sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Ousadia e mesmice na política nacional. Poucos querem mudança.


Zé Dirceu e o esgotamento da agenda nacional

Rudá Ricci
Zé Dirceu se notabilizou, no interior do PT, pelas palestras que dava aos filiados. Fazia análises de conjuntura abrangentes em todos rincões do país. Nem todos sabem desta sua "frente de combate".

Nestes dias, publicou na internet as orientações para aquilo que entende ser tarefas do PT para 2013. Sugere uma agenda, ou pauta, como preparação para o 5º Congresso do Partido dos Trabalhadores, que deve se realizar em fevereiro de 2014. 

Não deixa de ser esclarecedor. Por diversos motivos. Um deles é que, até mesmo pelo estilo pessoal, Zé Dirceu não conseguiu montar apoiadores com fôlego para formulações. São meros operadores, quase todos mantendo aquele sorriso no canto da boca, já que dificilmente conseguem franzir o cenho. Outro motivo é a intenção de Zé Dirceu continuar orientando, ou tentando orientar a política petista, mesmo que virtualmente, de uma maneira mais vertical que a esboçada por José Genoíno (ao menos, nos últimos meses).

Vamos aos 4 pontos que destacou no referido artigo:

1) Continuar atacando toda e qualquer forma de exclusão, expressas também pelos baixos níveis de educação, pela deficiente formação para o mundo do trabalho, precárias condições ambientais, de habitação, de saneamento, de mobilidade urbana e de acesso à saúde.
2) Aprofundar as reformas estruturais imprescindíveis como a tributária, a agrária e a política, perseguir a melhoria dos investimentos públicos e privados, encontrar caminhos para uma gestão mais eficiente, resolvendo definitivamente os gargalos da infraestrutura e cuidando para evitar problemas na área energética, em que temos plenas condições de despontar como potência global.
3) Acelerar e ampliar as políticas de crescimento com distribuição de renda, geração de empregos e promoção da cidadania em meio a uma grave crise mundial não será tarefa fácil.
4) Engajar-se no esforço das entidades que lutam pela democratização da mídia, manter diálogo aberto com a população e lutar pela ampliação da participação social.

Uma agenda tem sentido. Mas que parece revelar certo esgotamento da criatividade petista. O PT sempre foi criativo em termos de agenda, muitas vezes a criatividade chegava à estratosfera, mas inovava. 

Mas a agenda proposta por Zé Dirceu está estacionada nos últimos dez anos. Se formos generosos, nos últimos seis anos. Mas seria mera generosidade, porque as reformas estruturais (tal como escreveu) simplesmente não foram implementadas porque o lulismo é uma composição por princípio. E todas lideranças políticas afirmam (ouvi isto de corpo presente de Palocci) que não há um menor consenso em relação a esta pauta. Não só entre partidos. 

Lembro do famoso seminário organizado pelo CDES para discutir a reforma tributária. Nós, da sociedade civil, ficamos perplexos com a precariedade da proposta. Dona Zilda Arns foi escalada para inquirir Palocci e Mabel sobre o motivo de terem "esquecido" os princípios da justiça social na nova política tributária. Foi além e perguntou o lugar da educação e da saúde. Não houve resposta, mas gaguejos e argumentos para evitar vinculações orçamentárias. As saídas para educação e saúde seriam receitas adicionais, como CPMF e Pré-Sal. 

Os itens 1 e 3 da agenda apresentada por Zé Dirceu se conectam. A questão é: como fazer isto se dela nasceram tantas defecções do governo e do PT? Citemos Marina Silva e até Gabeira, mas também os maiores formuladores das políticas urbanas. 

Finalmente, o item 4. Esta é uma ladainha que mais parece uma ameaça que política. E, imagino, não se supera o mero discurso em função do arranjo de interesses que marca o fordismo lulista, emoldurado pela velha cultura tupiniquim. 

Enfim, Zé Dirceu tenta organizar a partir do mesmo. O problema é que o mesmo já tem dono no PT. E parece inarredável deste posto. 

Como se percebe, o mensalão foi um duro golpe para esta geração de dirigentes petistas.

Publicado no Blog de Esquerda em Esquerda

Rudá Ricci é cientista político, professor universitário,sociólogo e doutor em Ciências Sociais. Diretor do Instituto Cultiva, é também diretor do Fórum Permanente do Orçamento Público. Autor de vários livros sobre Democracia Participativa. 

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