Morre o professor, entomologista e escritor Ângelo Machado
Dono de uma carreira singular, ele era uma das personalidades mais respeitadas da UFMG e da ciência brasileira
Morreu nesta segunda-feira, dia 6, aos 85 anos, em Belo Horizonte, o médico, professor, entomologista, ambientalista e escritor Ângelo Barbosa Monteiro Machado, uma das personalidades mais importantes da história da UFMG. Ele teve uma pneumonia aspirativa decorrente da aspiração de conteúdo gástrico para os pulmões. Seu corpo não será velado.
Ângelo Machado era professor emérito desde 2005. À época em que foi agraciado, ele declarou: "Tenho 52 anos de UFMG, pela qual sou um apaixonado. Esse título é muito importante para mim, pois vai me permitir continuar oficialmente na universidade de que gosto". Aposentado compulsoriamente em 2004, mantinha seu vínculo com a instituição como professor voluntário, recusando-se a ser incluído na categoria de "inativo". "Gosto de vir aqui todos os dias, entre outros motivos, porque o campus está cada vez mais lindo", declarou.
“O que falar sobre o professor Ângelo Machado, o que falar sobre essa pessoa encantadora, sobre esse médico, zoólogo, ambientalista, escritor, pesquisador e professor emérito da nossa Universidade? Como prestar uma homenagem à altura a essa pessoa adorável que sempre carregou consigo a marca da inventividade e da criatividade, do compromisso com a vida, com a ciência e com a UFMG, com a alegria? Ele deixa uma lacuna, um hiato na vida de todos nós, um espaço impossível de ser preenchido”, afirmou, emocionada, a reitora Sandra Regina Goulart Almeida. “Nosso compromisso é o de manter acesa a centelha inspiradora que nosso querido Ângelo nos deixa. Vamos sentir saudades, muitas saudades”, acrescentou.
Entre suas descobertas relevantes no campo da medicina, Ângelo Machado mudou, nos anos 1960, o conceito então existente sobre as lesões do sistema nervoso autônomo na doença de Chagas. Ângelo Machado também era escritor e dramaturgo, com cerca de cinco dezenas de obras publicadas, em sua maioria para crianças, e seis peças de teatro encenadas. Em 1993, ele foi agraciado com o Prêmio Jabuti.
O professor foi membro da Academia Brasileira de Ciências e da Academia Mineira de Letras, presidente do Conselho Curador da Fundação Biodiversitas, ONG especializada na conservação de espécies ameaçadas de extinção, e secretário regional e integrante do conselho da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
PaixõesNa área de entomologia, Ângelo Machado dedicou-se ao estudo das libélulas, tendo descrito 98 espécies e 11 gêneros novos desses insetos. Foi homenageado com seu nome em 56 espécies de animais.
As libélulas, por sinal, eram uma das paixões do professor. Ele reuniu uma coleção com 35.250 exemplares de 1.052 espécies ao longo de seis décadas. Em 2015, doou o acervo à UFMG. Dono de um humor refinado, declarou, em entrevista à Revista Diversa, em 2008, que até então não tinha conseguido encaixar o inseto como protagonista de seus livros infantis. “Ela entra neles como o Hitchcock aparece em seus filmes”, brincou.
A outra paixão de sua vida era a esposa, a professora Conceição Machado, que conheceu na década de 1960. “Comecei a trabalhar com uma aluna, Conceição Ribeiro da Silva, e logo a gente descobriu que gostava um do outro. Fizemos um trabalho de namoro, de noivado, de filho, de neto (risos). Durante 30 anos, pesquisamos o sistema nervoso da Doença de Chagas. Depois, fui para a zoologia, e ela manteve o laboratório. Do ponto de vista científico, ela foi mais ativa que eu, formou 32 mestres e doutores. Mesmo atuando em áreas diferentes, a gente se ajudava. Mas, no final, a área dela foi complicando tanto que acabei me afastando de vez”, declarou ele, na mesma entrevista. Conceição Machado faleceu em 2007. Ângelo Machado deixou quatro filhos: Lúcia, Flávia, Paulo e Eduardo.
Ângelo Machado também dedicou seu talento e energia à popularização da ciência. No anos 1980, ele participou do grupo que elaborou o projeto da revista Ciência Hoje das Crianças. E foi no Laboratório de Entomologia, coordenado por ele no ICB, que, durante muitos anos, funcionou a sucursal mineira da Revista Ciência Hoje, comandada pelo jornalista Roberto Carvalho.
Ângelo Machado foi meu professor de Anatomia Básica e Neuroanatomia , na Faculdade de Medicina, em 1976. Suas aulas eram de pura sabedoria, criativas, engraçadas, artísticas, de ensinamentos que marcaram nossas vidas de estudantes. Ele conseguia ensinar anatomia humana comparando com a natureza e sua paixão, as libélulas. Afirmava, com certeza científica: "onde vocês encontrarem uma libélula voando perto de uma fonte d'água, pode beber que a água é boa". Ele registrou essa passagem no seu belo livro "O menino e o rio". Ambientalista, grande defensor da vida, distribuía bom humor e alegria a toda hora. Por toda sua vida!
Divertido e midiático, Ângelo Machado concedeu várias entrevistas ao longo da vida. Eis algumas delas:
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