segunda-feira, 2 de novembro de 2009

A revolta das águas do Vale do Jequitinhonha

A revolta das águas
Os antigos sempre disseram que com a natureza não se brinca. Ela sempre dá um recado para os humanos que não a respeitam.
Com a enchente, muitos constataram: nunca viram isso no mês de outubro. É sinal dos tempos, além da cabalística do ano 9. Foi assim, em 29, 59, 79, 89 e agora em 2009. Só que acontecia em dezembro ou janeiro.
As águas se revoltaram. Resolveram mostrar sua cara de raiva, vermelha de barro.
As águas pediram empretado a cor da terra, tingiu-se de guerreira, pois já não conseguem cair nas folhas, mansamente descer pelo caule das árvores e penetrar na terra, participantdo da adubação do solo, do húmus, e gerar frutos para os bichos, inclusive o homem.
As águas resolveram arrancar as dragas de ouro e diamante que tomaram conta da sua cama, do seu leito, tornando o rio mais pobre e os mineradores mais ricos.
A água decidiu matar o boi, de afogadilho, pois ele pastava capim que substituiu as matas ciliares, os cabelos do rio, sua estrada natural.
A águas se rebelaram contra aqueles que construíram casas, quiosques e fizeram roça invadindo suas margens, suas ilhas, suas pedras, sua areia e sua terra fértil.
As águas que caíam na terra, sem nenhum amortecimento de árvores, morriam revoltadas e furavam o solo, saíram correndo, em alta velocidade, fazendo buracos, vossorocas, assoreando o rio, levando lixos, arrancando árvores. Desciam pelas ladeiras e se encontravam nas grotas com outras águas desembestadas. Juntavam-se e combinavam não se separarem, enchendo córregos e rios da Bacia Hidrográfica do Araçuaí.
Estas águas não perdoaram aqueles que desmatam e não recompõem a mata; que fazem estradas nas laterais das suas margens; que utilizam de queimadas para plantar; que preferem o campim à fruticultura ou ao reflorestamento de plantas nativas; que glorificam o eucalipto e condenam as árvores do cerrado e da caatinga.
Estas águas que caíram e se encontraram no leito do rio Araçuaí mostraram uma força líquida da natureza, um aviso do desrespeito que nós, os seres humanos, vimos fazendo há séculos com as questões ambientais.
E para quem acredita, aconteceu no dia 31 de outubro, o Dia das Bruxas!
E foi de madrugada, quando os homens e mulheres dormiam, sonhando com a próxima colheita.
Pois é, quem planta, colhe.
Quem desplanta, encolhe.

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