A tragédia da política mineira
Rudá Ricci
Vivo em MG há 17 anos. Sinto nitidamente a dificuldade da grande imprensa, quase toda localizada no eixo SP-RJ, compreender o que ocorre por aqui. Normalmente, reproduz opiniões oficiais ou caem no estereótipo mais canhestro, que se aproxima da noção da velha e preconceituosa figura de Jeca Tatu.
Tal oscilação leva os leitores a não entenderem os dilemas políticos efetivamente mineiros. Na minha opinião, vivemos um dilema complexo, que vou procurar sistematizar:
1) Aécio Neves é um hábil leitor político. Contudo, não possui projeto. É um homem que sabe navegar e articular, mas que se ressente da capacidade de formulação. Talvez, o contrário de Serra;
2) Por este motivo, fixou-se na organização da máquina pública, entregando a tarefa a Antonio Anastasia, o governador em busca da sucessão de Aécio. Anastasia é firme, com excelente formação acadêmica (sua irmã é ainda hoje professora da UFMG) e calmo negociador. Foi ele quem alterou a concepção de auditoria interna e montou a estrutura de projetos estruturadores do governo estadual. Mas o Estado ficou à deriva no que tange ao rumo de desenvolvimento. Não conseguiu criar - nem mesmo se lançou à tarefa - fóruns ou arenas de elaboração de projetos de desenvolvimento, procurando alterar significativamente a brutal desigualdade social e econômica das regiões centro-sul em relação às regiões centro-norte de Minas Gerais. No setor agrícola, para citar um exemplo, vivemos a transferência geográfica da produção para a fronteira com Goiás (Triângulo Mineiro, Alto Parnaíba e Noroeste do Estado). Tivemos uma brutal queda de arrecadação com a crise dos EUA, a maior dentre os Estados brasileiros;
3) Interessante que a Era Aécio varreu as lideranças tucanas mineiras do período anterior, de Pimenta da Veiga a Eduardo Azeredo, o que revela uma disputa interna pouco comentada na grande imprensa;
4) Por seu turno, a oposição fica restrita a Patrus Ananias, já que Fernando Pimentel parece ter jogado a toalha e já se dedica full time à coordenação da campanha de Dilma. Ao público externo, disputará as prévias do PT. Mas não faz mais campanha no interior como até pouco tempo atrás. Já Patrus, vai para o tudo ou nada. O problema de Patrus é que adota um estilo quase outsider, uma espécie de Suplicy mais compenetrado e mais claramente identificado com a lógica católica. Mas nunca disputou para valer a direção do partido e sempre se apresentou como candidato, desde que do "consenso", algo quase que impossível no PT. Agora, sai agressivamente em defesa das prévias. O problema é que Lula e Dilma desejam Hélio Costa. Se PT lançar candidato próprio, se arrisca a ser cristianizado por Lula e Dilma. Se fizer as prévias e, em seguida (como se afirma nos bastidores) negociar acordo com Hélio Costa, transforma o PT mineiro em chacota local;
5) Márcio Lacerda poderia ser uma nova liderança. Mas faz um governo lamentável, cheio de equívocos, que demonstra o quanto a administração empresarial é radicalmente distinta da administração pública;
6) Leonardo Quintão também poderia aparecer como alternativa. Mas foi uma mera brisa em dia de sol escaldante.
Enfim, um Estado com seus problemas políticos internos, como tantos outros Estados brasileiros. A diferença é que MG sabe se proteger.
Texto publicado no www.rudaricci.blogspot.com .
Rudá Ricci é cientista político, doutor em Ciências Sociais e diretor geral do Instituto Cultiva. Independente, crítico, é um dos mais argutos analistas de conjuntura política do país.
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