Demanda global leva à corrida pelo lítio, o petróleo do
futuro.
País deve virar um dos maiores
produtores
de mineral usado em baterias.
Pegmatito, rico em espodumênio (partes brancas), é mineral onde se extrai o lítio.(OTEMPO).
Nicola Pamplona, no jornal Folha de S. Paulo, em 22.12.18
ARAÇUAÍ (MG) O cenário
internacional favorável e as recentes descobertas de lítio no país provocaram
uma corrida por reservas do
mineral, matéria-prima para a fabricação de baterias elétricas.
Dois projetos já em curso elevarão
o Brasil ao status de um dos
maiores produtores mundiais na próxima década.
Até
o início deste mês, de acordo com dados da ANM (Agência Nacional de Mineração),
o número de requerimentos de pesquisa do minério chegava a 117, mais que o triplo
do ano anterior e quase dez vezes o registrado em 2016.
O
processo vem gerando grande expectativa no Vale do Jequitinhonha, nordeste de
Minas, uma das regiões mais pobres do país, mas com grande potencial para
descobertas.
Na
microrregião de Araçuaí, a 600 quilômetros de Belo Horizonte,
a 245 km de Teófilo
Otoni, 310 km de Montes Claros, foram 46
novos requerimentos de pesquisa nos
últimos dois anos, na
esteira de descobertas realizadas pela mineradora Sigma e
de
um trabalho de exploração da estatal CPRM (Companhia de
Pesquisa de Recursos
Minerais).
No
trabalho, a CPRM descreveu 45 corpos rochosos com minerais de lítio, 20 deles
inéditos. “A região tem potencial para se tornar uma grande produtora”, diz
Vinícius Paes, um dos autores do projeto de pesquisa na região.
A
partir do início de 2018, houve crescimento também pela procura de áreas no
Nordeste, principalmente no Rio Grande do Norte, na Paraíba, em Pernambuco e na
Bahia.
Chamado
de “petróleo do futuro”, pelo potencial de substituição do motor a combustão, o
lítio experimenta grande valorização no mercado internacional.
O
preço disparou nos últimos anos, diante de planos para reduzir as emissões de
poluentes no transporte em países desenvolvidos, o que gerou uma corrida por
reservas no mundo. Montadoras como a Volkswagen já anunciaram metas para o fim
da produção de veículos a gasolina.
O
Brasil tem hoje uma pequena produção, em projeto da CBL (Companhia Brasileira
de Lítio) em Araçuaí, voltada para consumo básico no mercado interno, como
lubrificantes e cerâmica. Mas os investimentos recentes já começam a alterar o
cenário.
“O
Brasil era muito tímido nesse segmento. De repente, surge a demanda elétrica, e
o setor está passando por um despertar”, afirma Ivan Jorge Garcia, especialista
em recursos minerais da agência.
NOVA FÁBRICA
Em
maio, a AMG Mineração inaugurou uma fábrica em Nazareno,
240 quilômetros ao sul
de Belo Horizonte, região de São João Del
Rei, fruto de investimento de R$ 450 milhões, para extrair de
pilhas
de rejeito de sua produção de tântalo o lítio que há até pouco tempo
não
tinha valor de mercado.
A
unidade opera com 60% de sua capacidade, de 90 mil toneladas por ano de
espodumênio, um dos minérios nos quais se encontra o lítio. Considerando um
teor de 6%, o volume equivale a 4.500 toneladas de lítio contido (medida usada
internacionalmente para classificar a produção).
É o equivalente
a quase nove vezes a produção brasileira ao fim de 2017, quando o país
representava menos de 0,1% do mercado global, que movimentou 43 mil toneladas
de lítio contido. Austrália e Chile dominavam 76% da produção. A Argentina
tinha 13%.
Com
investimento de R$ 350 milhões, incluindo os gastos já feitos em exploração de
reservas, a Sigma prepara o maior projeto de produção do país, com capacidade
para 240 mil toneladas por ano de espodumênio, o equivalente a 14,4 mil
toneladas de lítio contido.
AMG
e Sigma já falam em estudos para dobrar capacidade. E vislumbram a
possibilidade de avançar na cadeia produtiva. Hoje, a transformação do mineral
em compostos químicos e depois em baterias é dominada pelos chineses.
“Temos
disponibilidade de matéria-prima e mercado, que é um dos maiores do mundo.
Temos o princípio e o fim. Precisamos apenas desenvolver o meio”, diz Itamar
Resende, presidente da Sigma Mineração. A “cereja do bolo”, diz, seria
conseguir atrair uma fábrica de baterias para o país.
A
AMG já deu um passo e fechou acordo com a sul-coreana Ecopro para estudar a
viabilidade de uma unidade química de produção de sulfato de lítio, uma etapa
além na cadeia de produção de baterias.
“É
um produto de valor agregado muito superior”, afirma o presidente da companhia,
Fabiano Costa. Se o projeto for aprovado, a expectativa é que inicie as
operações em 2021.
EXPECTATIVA
Durante
8 de seus 35 anos, Washington Chaves dos Santos deixava uma vez por ano a
aridez de Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha, rumo ao interior de São Paulo para
garantir o sustento da família no corte de cana.
Partia
com outras centenas de moradores para temporadas de até oito meses longe da
mulher e do filho. Kessiane Lima Silva, 36, teve mais sorte. Formou-se em
geologia e desenvolveu sua carreira trabalhando para mineradoras na região
Norte do país. Mas há algum tempo sonhava em voltar a Araçuaí para poder dar
assistência aos pais, já em idade avançada.
Os
dois hoje são colegas de trabalho na mineração de lítio da Sigma, que tem o
maior projeto de produção do mineral em curso no país, investimento que gera
grande expectativa em uma área que exportava mão de obra por falta de
oportunidades.
“Graças a Deus veio essa empresa
para cá”, diz Santos.
Com
economia basicamente agrícola, de pequena mineração e garimpos de pedras
semipreciosas, a região espera que o lítio traga empregos e oportunidades de
negócios.
Nas obras da fábrica, que devem
começar em 2019, serão 500
empregos, diz o presidente da Sigma, Itamar Resende.
A
expectativa é que o número seja mantido durante a operação, incluindo a mão de
obra para a exploração de reservas adicionais.
Única
produtora do país até o fim de 2017, a CBL (Companhia Brasileira de Lítio)
estuda ampliar sua capacidade. A empresa atua desde 1993, mas tem produção
basicamente voltada ao mercado interno.
Em uma fábrica em Divisa Alegre,
na divisa com a Bahia, produz
matéria-prima para lubrificantes.
Em
março, iniciará operações de uma unidade de purificação para começar a
prospectar o mercado de baterias, diz o diretor-superintendente da companhia,
Paulo Sergio Castro Renestro.
Impactos ambientais
A empresa, porém, enfrenta
críticas de moradores, que
reclamam de poluição causada por uma pilha de rejeitos.
reclamam de poluição causada por uma pilha de rejeitos.
“Se
o vento sopra para cá, vem uma nuvem”, diz o agricultor Valdeir Gonçalves dos
Santos, 54, apontando para a pilha atrás de sua casa. “Os meninos já tiveram
problema de respiração, bronquite, asma.”
A CBL nega que cause danos à
comunidade.
A Prefeitura de Araçuaí não se pronunciou.
A Prefeitura de Araçuaí não se pronunciou.
Fonte: Folha de S. Paulo, em 22.12.2018
Breve Comentário do Blog:
Reportagem do jornal Folha de S. Paulo, neste sábado,
22.12.18, leva euforia a moradores do Vale pelo grande impulso na
exploração de lítio, na região de Araçuaí, no Médio Jequitinhonha,
nordeste de Minas.
Muitos sonham com a geração de empregos sem nem atentar
que a fábrica para processamento dos produtos do lítio será em Nazareno,
um pequeno município, mais ao sul de Minas, na região de São João Del Rei, que
vai gerar 500 empregos, em 2019.
O Vale do Jequitinhonha continuará sendo apenas fornecedor
de matérias-primas com baixa geração de empregos, além de ter grande perda
ambiental, como a deterioração da qualidade das águas que abastecem as
comunidades e o surgimento de doenças respiratórias, principalmente na
comunidade do Barreiro, na divisa de Araçuaí com Itinga, onde o rio Piauí foi destruído. Esse é o local de maior concentração da exploração do lítio pela CBL -
Companhia Brasileira do Lítio (fundada em 1986 com geração de 300 empregos diretos) - o Governo de Minas tem 33% das suas ações -, e suas parceiras como a Sigma, a ABM Mineração (dona da fábrica em Nazareno) e a espanhola Emerita Resources, que adquiriu direito de exploração do lítio no Vale.
Faremos uma série
de reportagens sobre o lítio, as grandes reservas localizadas no Médio
Jequitinhonha, a política de exploração do mineral e o seu processamento
em fábricas do sul de Minas, o uso do material em diversos produtos e a
possibilidade da mineração desencadear o desenvolvimento regional do Vale com o
aproveitamento da matéria-prima em unidades de processamento na região.
Se você quiser ir se atualizando, clique em alguns post deste Blog sobre o lítio:
blogdobanu/assembleia-legislativa-debatera.lítio.html
blogdobanu/aracuai-polo-de-exploracao-de-litio.pode.mudar.realidade.do.Vale
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