segunda-feira, 4 de maio de 2020

O poeta, cantor e compositor Aldir Blanc morre aos 73 anos.

Aldir Blanc, compositor e escritor, morre de Covid-19 no Rio | Rio ...
Aldir Blanc deixa legado monumental para a MPB, calculado em cerca de 600 letras. Com o mineiro João Bosco, criou as obras-primas 'O bêbado e a equilibrista' e 'Dois pra lá, dois pra cá'
 Ângela Faria 04/05/2020 08:38










"Chora nossa pátria mãe gentil", "choram Marias e Clarices no solo do Brasil" nesta 
segunda-feira (04.04.20). Morreu, aos 73 anos, no Rio de Janeiro, o compositor Aldir 
Blanc, vítima de uma infecção generalizada provocada pela COVID-19, doença 
diagnosticada no artista em 22 de abril. O óbito foi confirmado pelo Hospital Universitário 
Pedro Ernesto (HUPE), em Vila Isabel, Zona Norte do Rio, onde o músico estava internado 
desde 15 de abril. 
Antes de dar entrada no HUPE, Aldir permeneceu cinco dias no Hospital Municipal Miguel 
Couto, no Leblon, Zona Sul da capital carioca. Chegou a ser entubado em uma sala da 
unidade, por falta de vagas em CTI. No dia 20, após mobilização da família pela internet
o compositor foi finalmente transferido para o leito de terapia intensiva do hospital Pedro 
Ernesto. 
Ainda não há informações sobre os ritos fúnebres, que devem ser rápidos, reservados 
e sem aglomerações, como recomendam protocolos fixados pelas autoridades sanitárias 
em função da pandemia de coronavírus.
Aldir era a alma do subúrbio carioca
'Aldir era grande porque era muitos: 
o ídolo, o inacreditável letrista'

 Bruno Thys -  04/05/2020 11:16


Tive muitos ídolos na vida, nenhum do tamanho do Aldir Blanc. Aldir era grande
porque era muitos: o ídolo, o inacreditável letrista, o Garrincha da MPB que nos 
fazia rir, chorar e chorar de rir com suas crônicas musicadas por João Bosco.
Aldir era a alma do subúrbio carioca, o olhar único sobre a vida na Zona Norte, 
o Proust de Vila Isabel.
Aldir era o homem que abandonou a medicina para se dedicar à a poesia da vida, 
fosse lida, cantada, falada, escrita, conversada, versada e improvisada.
Aldir era o parceiro de bebida de todo o bêbado, embora não bebesse há muitos anos.
Nunca fui a um botequim com ele, mas jamais deixei de brindar os melhores
sentimentos de um fã quando chega à segunda casa de um ídolo. Entrar num 
botequim, na minha cabeça de adolescente, era sair de uma música ou crônica 
de Aldir para a vida real.
O Aldir, aliás, quando nasceu foi surpreendido por um anjo meio torto português 
que lhe disse “Bai Vlanc, ser Basco na Bida”. Era um vascaíno intransigente e 
ranheta . Sabia tudo do time.
Aldir era de uma geração que ganhou o nome de MAU, Movimento Artístico
Universitário, uma galera que se reunia em torno da música na Rua Jaceguaí, na 
Tijuca, todos os sábados, na casa da família Portocarrero; Jovens cheios de sonhos 
e sambas muitos deles cantados por gente como Elis já naquela época. Eram “nativos” 
daquele lugar, entre outros, Gonzaguinha e Ivan Lins.
Quando o conheci pessoalmente, levado à casa dele, na esquina da Muda com a Usina 
por João Máximo, para entrevistá-lo para o Jornal do Brasil, em meados dos anos 1980, 
não tive pudor em revelar minha admiração.
“Tinha o sonho de conhecer pessoalmente duas pessoas: você e o Samarone.”
“Tu tá me sacaneando...”
Essa resposta, lembrada por ele desde então quando nos encontrávamos ou quando 
um  portador levava um abraço meu pra ele e vice-versa, me faz pensar até hoje.
Nunca soube e nem teria a coragem de perguntar, se ele se sentiu sacaneado 
por ser vascaíno, por ser comparado a um jogador de clube, ídolo, mas muito distante 
da constelação do futebol brasileiro ou sei lá por que outro motivo. Me pego rindo 
sempre que lembro dessa nossa primeira troca de palavras, cara a cara. 
Já o havia entrevistado por telefone algumas vezes, mas estar diante da figura 
do Aldir era um presente da vida.
Quando o conheci já tinha lido todos os seus livros de crônicas, cada uma mais
engraçada do que a outra, editados pela Codecri, da turma do Pasquim, onde 
desfilavam personagens reais: o tio Waldir Iapetec, o avô Aguiar, de longe a grande 
figura da vida de Aldir, o pai Ceceu Rico e outras figuras absolutamente humanas
movidas pela sem-vergonhice em seu sentido mais amplo: não se ter a vergonha 
de ser o que se é. Sua obra tinha muito da sem-vergonhice da vida, a emoção 
verdadeira, os sentimentos mais surpreendentes que o homem pode expressar.
Sou grato por ter Aldir como ídolo, inspiração, por ler suas histórias, algumas 
contadas por ele mesmo, ouvir suas músicas, por ter conhecido sua casa, a mulher, 
as filhas e vivido alguns momentos com ele que guardo com todo o cuidado no 
cantinho do afeto .
Uma noite inacreditável
Vivi com o meu colega e amigo Claudio Henrique uma noite inacreditável em torno do
Aldir. Início dos anos 1980, o samba andava em baixa e os compositores se reuniam 
na casa do Moacir Luz, no primeiro andar do prédio onde morava o Aldir. Como as
gravadoras não queriam saber de samba, eles passavam a noite mostrando uns para 
os outros o que estavam compondo. Naquela noite, que virou reportagem da revista 
de Domingo do JB, estavam o Betinho, Paulo Cesar Pinheiro, Fátima Guedes, o Magro 
do MPB-4, Sílvio da Silva Filho, Aldir, Mary, Guinga e uma das filhas, Dudu Falcão e
mais gente. O violão passava de mão em mão e isso durou até de manhã. Betinho 
disse para mim e para o Claudio: “Essas reuniões aqui são os melhores momentos 
musicais da minha vida.”
Foi lá, numa dessas reuniões, que nasceu Saudades da Guanabara, escrita a seis 
mãos por Aldir, Paulo Cesar Pinheiro e Moacir Luz. Eu era editor do caderno Cidade do JB. 
Aldir me ligou e contou:
“Nêgo, fiz uma música que é um passeio pela nossa saudade do Rio e um lamento à
desesperança desses tempos de degradação e violência. Vou te mandar pra ouvir e 
acho que pode render uma matéria.”
O Rio era uma de nossas paixões em comum. Ouvi a fita cassete e chorei e ainda 
choro com o refrão:
"Brasil, tira as flechas do peito do meu padroeiro
Que São Sebastião do Rio de Janeiro ainda pode se salvar".
Na mesma época convidei-o a escrever uma coluna no jornal. Ele recebia um desenho
do Lan, o grande caricaturista, e fazia o texto. Eram geniais. Lan e o Lan se adoravam.
Aldir brincava. “Sou letrista de caricatura”!
Que pena Aldir ter partido assim. Não merecia sofrer no final, nem nunca. Foi-se um
olhar único da vida, personagem de si mesmo. Imagino a dor de tanta gente, tantos 
eram o Aldir. Ele era ligado demais à família, tinha um amor incontrolável pela mulher, 
um ciúme de maluco das filhas e um tremendo orgulho da terceira geração, da neta 
que deve estar fazendo residência médica. Era preocupado com os parentes, com 
os amigos.
Quando soube que eu estava com hepatite também lá pelos anos 1980, me ligava 
toda a semana para saber a quantas estavam minhas transaminases e bilirrubinas
E dizia: “Fica tranquilo, daqui a um ano a gente vai tomar uma cerveja!”
Aldir amava, sobretudo os livros. Moacyr Luz me contou, um dia, de uma viagem 
que fizeram para a casa de campo de um amigo num feriado. Aldir já estava recluso, 
quase não saía do quarto. Todos ficaram muito felizes em ele topar passar uns dias 
fora. E lá foram. Aldir levou três malas e todo mundo estranhou. Chegou na casa 
do amigo na Serra, entrou no quarto e desfez a curiosidade. Eram malas de livros. 
Se trancou ficou lendo e só saiu do quarto na hora de embora
Moacyr comentou:
Como lia aquele filho da puta!”
Aldir era o olhar desconcertantemente lúcido sobre a tragédia da vida no sentido 
grego da palavra. Não saberia hierarquizar os grandes de todos os tempos, mas 
no meu time ele joga com a 10.
O carioca Bruno Thys é jornalista e um dos sócios da editora Máquina de Livros. 
Trabalhou no Jornal do Brasil, revista Veja e grupo Globo. O texto acima foi 
publicado nas redes sociais e reproduzido com autorização do autor.
Eis nossa sugestão:
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Amigo É pra Essas Coisas
​Um dos primeiros grandes sucessos de Aldir Blanc, a música foi criada em parceria com Sílvio da Silva Jr. e conquistou o segundo lugar no Festival Universitário da Música Popular Brasileira de 1970, ocasião na qual foi interpretada pelo grupo MPB-4.

Bala com Bala
Fruto da parceria com João Bosco, foi uma das primeiras canções da dupla oferecidas à cantora Elis Regina, que a escolheu para o álbum “Elis”, de 1972.

Dois pra Lá, Dois pra Cá
Também entoado por Elis Regina, o bolero se tornou um dos grandes sucessos da carreira da cantora, que o gravou junto a uma leva de outras composições vindas da parceria entre Blanc e Bosco.

Cabaré
Um tango, a gravação na voz de Elis Regina foi elogiada por Astor Piazzola, um dos maiores nomes do gênero argentino. “Que fabuloso escutar ‘Cabaré’, está muito bem feito”, disse ele em entrevista à Folha nos anos 1970.

O Bêbado e a Equilibrista
Um dos mais poderosos hinos contra a ditadura militar, foi imortalizada na voz de Elis Regina e tinha uma série de menções a figuras perseguidas no período, como às viúvas de Manoel Fiel Filho e de Vladimir Herzog, e a Herbert José de Sousa, irmão do cartunista Henfil. Surgiu como uma homenagem que Bosco queria fazer a Charles Chaplin, morto em 1977.

Rancho da Goiabada
A triste letra da canção mostra a vida sofrida e simples dos boias-frias, que, diante da pobreza do campo, sonham com “goiabada cascão, com muito queijo, depois café”. Foi mais uma parceria de sucesso com Bosco.

Incompatibilidade de Gênios
Blanc e Bosco também se juntaram para a canção, que tratou de um tema recorrente na obra da dupla: a vida conjugal. Na letra, um marido reclama das brigas com a mulher, que tem personalidade oposta à do eu-lírico.

O Mestre-sala dos Mares
A canção chegou a ser censurada pela ditadura militar, por abordar a vida do líder da Revolta da Chibata, ocorrida em 1910. A letra era um esforço para recuperar um personagem soterrado pela história e, por mencionar um movimento contra as forças políticas, não foi vista com bons olhos pelo regime.

Resposta ao Tempo
Imortalizada na voz de Nana Caymmi, a parceria de Aldir com Cristovão Bastos foi um sucesso nas rádios nos anos 1990, impulsionada pela minissérie “Hilda Furacão”, da Globo, que a escolheu como tema de abertura. Mais tarde, foi entoada por importantes nomes da música brasileira, como Milton Nascimento e Fafá de Belém.

Vida Noturna
Carro-chefe do disco homônimo lançado em 2005, o único em que Blanc interpretou todas as faixas, traz a voz do artista e de Bosco acompanhada somente de piano e violão. 
Fontes: Folha de S.Paulo e Estado de Minas


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