sábado, 13 de outubro de 2012

A democracia em migalhas


A democracia além do simples ato de votar

Por Alexandre Macedo
Ao iniciar este texto, coincidentemente, ouço a canção “Blues do elevador” do artista maranhense Zeca Baleiro numa rádio FM, que diz assim: “Vejo os pombos no asfalto/ 
eles sabem voar alto/ mas insistem em catar as migalhas do chão”. Paro um pouco e 
reflito sobre a clara e evidente comparação possível de ser realizada entre o pombo e o
cidadão. 

Na letra dessa canção, o músico denota que os pombos, embora sejam pássaros com
alto potencial de voo e podendo chegar a grandes alturas, ficam na maioria do tempo, 
catando migalhas e restos jogados no chão. Se refletirmos bem, o mesmo acontece 
com nós cidadãos e cidadãs. Vamos às provas.

Na Constituição Federal do Brasil, promulgada no ano de 1988, o parágrafo único 
estabelece que “todo poder emana do povo”. Mas, nós brasileiros, ainda não 
entendemos claramente o significado disso. O poder, na prática, não emana do povo 
e sim dos nossos representantes políticos, justo eles que deveriam se curvar perante
as exigências da população. Na realidade, vivemos uma espécie de inversão em nossa
lógica democrática. O povo que deveria possuir o poder se vê refém dos 
representantes políticos, quando, na verdade, deveria ocorrer o inverso. 

Para entender melhor o lugar que nossos representantes políticos ocupam no processo, 
basta analisarmos o exemplo das eleições municipais. Na campanha eleitoral, todos
os candidatos ao cargo de vereador e prefeito se humilham perante o povo; mendigam 
votos, dão abraços, cumprimentam do outro lado da rua, etc. Neste momento, eles 
reconhecem o quanto são frágeis e dependentes do povo, afinal é o povo que tem o poder 
para elegê-los por meio do voto. 

Quando passam as eleições, essa lógica se inverte, e então, o vereador e o prefeito passam 
a ser “autoridades” e o povo, aquele que deveria ditar como deseja a administração da 
cidade, se torna receptor da “boa vontade” e favores daqueles que ele próprio elegeu. 
Resulta-se no fato de que, ao invés de “empregados” do povo, os representantes políticos
se comportam como se fossem “patrões”. Com certeza, tem alguma coisa errada nesta 
história. 
Mas, afinal, de quem é a culpa? 

Parece estranho, mas se analisarmos minuciosamente, a parcela de culpa da sociedade 
civil é muito maior do que a dos representantes políticos. O que acontece, na verdade, é 
que nós cidadã(o)s assistimos “bestializados” a tudo que acontece na Política sem, sequer, 
nos movermos quanto aos acontecimentos. A Constituição nos dá o direito de exercer o 
poder, mas nós cidadã(o)s simplesmente delegamos equivocadamente todo este 
poder unicamente aos nossos representantes. Sendo assim, como eles atenderão 
nossas necessidades sendo que não ditamos a eles o que verdadeiramente queremos? 
Em “democracias” onde só os representantes políticos administram, na maioria das vezes, 
que sobra são somente as migalhas ao povo. 

Numa simples comparação, seria o mesmo caso de um empresário que tivesse uma 
grande empresa nunca fosse visitá-la para realizar o balanço, fiscalizar as entradas e 
saídas de verbas da conta corrente, etc., e deixasse todo o controle nas mãos dos 
empregados. O que aconteceria? Será que a empresa iria prosperar? Claro que não! 
A mesma lógica acontece também em uma cidade. Sendo assim, a Prefeitura é a “empresa” 
e os secretários, prefeito e outros servidores são os “empregados”, e o “dono” da empresa
é o povo. É com o dinheiro dos altos impostos inclusos nos preços dos alimentos, da 
energia elétrica, da água e de tudo que consumimos é que essa “empresa” funciona. 

Se nós cidadã(o)s, verdadeiros “dono(a)s”, não começarmos a fiscalizar e a ditar a 
maneira como a “empresa” deve funcionar, ela logo mostrará os sinais de falência e 
perderá sua capacidade de produção. Assim também acontece com a democracia. Tal 
palavra deriva-se de dois termos gregos, demos: povo e cracia: poder, ou seja, 
“democracia” significa “poder do povo” e esta é a forma assegurada na Constituição 
na qual deve se basear as relações políticas no Brasil enquanto república. Diante disso, 
cabe a nós cidadã(o)s o interesse de exercer ou não tal poder.

Mais uma eleição se aproxima e a pergunta que fica é: O que mudará nos próximos anos? 
A resposta é: Depende. Se assistirmos mais uma administração passar sem 
participarmos diretamente das decisões, o ritmo lento do desenvolvimento irá persistir. 
Agora, se pelo contrário, nós cidadã(o)s participarmos diretamente, o progresso 
e desenvolvimento de todos os setores é certo, pois ao invés de um pequeno número governar 
a cidade, com a participação do povo, mais problemas serão discutidos, mais soluções 
serão elaboradas e, com certeza, mais rapidamente as questões serão resolvidas. Desta forma, 
o trabalho dos nossos representantes será mais atentamente acompanhado, fiscalizaremos 
de perto nosso dinheiro público e contribuiremos para que nossas cidades tenham 
educação, saúde, saneamento, habitação, lazer, cultura e outras coisas com muito 
mais qualidade. 

Para finalizar, podemos refletir sobre um grave problema que incomoda a 
muitos, principalmente nas cidades pequenas. Falo do “rateio das secretarias”. Será que 
já paramos para pensar em quais são os critérios usados para eleger a pessoa que irá 
comandar uma secretaria? Isso é um assunto sério e que merece nossa total atenção, pois 
o que vemos, a cada quatro anos, é que as pessoas que comandam as secretarias, em
sua maioria, nada conhecem sobre os cargos que lhes são atribuídos. É comum vermos pessoas 
à frente de secretarias do meio ambiente, de obras, da assistência social, cultura, etc., que 
nada conhecem sobre o assunto. Estão lá apenas sendo compensados por favores 
eleitoreiros. Isso deveria ser inadmissível, pois as secretarias são importantes instâncias 
da administração pública por fazerem parte do Poder Executivo. 

Perante a isso devemos nos perguntar: O que a cidade ganha quando uma pessoa assume 
a pasta de uma secretaria sem ter a qualificação necessária para assumir tal cargo? Será que 
o correto não seria que o cargo de secretário (a) fosse preenchido apenas por pessoas 
que fossem profissionais? Trocando em miúdos, será que um pedreiro conseguiria assumir 
a secretaria de meio ambiente? Será que um açougueiro teria qualificação suficiente 
para assumir uma secretaria de saúde? E mais, será que o justo não seria que tais secretário
(a)s fossem indicados pela coligação antes das eleições? Afinal, um(a) prefeito(a) não 
governa sozinho(a) e é importante que o povo saiba quem serão os secretários do Executivo. 
Na verdade, o que adianta ter um bom prefeito e, ao mesmo tempo, termos s
secretários desqualificados ou vice-versa? 

Está aqui um fato aos quais os cidadãos devem cobrar explicações de seus candidatos. Está 
em nossas mãos o poder de também mudar isso. Que não nos contentemos com as migalhas 
da democracia, pois como dizia Sêneca “a maior desgraça de quem não gosta de política é 
ser governado por aqueles que dela gostam. Que possamos repensar nossa participação 
política nas cidades onde vivemos, pois podemos fazer muito por elas. 
E também lembrarmos que o ato de votar é um ato que surte um efeito mínimo pela 
democracia, só isto não basta. 

Afinal, não existe nada de mais impactante no desenvolvimento de uma cidade do que 
uma sociedade civil organizada e atuante junto às decisões políticas que envolvem 
a coletividade. 

O poder é do povo, o que resta agora é assumí-lo e não mais viver de migalhas.

(Publicado originalmente na Revista Avisa, 4ª edição - Capelinha-MG)
Alexandre Macedo
alexandrefernandesmacedo@gmail.com
Assistente Social, pós graduando em Gestão de Políticas, Programas e Projetos Sociais, é colaborador do Movimento Muda Capelinha

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