terça-feira, 28 de julho de 2015

É mesmo a “corrupção” que deixa a elite brasileira furiosa?

O problema da elite e de parte da classe média brasileira não                   é a corrupção. Para o doutor em Economia Róber Iturriet Avila, insatisfação tem mais a ver com ascensão social e aumento do         poder aquisitivo das classes menos favorecidas. “Na história do         Brasil, sempre que o salário mínimo e a renda média subiram,            houve algum tipo de intento golpista”

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Róber Iturriet Avila*
Três intelectuais de relevo trataram                recentemente acerca do ódio ao PT:                  Leonardo Boff, Luis Fernando Veríssimo                         e Luiz Carlos Bresser Pereira. Suas palavras                   têm a lucidez de quem enxerga além das           aparências e do senso comum.                               Embora o momento corrente não seja                 corriqueiro, um olhar histórico traz               ensinamentos.
Na Revolução Francesa, por exemplo,                            na           aparência havia uma ruptura lastreada em novos valores: Liberté, Egalité,                 Fraternité. O pano de fundo real era, entretanto, a emergência de um novo grupo.                            Em meio a um período econômico conturbado, a burguesia degolou o poder político                           e o status social da aristocracia.
No Brasil, a constatação de que a escravidão foi excessivamente longa já sinalizava                        que o arranjo da sociedade é deveras estamental. Políticas progressistas sempre               encontraram fortes barreiras conservadoras.
Os conflitos de 1954, por exemplo, foram intensos. Na superfície, o governo estava                  cercado diante dos “escândalos” de corrupção. A constante oposição na imprensa               desgastava Vargas. Em 1954, o então presidente aumentou o salário mínimo em 100%.              Quem não é ingênuo sabe que Vargas estava contrariando interesses empresariais,                     tanto com a concessão de direitos trabalhistas e civis, quanto com ampliações salariais.                     O suicídio foi a saída honrosa ao cerco montado.
João Goulart foi presidente em um período de conflitos. Seu governo concedia elevados             aumentos salariais, prometia reforma urbana, voto de analfabetos, elegibilidade de todos       brasileiros, reforma agrária, concessão de terras a trabalhadores rurais, justiça social,       emancipação dos brasileiros. Caiu! O receio do “golpe comunista” foi o discurso raso                       que justificava.
Vargas e Goulart saíram do poder ao tempo em que concediam direitos sociais,                      sobretudo aos menos favorecidos. Não é novidade que durante os governos do PT,                          os trabalhadores ampliaram sua renda, o salário mínimo cresceu de maneira contínua                        e houve uma série de programas sociais.
Não surpreende que, mais uma vez, setores da sociedade brasileira se ergam contra                        tais políticas, ainda que, escamoteadamente, o bordão seja “contra a corrupção”.
Evidentemente, existem elementos factuais dos governos Lula e Dilma que causaram         desconforto e indignação a todos os cidadãos. Contudo, é preciso muita inocência para            imaginar que as manifestações contra o governo são incentivadas pelo descontentamento             com a corrupção, pela elevação do preço do combustível ou da energia.                                       Quem tem conhecimento histórico e compreensão profunda da sociedade não ignora                          a ojeriza existente a um programa que garante R$ 35,00 para os pobres.                                            O ódio não é ao PT.
Conhecendo um pouco mais dos dados do Brasil se observa que houve dois momentos                     de crescimento relevante do nível dos salários: no período Getúlio Vargas – João Goulart                    e nos governos do Partido dos Trabalhadores.                                                                                     Os gráficos abaixo não apenas  demonstram esses movimentos como indicam que     presentemente o excedente operacional bruto caiu em relação ao produto total em                detrimento do incremento nos salários. Interesses poderosos estão sendo feridos.                           Não apenas segmentos estão perdendo, em termos relativos, como também regiões.                      Será mesmo preciso pintar de azul em um mapa qual região perde mais com a                 solidariedade distributiva?
salario2
salario3
salario4
*Róber Iturriet Avila é doutor em economia, pesquisador da Fundação de Economia                             e Estatística e professor da Universidade do Vale do Rio dos Sinos.

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