Caminhão pipa tenta atender toda a população.
Os moradores do Vale do Jequitinhonha não dizem mais que os rios secaram. Dizem que os rios morreram. Nem toda vida brota inteira, e firme, sem água. O seu Fidelsino Vieira até plantou laranja na zona rural de Ponto dos Volantes. A terra branca parecia fértil. Mas sem chuva, o pé não produziu direito. O feijão também não. E o sistema de irrigação não funciona, é só enfeite. Um jeito de ter esperança.
O córrego, que passava pela propriedade do seu Fidelsino, sumiu faz alguns anos. Com o sertanejo, ficou a vontade de viver de fartura outra vez. É difícil aceitar uma rotina dessas, de água de poço, pra quem diz que já pescou peixes onde hoje se vê pedra e areia. O seu Fidelsino nasceu e foi criado aqui. Tem 54 anos.
50 famílias, hoje, são vizinhas do seu Fidelsino. Moram
De vez em quando, às margens da estrada, a gente encontra um imóvel abandonado. O dono desistiu de cuidar do terreno. Deixou, de lembrança, uma casa típica da região, feita só de barro e madeira. A famosa casa de pau à pique.
É a moradia de centenas de pessoas da redondeza, quase do vale inteirinho, com cerca de 85 mil quilômetros quadrados de extensão. Um milhão de habitantes. 75% estão no campo, numa das regiões mais pobres do Brasil.
As prefeituras, das mais de 50 municípios do Vale do Jequitinhonha, amenizam o sofrimento dos moradores com os caminhões pipa. Só assim, a Meire Oliveira vai aguentar um tempinho a mais sem pegar água no Rio Jequitinhonha.
O Rio Jequitinhonha, já raso e assoreado, foi um dos poucos que restaram no Vale e corta a cidade de Itaobim. A margem fica, a mais ou menos, uns três quilômetros da casa da Meire. Mesma distância da terrinha onde vive a dona Maria Ivone dos Santos, no povoado de Inhaúma. Sem saber que o caminhão pipa iria, ela buscou água no lombo de um jegue. Teve medo de passar fome com os filhos e netos.
Ainda bem que o pipa foi e encheu todos os reservatórios da dona Maria e do seu José Pereira também. Com 97 anos, se for necessário, ele já não consegue mais andar muito, nem fazer força com os baldes estrada afora. Está operado. A saúde não anda tão boa.
O seu Alberico Luiz da Silva, da comunidade de Jenipapo, descobriu uma maneira de aliviar o problema, só que antes dele aparecer. É aproveitando o período das águas pra enfrentar, depois, a falta de chuva.
O seu Alberico fez um sistema em volta do telhado dele. Colocou uma calha pra enfrentar esse período de seca. Ela armazena a água da chuva, que vai até uma quina. Justamente na quina, a água cai em uma caixa embaixo. Quando a caixa fica cheia, o seu Alberico tampa o cano e a água segue para outro lugar.
O outro lugar é no quintal da casa. A água vai para um poço e dá pra, praticamente, um ano.
Mas só porque o seu Alberico busca água pra beber na cidade mais próxima e economiza muito, não chove na região há mais de três meses.
A mangueira no chão também é um outro truque do seu Alberico pra driblar o tempo ruim. São três mil metros que vão até o topo da montanha. Lá existe uma nascente. É dela que vem a água que escorre fraca e ajuda a manter um outro reservatório. Pelo menos um final feliz pra alguém.
Como nem todos os vilarejos desenvolveram ideias parecidas, ainda é preciso depender da boa vontade das prefeituras. Dividir água até com os animais. Não tem jeito. Todo ano a mesma história: o sertão não vira mar. E no cerrado, o que cresce sem chuva, não alimenta todos os moradores. E pior, eles sabem que não vai terminar tão cedo.
Fonte: Intertv
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