de riscos. Eles são os culpados”. Fazer esse tipo de afirmação é apunhalar quem já foi golpeado, é transformar a vítima em algoz. É injustiça que clama aos céus.
Não é a chuva e nem Deus que devem ser condenados. Colocar a culpa na chuva e em Deus é encobrir o real escamoteamento a verdade, é criar uma cortina de fumaça que ofusca a realidade beneficiando somente os adoradores do capitalismo – grandes empresários da cidade e do campo, políticos profissionais (uma corja) e ingênuos sustentadores da engrenagem mortífera que continua a trucidar vidas em progressão geométrica em uma sociedade cada vez mais desigual.
Na Bíblia se fala de chuva mais de cem vezes. A chuva é benfazeja, cai sobre justos e injustos, diz o evangelho de Mateus (Mateus 5,45). A chuva é reflexo da bondade de Deus, que é um mistério de infinito amor. Deus rega com a chuva a terra que deu como herança ao seu povo (I Reis 8,36). “Mandarei chuva no tempo certo e será uma chuva abençoada” (Ezequiel 34,26), profetiza Ezequiel consolando o povo em tempos de imperialismo e de exílio, em tempos de escassez de chuva. A sabedoria do povo da Bíblia reconhece que Deus, solidário e libertador, “por meio da chuva, alimenta os povos, dando-lhes comida abundante” (Jó 36,31). Até no dilúvio, a chuva é vista como purificadora (Cf. Gênesis 6 a 9). Sob o imperialismo dos faraós no Egito, a chuva de granizo é vista como uma praga que fustiga os opressores, ao mesmo tempo em que é uma dádiva de Deus que liberta da opressão (Cf. Gênesis 9 e 10).
A chuva não castiga, não desaloja, não desabriga e nem mata ninguém. Quem está em casa com boa estrutura, construída sobre terra firme, pode dormir tranquilo, porque a casa não cairá com as chuvas. Sempre recordo que, 50 anos atrás, quando eu era criança, no noroeste de Minas Gerais, “chovia invernado uma semana, duas semanas, às vezes, até um mês sem parar”. Não morria praticamente ninguém. Nas décadas de 1970, a maior parte do povo vivia no campo e podia construir as casas longe das margens dos rios que ficavam inundadas. Atualmente, só em Belo Horizonte há mais de 200 rios e córregos sepultados com asfalto, após serem envenenados com esgoto in natura.
A irmã chuva apenas revela uma injustiça socioeconômica e política existente. Quem desaloja, desabriga, fere e mata em última instância é a tremenda injustiça agrária e socioambiental reinante na sociedade capitalista. Dizer que “a chuva castiga” é mentira, é reducionismo que esconde o maior responsável por tanta dor e tanto pranto: o sistema capitalista e a classe dominante que descartam as pessoas e as condenam a sobreviverem em encostas e áreas de risco. Soma-se a tudo isto a falta de planejamento urbano e social das prefeituras, que deveriam investir de forma contundente na elaboração de Plano Diretor e de zoneamento para as cidades de forma participativa e comunitária, buscando construir cidades justas economicamente, solidária socialmente e sustentável ecologicamente. Sem uma gestão socioambiental, os municípios continuarão destruindo as matas ciliares de rios e desmatando as suas encostas, fragilizando o solo, causando deslizamentos e assoreamentos, que tendem a ser cada vez mais trágicos.
 Quem é atingido quando a chuva chega em um volume maior, salvo exceções, são as famílias que tiveram seus direitos humanos fundamentais – direito à terra, à moradia, ao trabalho, à educação, a um salário justo, ao meio ambiente equilibrado e à dignidade – desrespeitados pelo capitalismo neoliberal e por pessoas que adoram o deus capital, o maior ídolo da atualidade.
Segundo o Comitê sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU em seu Comentário 4, todas as pessoas têm o direito a uma moradia SEGURA E ADEQUADA, abaixo especificada:
  1.  Segurança da posse: a moradia não é adequada se os seus ocupantes não têm um grau de segurança de posse que garanta a proteção legal contra despejos forçados, perseguição e outras ameaças.
  2.  Disponibilidade de serviços, materiais, instalações e infraestrutura: a moradia não é adequada, se os seus ocupantes não têm água potável, saneamento básico, energia para cozinhar, aquecimento, iluminação, armazenamento de alimentos ou coleta de lixo.
  3. Economicidade: a moradia não é adequada, se o seu custo ameaça ou compromete o exercício de outros direitos humanos dos ocupantes.
  4.  Habitabilidade: a moradia não é adequada se não garantir a segurança física e estrutural proporcionando um espaço adequado, bem como proteção contra o frio, umidade, calor, chuva, vento, outras ameaças à saúde.
  5.  Acessibilidade: a moradia não é adequada se as necessidades específicas dos grupos desfavorecidos e marginalizados não são levados em conta.
  6. Localização: a moradia não é adequada se for isolada de oportunidades de emprego, serviços de saúde, escolas, creches e outras instalações sociais ou, se localizados em áreas poluídas ou perigosas.
  7.  Adequação cultural: a moradia não é adequada se não respeitar e levar em conta a expressão da identidade cultural (UNITED NATIONS, 1991).
Portanto, quem desaloja, desabriga e mata não é a chuva, não é Deus, mas é a injustiça social reproduzida cotidianamente no Brasil, que gera uma tremenda desigualdade social e empurra milhões para sobreviver em áreas de risco geológico. Quem construiu um barraco em área de risco geológico antes foi empurrado para risco social.
Logo, gratidão eterna à irmã chuva que gera vida e ao Deus da vida, mas ira santa e rebeldia diante do sistema capitalista e seus executivos que de fato desabrigam, golpeiam e matam. É hilariante ouvir um prefeito ‘lavar as mãos’ sujas de sangue e dizer que “cada um deve cuidar de sua casa”. Autoridades políticas só podem dizer isso após construírem moradia digna – SEGURA e ADEQUADA – para 7 milhões de famílias que estão sem moradia no Brasil. Enfim, após fazerem reforma agrária e reforma urbana.

Em Belo Horizonte e Região Metropolitana, onde mais vidas foram ceifadas (13 em Belo Horizonte, 6 em Betim, 5 em Ibirité e 2 em Contagem) há um déficit habitacional acima de 150 mil moradias. Além de fertilizar a terra e recarregar as nascentes e mananciais, a irmã chuva está gritando por políticas públicas sérias e idôneas, tais como política agrária e política de moradia popular adequada para todos/as.
Belo Horizonte, MG, 28/01/2020.
Fone: gilvander.org.br
Resultado de imagem para Frei Gilvander*Gilvander Luís Moreira, ou simplesmente, Frei Gilvander, é mineiro do Alto Paranaíba. Frei e padre da Ordem dos Carmelitas. Licenciado e bacharelado em Filosofia na UFPR. Bacharelado em Teologia pelo Instituto Teológico São Paulo. Mestrado pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma. Doutor em Educação pela FAE/UFMG. Trabalha na CPT-MG.

BH foi preparada para ter enchentes todo ano. Quem se atreve a mudar o modelo de urbanização?

Históricos são os erros da 

nossa urbanização e não as

chuvas desse janeiro de 2020


Foto: Reprodução PSTU
O volume
 inédito de água caindo do céu só exacerbou o problema, não o criou. Enchentes e alagamentos ocorrem há décadas no início do ano em Belo Horizonte e vários outras cidades, mineiras e brasileiras. Os danos e as vítimas variam a cada ano conforme o índice pluviométrico, mas nunca deixaram de existir; são previsíveis, fatídicos. Por que? Qual cidade do porte de BH em outra parte do mundo que alaga todo período chuvoso? É óbvio que o problema resulta da ação humana. Históricos são os erros da nossa urbanização e não as chuvas desse janeiro de 2020.
O modelo urbano que adotamos é anti-ambiental; nossas cidades agridem a natureza. Brasileiro cimenta terreiro para não ter o trabalho de limpá-lo; prefere asfalto à pedra para rodar melhor de carro; constrói até prédios à margem de cursos de água; joga lixo nas vias pública sem a menor vergonha; tem verdadeira adoração por concreto, que vê como solução para tudo, inclusive para canalizar rios e ‘dominar’ a natureza. Via de regra a cidade brasileira é pouco permeável à infiltração da chuva no solo, acumula lixo nas saídas de água e tem edificações em áreas de risco. Nossas cidades são feitas para alagar.
Por que insistimos num modelo de urbanização que causa tragédias ano após ano? Por que é tão difícil romper, mudar o padrão de urbanização?
O brasileiro comum não percebe mas o nosso modelo urbano se destaca pelo nível absurdo de verticalização e adensamento. No Brasil, até cidades pequenas se enchem de prédios; as aglomerações de torres pipocam por todas as regiões de todos os estados, inclusive em plena Amazônia. Difícil apontar um país no mundo que tenha tantas cidades com ‘selvas de pedra’ no centro. E haja concreto, cimento.
Essa paixão brasileira pela verticalização é fruto da profunda divisão social no país e da insegurança crônica que ela gera. As pessoas buscam torres de apartamentos para isolamento social e proteção contra violência urbana. Mas, independente das razões, o modelo de urbanização que se desenvolveu aqui tem raízes no preconceito e no medo que há séculos formam um fosso entre os mais ricos e os mais pobres. Por isso é tão difícil mudar.
E rasguem-se os véus da hipocrisia. Enchente é tragédia típica de pobre; raramente afeta famílias com dinheiro para se precaver delas. E como pobre não tem prioridade no poder público, o problema se eterniza. A classe média que determina as políticas do Estado não se dispõe a romper o modelo urbano da exclusão social para evitar a tragédia anual de pobres.
A comoção e indignação diante das imagens chocantes dos estragos das águas são de praxe na mídia e redes sociais, tão recorrentes como as próprias enchentes. Vão embora junto com as chuvas. No carnaval, se o tempo ajudar, tudo já estará esquecido. E todos continuarão concretando e cimentando, espalhando lixo e entulho, até as próximas chuvas e enchentes. É um círculo vicioso. Hoje, infelizmente, sem um fim à vista.

Fonte: https://osnovosinconfidentes.com.br/
Raquel Faria
Raquel Faria
Criadora da rede Os Novos Inconfidentes, formou-se em
jornalismo pela PUC-MG e trabalhou nos jornais Folha de 
S. Paulo e Estado de Minas, além de colaborar para várias 
publicações. Ex-colunista do jornal O Tempo e ex-comentarista 
da rádio Super Notícias FM.

domingo, 12 de janeiro de 2020

Capelinha: 20 pássaros silvestres são apreendidos, conduzidos para Nova Serrana

Aves estavam acomodadas em tubos de PVC


Pássaros silvestres são apreendidos na BR-262 com motociclistas — Foto: PRF Bom Despacho/Divulgação
Vinte pássaros silvestres foram apreendidos na BR-262, em Nova Serrana, região Central de Minas, neste sábado, 11/01. De acordo com a Polícia Rodoviária Federal (PRF), as aves eram transportas por duas pessoas em uma moto.
O veículo foi parado pelos agentes em uma fiscalização de rotina na rodovia. No momento da abordagem, verificou-se que o passageiro, um homem de 50 anos, segurava um volume grande de embalagens de papelão e tubos de PVC.
Aves estavam sendo transportas dentro de tubos de PVC — Foto: Polícia Rodoviária Federal/ Divulgação
Quando os policiais pediram para verificar o que estava sendo transportado, descobriram 11 trinca-ferros, dois papa-capins, um azulão e seis sabiás laranjeira dentro das embalagens. O homem disse que as aves eram levadas de Capelinha, no Vale do Jequitinhonha, para Nova Serrana.
As aves foram encaminhadas para a Polícia Militar de Meio Ambiente e o homem foi multado.

domingo, 5 de janeiro de 2020

Morre, aos 99 anos, Ana Maria Primavesi, pioneira da agroecologia no Brasil

Ao compreender o solo como um organismo vivo, a autora foi responsável por avanços no manejo ecológico na agricultura.

Ana Maria Primavesi, pioneira da agroecologia no Brasil, morreu aos 99 anos / Reprodução

A engenheira agrônoma Ana Maria Primavesi, referência mundial em agroecologia e pioneira do tema no Brasil, morreu neste domingo (05.01) em decorrência de problemas cardíacos. O centenário da pesquisadora, nascida em 3 de outubro, seria celebrado em 2020. Ela defende a compreensão do solo como um organismo vivo e foi responsável por avanços nos estudos sobre o manejo ecológico do solo.
O velório e o enterro ocorrem a partir das 10h no Cemitério de Congonhas, no Jardim Marajoara, em São Paulo. O sepultamento será às 16h30.
Ao participar da segunda edição da Feira Nacional da Reforma Agrária, em 2017, na capital paulista, a autora defendeu a relação entre homem e meio ambiente. "Sem a natureza não existimos mais, ela é a base da nossa vida. Lutar pela terra, lutar pelas plantas, lutar pela agricultura, porque se não vivermos dentro da agricultora, vamos acabar. Não tem vida que continue sem terra, sem agricultura", declarou enquanto autografava livros.
Trajetória 
Primavesi nasceu e cresceu na Áustria, onde adquiriu os primeiros conhecimentos no tema com os pais agricultores. Perseguida pelo nazismo, ela foi presa em um campo de concentração durante a Segunda Guerra Mundial. 
Nos anos 50, veio para o Brasil, onde iniciou a carreira acadêmica e a atuação militante. Nessa época, a chamada 'Revolução Verde' disseminava novas práticas agrícolas que levaram ao crescimento desenfreado do agronegócio nos Estados Unidos e na Europa. 
No Brasil, Primavesi foi professora da Universidade Federal de Santa Maria, onde contribuiu para a organização do primeiro curso de pós-graduação em agricultura orgânica.
Foi também fundadora da Associação da Agricultora Orgânica (AOO) e ao longo de sua carreira recebeu uma série de prêmios, como o One World Award, da Federação Internacional dos Movimentos da Agricultura Orgânica (IFOAM).
Em entrevista ao Brasil de Fato em 2017, Carin Primavesi Silveira, filha da escritora, falou sobre a resistência da mãe ao longo da história ao desafiar a lógica do capital na agricultura.
“Teve muita resistência. Ela foi muito atacada. Agora, o que acontece? A evidência é o que a natureza está mostrando, porque a gente não pode ser contra a natureza, nós dependemos dela. Temos que trabalhar em comunhão com a natureza”, disse à reportagem.
Obras
Entre as obras de Primavesi, estão "A Convenção dos Ventos - Agroecologia em contos", "Manual do Solo Vivo", e "Manual Ecológico de Pragas e Doenças", as quais fazem parte de coleção da editora Expressão Popular. 
A biografia da agrônoma, "Ana Maria Primavesi - Histórias de Vida e Agroecologia", escrito pela também agrônoma Virgínia Mendonça Knabben, também foi publicado pela editora.
Em 2018, a Knabben lançou, no dia 3 de outubro, um site dedicado à autora: anamariaprimavesi.com.br.
Homenagens
Nas redes sociais, o deputado federal João Daniel (PT-SE) declarou: "Uma grande estudiosa, amou a natureza, cuidou da vida, estará presente sempre e merece todas as homenagens. Sempre estará presente". 
João Paulo Rodrigues, dirigente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), lamentou a morte da escritora. "É com muita tristeza que nós, do MST, recebemos a notícia do falecimento de nossa querida Ana Maria Primavesi, nossa maior estudiosa em solos e Agroecologia, a maior especialista em solos do mundo. Vai em paz e o MST continuará a defender o seu legado, cuidando da nossa terra."
Em nota, o MST afirmou que em frases como “não existe solo rico ou pobre; existe solo vivo ou morto”, a pesquisadora "ensinou ao homem e a mulher do campo e, com isso, plantou sementes em cada canto deste chão". O movimento diz ainda que "seguirá seu legado e seus ensinamentos na luta pela Reforma Agrária Popular e pela agroecologia".
Fonte: BrasildeFato - 05.01.2020