Prefeitos acusam governo de retaliação política. Estado nega
Municípios dizem ter tido convênios suspensos por apoio a Pimentel. Estado lembra período eleitoral e investimentos.
Fonte: O TEMPO
Na foto, Fronteira dos Vales, que teria ficado sem UBS, poços e unidades sanitárias. Reprodução/Google Maps.
Prefeitos de cidades pobres de Minas Gerais, localizadas nas regiões do Vale do Jequitinhonha e do Mucuri, estão acusando o governo de Minas de cancelar convênios e barrar o envio de recursos e benefícios para municípios por retaliação política. Em todos os casos, os chefes de Executivo apoiam o candidato da oposição ao governo de Minas, Fernando Pimentel (PT). São locais em que a população sofre duramente, com um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) pior do que o do Iraque e comparado, em alguns casos, a países como Namíbia, Timor Leste e várias localidades africanas. A vida difícil tem feito as pessoas abandonarem a região, fazendo com que o número de habitantes se reduza a cada medição. Entre os recursos negados após o anúncio de que não iriam apoiar o candidato do governo, Pimenta da Veiga (PSDB), estão unidades básicas de saúde, poços artesianos, verbas para asfaltamento e desenvolvimento da agricultura. Segundo os prefeitos, todos os recursos estavam prometidos para o período pré-eleitoral, já que a legislação proíbe repasses voluntários desde o início de julho. O governo, por sua vez, diz que "não há cabimento em alegar retaliação por posicionamentos adotados agora pelos prefeitos", evidenciando justamente os impedimentos do período eleitoral.
Um dos casos que chama mais atenção é o de Fronteira dos Vales, cidade de 4.795 habitantes localizada próxima de Nanuque, no Vale do Mucuri. Ao blog Olho Neles, o prefeito Hayden Matos Batista (PR) diz não ter dúvidas de que sofre perseguição política. Ele faz parte de um partido da base do governo, mas decidiu apoiar Pimentel nas eleições de outubro. A partir daí, diz ele, convênios para a construção de dois poços artesianos e oito módulos sanitários por meio do ProMunicípio, programa do governo estadual, foram deixados de lado. Ele ainda afirma que outro repasse, da secretaria de Saúde, também foi alterado.
O prefeito conta que, em abril, antes de anunciar seu apoio a Pimentel, foi chamado à secretaria para saber o que precisava na área. Apresentou suas demandas e saiu com a informação de que o município receberia uma ambulância e uma motocicleta, além de recursos para uma Unidade Básica de Saúde (UBS), orçada no valor de R$ 400 mil. Após ter sido convidado para reuniões de articulação da campanha de Pimenta, tendo se recusado a participar, alega ter recebido apenas a motocicleta e o carro. A UBS, item mais caro e que o município mais precisava, até hoje não foi entregue.
"A cidade não tem o mais básico na área da saúde. Possuímos uma unidade antiga, de 1982, e não possuímos ambulatório, maca, esse tipo de coisa. O Samu tem apenas um carro e um funcionário da prefeitura faz o transporte para outras cidades. É uma coisa absurda, horrorosa", diz Hayden Matos Batista.
O prefeito diz não ter dúvida de que se trata de retaliação.
"Eles prometeram os recursos, eu fui lá, levei o plano de trabalho, depois não veio o convênio. Por que não virou? Pois eu não sou da base do Pimenta. Eles esperavam que eu fosse, pois me convidaram para reunião de campanha, eu recebi convite para participar de reunião, mas não fui", disse ele, que ainda critica a forma como os convênios são negociados.
"Eles chamam lá no gabinete, falam que vão dar isso, vão dar aquilo, como se fosse patrimônio deles. Depois, acontece isso com quem não é aliado", reclamou.
Além da unidade básica de saúde, Fronteira dos Vales ficou sem dois poços artesianos e oito módulos sanitários, que seriam construídos por meio do ProMunicípio. Isso em uma cidade em que 40% dos moradores vivem na área rural, com quase 20% da população sem água encanada e em que mais de 60% dos moradores estão vulneráveis à pobreza, de acordo com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), da ONU. Fronteira dos Vales tem um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que mede a qualidade de vida da população, entre os mais baixos do país. É apenas o 796º entre 853 municípios mineiros, e o 4.441º em 5.565 cidades em todo o país.
Frei Gaspar
O corte de recursos por meio de convênios também afetou a cidade de Frei Gaspar, no Vale do Mucuri, governada pelo petista Edson Alves dos Santos. Ele afirma que não foram concretizados investimentos previstos para o desenvolvimento do setor de agricultura na cidade, e também acredita em retaliação política, por não ajudar na campanha governista.
"Assinamos, em maio, um convênio do ProMunicípio para investir R$ 100 mil na área de Agricultura da cidade, mas o governo acabou cancelando esse acordo alegando falta de verbas. Eu acredito, sim, que é retaliação, até por fazer parte de um partido que não é da base’, diz ele.
"É até estranho falarem em falta de verbas, pois as cidades vizinhas estão recebendo normalmente os recursos", afirmou.
Frei Gaspar tem 6.031 habitantes, uma população que vem caindo a cada medição, em meio a um cenário de vida difícil. Os recursos poderiam beneficiar aos 71,43% da população que vive em área rural no município. Em 2013, Frei Gaspar ocupou o 801º lugar entre os 853 municípios mineiros no quesito desenvolvimento humano. O analfabetismo de adultos era, em 2010, de 36,4% e 61,98% da população estava vulnerável à pobreza, de acordo com o PNUD.
Na foto, Frei Gaspar, no Vale do Mucuri, que teria ficado sem R$ 100 mil na área de Agricultura. Reprodução/Google Maps
Medina
Em Medina, no Vale do Jequitinhonha, o prefeito Robson Meleipe Machado (PRB) destacou o convênio com o ProMunicípio que garantiria R$ 700 mil para pavimentação de vias na cidade. O prefeito afirma que, em julho, o convênio foi cancelado. O deputado estadual Gilberto Abramo (PRB), que mediou a obtenção de recursos, confirma o caso e também acredita em retaliação.
"Foi feito um convênio pelo ProMunicípio de R$ 700 mil reais no início do ano. Houve a publicação do acordo, fizemos a licitação, mas em julho o governo acabou cancelando tudo, alegando que não havia a assinatura do presidente do conselho, que é o (secretário de Governo) Danilo de Castro. Eles sacrificaram o município de Medina por pura vaidade política’", diz o parlamentar, que enviou ao blog os arquivos do convênio e da cobrança do município ao governo.
Medina tem 21.485 habitantes, também vê sua população cair, e possui 29,94% dos moradores pobres e 16,49% extremamente pobres, segundo o programa da ONU.
Na foto, Medina, que teria sido prejudicada por um cancelamento de convênio.
Documento enviado no ano passado pela Prefeitura de Medina já solicitava a liberação dos recursos do ProMunicípio.
Outros municípios
O blog Olho Neles ainda obteve a informação de que o mesmo aconteceu nas cidades de Pavão, Vale do Mucuri, e Joaíma, Vale do Jequitinhonha. Na primeira, recursos do ProMunicípio não teriam sido liberados ainda, apesar da assinatura do contrato. Em Joaíma, os recursos só foram liberados após a intervenção de um deputado aliado do governo. Nos dois casos, os prefeitos, Antonio Carlos de Almeida (PTB) e Donizete Lemos (PT) não foram encontrados para falar sobre o assunto. Joaíma tem 15.423 habitantes e o 804º IDH do Estado, entre 853 municípios. A cidade tem 66,95% da população vulnerável à pobreza e 29,18% das crianças extremamente pobres. O índice de analfabetismo entre os adultos chega a 36,9%. Pavão tem 8.755 habitantes, o 668º IDH de Minas e 59,96% da população vulnerável à pobreza.
Na foto, Joaíma, no Vale do Jequitinhonha, que teria precisado de ajuda de um deputado da base alidada para solucionar o impasse. Reprodução/Google Maps
Outro lado
Em resposta às acusações, o governo estadual diz que "não é verdade que utilize critérios políticos na liberação de recursos de convênios assinados com os municípios", e afirmou que "todos os convênios firmados obedecem aos limites da disponibilidade orçamentária, dos fluxos financeiros e da responsabilidade fiscal em face das demandas apresentadas". Veja a íntegra da resposta do governo, que ainda destaca investimentos nos municípios citados.
"O Governo do Estado de Minas Gerais esclarece que não é verdade que utilize critérios políticos na liberação de recursos de convênios assinados com municípios. Todos os convênios firmados obedecem aos limites da disponibilidade orçamentária, dos fluxos financeiros e da responsabilidade fiscal, em face das demandas apresentadas. Não há cabimento em alegar retaliação por posicionamentos adotados agora pelos prefeitos, pois desde o início de julho o Estado está impedido de repassar novos recursos para os municípios por meio de transferências voluntárias, devido às vedações estabelecidas pela Lei Eleitoral. No momento não estão sendo pagos novos convênios para nenhum município, salvo as exceções previstas em lei. Após o término do período eleitoral, o Estado retomará a normalidade dos pagamentos.
É importante destacar ainda que o Estado mantém diversas ações em parceria com os municípios citados de Frei Gaspar, Fronteira dos Vales, Joaíma e Medina, bem como com os demais municípios do Estado e que todos os convênios vinculados ao Promunicípio têm pagamentos parcelados.
O município de Fronteira dos Vales, por exemplo, recebeu no âmbito do programa a doação de um Caminhão Compactador de Lixo e celebrou convênio para executar obras de calçamento em alvenaria poliédrica, no valor de R$ 110.000,00. O município já recebeu o pagamento da primeira parcela do convênio, no valor de R$ 77.000,00. Fronteira dos Vales recebeu também, em 2014, repasses financeiros do Estado referentes a convênios nas áreas de educação, saúde e apoio ao desenvolvimento municipal.
O município de Joaíma celebrou convênio no ProMunicípio, no valor de R$ 500.000,00, para a realização de obras de calçamento em bloquete. O município também já recebeu o pagamento da primeira parcela do convênio, no valor de R$ 350.000,00. Além disso, Joaíma já recebeu repasses financeiros do Estado, em 2014, nas áreas de educação, saúde e apoio ao desenvolvimento municipal.
O município de Frei Gaspar celebrou dois convênios no ProMunicípio, nos valores, respectivamente, de R$ 300.000,00, para encascalhamento de estradas vicinais e de R$ 100.000,00, para construção de ponte. Já foram pagos R$ 210.000,00 relativos à primeira parcela do convênio de maior valor. Frei Gaspar também recebeu outros repasses financeiros de convênios nas áreas de educação, saúde e apoio ao desenvolvimento municipal.
Medina já recebeu repasses financeiros por meio de convênios, em 2014, nas áreas de educação, saúde e apoio ao desenvolvimento municipal. Também celebrou convênio no âmbito do ProMunicípio, que será pago em conformidade com os fluxos orçamentário e financeiro.
Destaque-se, principalmente, que somente o ProMunicípio, um dos programas estaduais voltados para o apoio aos municípios, já beneficiou com repasses de recursos financeiros para obras de infraestrutura mais de 140 municípios administrados por prefeitos filiados ao PT e ao PMDB, além daqueles que foram beneficiados com doações de máquinas e veículos".
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