sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

Coletiva: Um Mandato Parlamentar diferente, com 9 co-vereadores. Entrevista com a vereadora eleita Sônia Lansky.

 “O socialismo é a nossa marca e é marca da cidadania”, afirma vereadora eleita em BH.

Sônia Lansky defende uma saúde integral, que leve em consideração outras áreas de governo

Belo Horizonte | Brasil de Fato MG |
 
sonia lansky
Pensamos no coletivo, dizemos que a saúde é coletiva e a saída é coletiva - Créditos: divulgação

O Brasil de Fato conversou com Sônia Lansky, vereadora eleita pelo Partido dos Trabalhadores (PT) para integrar a Câmara Municipal de Belo Horizonte a partir de 2021.

Sônia faz parte da ColetivA, uma candidatura - que agora será mandato - que integra 10 pessoas de diversas áreas, raças e realidades na construção de propostas e decisões para o Legislativo da capital mineira.

Médica pediatra e epidemiologista da Prefeitura de Belo Horizonte desde a década de 1980, a trabalhadora do Sistema Único de Saúde (SUS) fala sobre pandemia, perspectivas para a gestão, candidatos conservadores do setor da saúde e mais.

Uma das suas grandes exigências é o funcionamento da maternidade humanizada Leonina Leonor, que está pronta desde 2011 mas ainda não foi inaugurada para atendimento à população.

Brasil de Fato - Qual é a sua trajetória política?

Sônia Lansky - Eu sou trabalhadora do SUS [Sistema Único de Saúde], pediatra formada pela UFMG [Universidade Federal de Minas Gerais], com residência no Hospital das Clínicas, em Belo Horizonte. Entrei no SUS em 1988 e participei da construção do programa na capital. A militância pelo SUS é um marco na minha vida.

Belo Horizonte, na década de 1990, foi a primeira cidade a implementar plenamente o SUS e a Atenção Primária à Saúde [APS]. Nessa construção, atuei como pediatra na região Nordeste do município, depois como gerente de postos de saúde nos bairros Santa Lúcia, Serra e Saudade.

 

A saúde é coletiva e a saída é coletiva

 

Em 1999, fui para a Secretaria Municipal de Saúde, coordenando a área da Criança e do Adolescente e depois para a saúde materna, que cuida da gestante e do recém-nascido. Me dediquei e me dedico muito ao direito da criança e do adolescente e ao direito das mulheres, especialmente das gestantes, no momento do parto, para garantir que tenham acesso às melhores práticas em saúde, contra a violência institucional do sistema contra elas e também contra o racismo institucional desses ambientes.

Além do SUS, tenho uma trajetória de luta pela democracia. Sou filiada ao Partido dos Trabalhadores desde o início da sua constituição. Participo do Coletivo Alvorada e sou uma bordadeira de luta junto com outras mulheres nos projetos Linhas do Horizonte e Pontos de Luta.

O que te levou a se candidatar agora, em 2020, para participar do Legislativo Municipal?

Como dito, temos uma história muito importante na construção do SUS aqui em BH. Uma experiência que é referência nacional na consolidação da Atenção Primária à Saúde, que se constrói com toda essa força dos trabalhadores que fazem a saúde acontecer nos postos, nas urgências, no SAMU, no pronto-socorro, hospitais, maternidades, etc.

Nós fizemos uma avaliação de que essa formulação e experiência gestora do SUS, essa experiência concreta do fazer saúde pública, não possui uma força de representação à altura na Câmara Municipal.

 

Queremos ser o oposto dos mandatos tradicionais, que são assistencialistas

 

Além do golpe [contra a presidenta Dilma, em 2016] ameaçar a própria existência do SUS com os cortes de investimentos da PEC 95, vimos que precisávamos reagir e fazer uma resistência não só pleiteando uma representação no Executivo, mas no Legislativo. No Executivo da cidade, esses projetos básicos de vida digna para as pessoas estão estagnados. Belo Horizonte deixou de ser referência nos programas que defendem a vida e propõem a inclusão de todas e todos.

Estamos também indignados com a situação do tratamento da saúde e dos trabalhadores e trabalhadoras na pandemia, que escancarou a imensa desigualdade social brasileira. A pandemia redobrou a carga dessa exclusão sobre as mulheres e homens trabalhadores, que são aqueles que não puderam ficar em casa, que têm que enfrentar o transporte público e que possuem dificuldade de acessar a saúde. São essas pessoas que adoecem mais e morrem mais.

Isso nos motivou a organizarmos uma estrutura de candidatura em defesa da vida e do investimento público. Porque a vida precisa continuar, assegurada pelo Estado.

Concorremos nessas eleições com a ColetivA. Eu sou quem representa esse grupo oficialmente, mas somos 10 pessoas. Estamos muito felizes em iniciar um mandato aberto à participação social e mais próximo das necessidades do povo.

O que é a Coletiva? Eu sou quem representa esse grupo oficialmente, mas somos 10 pessoas. 

O que é a ColetivA? Qual é o formato do mandato, como vai funcionar e quais são as pessoas que a compõem?

Somos eu, a Juliana, que é enfermeira obstétrica, que tem uma luta pela assistência humanizada ao parto e pelos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres; a Sorângela, enfermeira da atenção primária de saúde com uma larga experiência em gerência de unidades de saúde; a Lígia, que é uma jovem terapeuta ocupacional que atua na saúde mental e defende a luta antimanicomial, o direito à loucura em liberdade.

A Stella, que é historiadora e participa do movimento estudantil e do movimento feminista na Marcha Mundial das Mulheres; a Dehonara, também da saúde, assistente social que trabalha em uma maternidade e tem um forte ativismo pelos trabalhadores da saúde e está na Marcha Mundial de Mulheres; a Rúbia, mulher, professora da Rede Pública de Educação de BH, mãe, que representa o movimento pela educação pública de qualidade.

 

O SUS é que segurou todas as dificuldades na pandemia

 

O Rubinho, ativista do movimento social da periferia, negro, músico, escritor e que representa o direito da população negra à vida digna, à cultura e ao lazer; Lara, que é do movimento pela Visibilidade Lésbica e Bissexual, é do bloco Truck do Desejo e participa da construção de uma cultura sem discriminação na cidade; André, que é um homem do Barreiro, militante do movimento pela qualificação do transporte público e também do carnaval, no bloco Esperando o Metrô.

Essa formação evidencia nossa diversidade. São diversas áreas que se juntam, mas com uma proposta única de construção coletiva, em um processo democrático de formulação das decisões, votações, apoio a projetos e discussão do orçamento da cidade.

Quisemos um grupo que realmente representasse a vida da maior parte da população, que luta pela sobrevivência, emprego e por alimentação. Nós queremos uma cidade do bem viver, do meio ambiente, que tenha lugares públicos ocupados sem o sentimento de insegurança e sem desigualdade social, uma marca da nossa sociedade que traz medo e violência.

A ColetivA é um mandato que teve a sua figura, uma profissional da saúde, como elemento central. A proposta do grupo é diferente do que costumamos ver nos candidatos da área da saúde que costumam ser eleitos, geralmente conservadores, e ganham força com nomes como “Fulano da ambulância”, “Ciclano da farmácia”. Como você analisa essas pessoas que são eleitas com o discurso da saúde?

A proposta da ColetivA é justamente essa: ousar, sair dessa forma tradicional da política, personalista, que concentra poder em uma pessoa, e muitas vezes uma pessoa que deseja fazer carreira política e se beneficiar do cargo.

Ao contrário, a ColetivA descentraliza poder. Somos 10 pessoas que nos reuniremos - como já fizemos na elaboração do programa, construído a 20 mãos. Temos um grupo de apoiadores muito grande, com história em movimentos sociais, alinhado com a necessidade da maior parte da população, que é excluída e é pobre.

Queremos ser o oposto dos mandatos tradicionais, que são assistencialistas, que se baseiam no clientelismo, na troca de favores para ganhos pessoais e individuais. Pensamos no coletivo, dizemos que a saúde é coletiva e a saída é coletiva. O socialismo, uma forma de vida mais igualitária, com respeito aos direitos de todos e todas, sem discriminação, independente do poder econômico, é a nossa marca e é marca da cidadania.

E o SUS também traz essa ideia da cidadania e tratamento igualitário. É uma expressão da democracia e da justiça social.

Você é médica e vivemos uma pandemia. Acha que isso influenciou a sua vitória? Como analisa a situação atual de Belo Horizonte e do estado de Minas Gerais, com os casos voltando a crescer?

É importante dizer que o SUS é uma conquista do povo brasileiro, mas nunca teve o orçamento necessário para sustentar a sua plena implementação. Mesmo assim, o sistema é que segurou todas as dificuldades que estamos enfrentando com a pandemia. Ficou evidente a importância do SUS para as pessoas, porque assegura que qualquer um de nós tenha atendimento.

Porém, é necessário investimento mínimo para que possamos qualificar a atenção, o que ainda é um desafio, não só na disponibilidade de medicamentos e diversos outros insumos, mas também na valorização dos profissionais da saúde.

Eu acho, sim, que isso influenciou a nossa vitória, porque estamos tratando desse tema abertamente e pleiteando maior investimento no Sistema Único de Saúde e para os trabalhadores. Houve um atraso muito grande na aquisição de máscara e demais equipamentos de proteção para os profissionais. Ainda hoje, não temos testes suficientes em Belo Horizonte e no Brasil.

 

As crianças estão de volta aos sinais e isso é vergonhoso

 

Belo Horizonte teve um bom controle, comparada ao restante do país. Isso foi determinante, mas, mesmo assim, tivemos muitos óbitos que poderiam ter sido evitados caso o governo federal coordenasse medidas de contenção da contaminação. Agora vivemos um aumento dos casos e mortes no Brasil e na capital mineira por conta dessa descoordenação e banalização da morte e dos cuidados que deveríamos ter para evitar aglomeração nas ruas, no transporte público, no trabalho...

E faltou dar para as famílias a segurança de que elas teriam o que comer caso diminuíssem sua circulação. Não conseguimos alcançar isso, é uma tristeza. Infelizmente vemos a taxa de ocupação dos leitos aumentando novamente e o aumento dessa insegurança da população que não tem renda assegurada, que está empobrecendo, que está sofrendo com o desemprego e risco maior de mortalidade.

Também existe a fragilização das equipes de saúde pela contaminação dos próprios profissionais da área. Essa situação requer uma forte ação de saúde pública, coletiva e de proteção social.

Quais são as perspectivas do mandato da ColetivA? A renda básica para a população mais pobre de BH é uma proposta?

Sim. A Renda Cidadã é um projeto de mais de 30 anos do PT. Todas as pessoas deveriam ter direito a uma renda básica para não correrem o risco de acordar sem saber o que vão comer pela manhã ou de ir dormir com fome.

Estamos vendo o aumento da população de rua. Com a crise política, econômica e sanitária que vivemos, as crianças estão de volta aos sinais e isso é vergonhoso para uma sociedade. Não podemos ter sossego, tranquilidade e nem um sono justo enquanto convivemos com injustiças desse nível. É inadmissível.

Além da renda básica, queremos a escola integral e investimento na educação, porque ela é a possibilidade de desenvolvimento da potência que existe em cada um de nós. A saúde cuida, preserva, salva, e a escola desenvolve de tudo aquilo que podemos ser na vida.

Temos, ainda, que verdejar BH. O lazer, o espaço público, a cultura e o ar que a gente respira, a quantidade de parques… Tudo isso está relacionado à felicidade na cidade. Tudo isso é saúde.

 Violência contra as mulheres é uma área de grande preocupação nossa, assim como a discriminação por gênero e raça. Enegrecer BH é uma das nossas propostas. Reconhecer que a população negra sofre discriminação desde a escravidão e agir de forma positiva, afirmativa, com ações de inclusão social. O racismo é estrutural e cotidiano, assim como o machismo. Essas questões perpassam todos os aspectos da nossa vida nas relações humanas.

Precisamos tratar da discriminação da população indígena, porque temos uma população indígena urbana que tem necessidades específicas.

Na perspectiva de discriminação de gênero, queremos ressaltar que na saúde existe uma violência que é pouco falada, que é a violência obstétrica. É a violência na assistência da mulher durante o parto, que acontece em quase todas as maternidades e precisa de visibilidade. É uma forte luta nossa.

Uma das nossas pautas fundamentais é a abertura da maternidade Leolina Leonor, que é linda, um investimento público que gastou mais de R$ 10 milhões e há 12 anos está disponível, mas não funciona. Essa maternidade é um símbolo da luta das mulheres pelo respeito e atendimento digno durante o nascimento.

Fonte: https://www.brasildefatomg.com.br/2020/12/11/


2 comentários:

Rosélia disse...

As novas formas de organização política, mais horizontais e sem a figura do "cacique", ou mesmo de um líder, é o que mais representa o nascimento de um novo tempo, de novas esperanças. Avante!!!

Rosélia disse...

As novas formas de organização política, mais horizontais e sem a figura do "cacique", ou mesmo de um líder, é o que mais representa o nascimento de um novo tempo, de novas esperanças. Avante!!!

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