terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Municípios não informam corretamente como gastam dinheiro da educação

Municípios não informam corretamente 
como gastam dinheiro da educação
Recursos são controlados pela área de finanças ou de contador terceirizado



Suellen Smosinski, Do UOL, em São Paulo


Nas contas dos municípios – pelo menos no que se refere à educação – o detalhamento dos gastos é colocado de lado e as prestações de contas são mais relatórios que vão cumprir a burocracia que instrumento de gestão e planejamento. Essa é uma das conclusões que se pode tirar do estudo Perfil dos Gastos Educacionais nos Municípios Brasileiros, realizado pela Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação).
“Não dá para dizer que uma criança de educação infantil custa R$ 3,75 por ano, como fez uma prefeitura”, afirmou Cleuza Repulho, presidente da Undime. Numa prestação de contas no sistema federal de controle de gastos (o Siope - Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação), um secretário municipal informou esse valor.
Segundo o relatório da Undime, “não há controle prático sobre os gastos que efetivamente são registrados nos balanços contábeis como realizados para manutenção e desenvolvimento da educação”. Para se ter uma ideia, os municípios foram responsáveis por 39,1% das verbas investida no setor em 2009, contra 19,7% da União segundo um estudo publicado pelo Ipea no final do ano passado.

Erro

A tentativa (frustrada) de levantar o perfil dos gastos educacionais dos municípios brasileiros fez a Undime perceber que muitas secretarias não informam corretamente os valores ao Siope e, portanto, ao MEC (Ministério da Educação). Os formulários deveriam ser preenchidos pelos secretários municipais de educação de cada cidade, mas o estudo concluiu que, muitas vezes, essa atividade é terceirizada para escritórios de contabilidade.
Não haveria problema se os gestores mantivessem controle sobre quanto e como é gasto o orçamento da educação. Com isso, os dados oficiais sobre os investimentos em educação acabam distorcidos. A situação fica mais delicada no contexto da tramitação do PNE (Plano Nacional de Educação) na Câmara dos Deputados, em que uma das principais disputas é justamente o percentual do PIB investido na área.
Diante das inconsistências observadas no sistema federal, a Undime entrou em contato com prefeituras de mil municípios para realizar um estudo próprio, porém, muitas delas não responderam ao questionário ou apresentaram dados imprecisos. A região Norte, por exemplo, ficou de fora da estimativa sobre gastos por aluno com creche e EJA (Educação de Jovens e Adultos) e o Estado do Amapá não teve nenhum questionário respondido. O estudo final contou com apenas 224 municípios, o que representa 22,4% da amostra inicial.

Para a presidente da Undime, “os prefeitos devem ter nos secretários de educação um parceiro que saiba gerir as verbas de acordo com a necessidade do município”. Ela também afirma que o problema principal não é gestão e sim a falta de recursos. “Quando a gente consegue concentrar dinheiro e esforços faz toda a diferença para a qualidade da educação”, disse.

Gastos por aluno

Com os dados disponíveis, a Undime concluiu que o Nordeste gasta 4,4 vezes menos que o Sudeste por aluno na creche. Já, no ensino fundamental, a primeira região gasta pelo menos duas vezes menos que a segunda. “Nenhuma criança pode ter a sorte ou o azar de nascer em um local onde o gestor seja mais ou menos comprometido com a educação”, afirmou Cleuza sobre as desigualdades apontadas no estudo.

ESTIMATIVA DE VALOR POR ALUNO DAS REDES MUNICIPAIS POR REGIÃO (ANO DE 2009)

Etapa/modalidadeBrasil (R$)Norte (R$)Nordeste (R$)Centro-Oeste (R$)Sudeste (R$)Sul (R$)
Creche5.144,09Não informado1.876,893.092,808.272,435.835,42
Pré-escola2.647,101.710,271.531,562.384,123.757,214.461,54
Educação infantil3.122,361.801,531.605,482.563,074.971,264.688,83
Fundamental - séries iniciais2.815,462.554,901.948,803.048,213.649,113.586,73
Fundamental - séries finais3.134,382.998,452.276,163.000,044.322,813.673,78
Ensino fundamental2.937,652.676,692.034,892.987,513.897,773.582,99
EJA1.881,95Não informado1.075,832.417,912.778,522.369,89
* Fonte: Banco de dados da pesquisa Perfil dos Gastos Educacionais nos Municípios Brasileiros – Ano base: 2009/Undime

Comentário do Blog:
Como ex-Secretário de Educação de três municípios, posso afirmar de cadeira: os recursos da educação nos municípios passam longe do controle do gestor da área, embora ele seja responsável junto com o Prefeito pela administração dos recursos.

Boa parte dos recursos da educação cobre outras despesas municipais. São aquisições de material de consumo, de escritório, veículos, móveis e equipamentos para obras, administração financeira  e Gabinete do Prefeito.

Quase toda prefeitura do Vale do Jequitinhonha possui uma empresa terceirizada que cuida da organização e distribuição dos recursos locais. O orçamento é feito como peça técnica contábil e não um instrumento de planejamento de políticas públicas. Assim, a empresa senta com o prefeito e o secretário da área de administração e finanças e decide para onde vão os recursos.

Às vezes, nem mesmo os Secretários do setor de educação são consultados. Os gestores da área de administração e finanças acreditam que só eles podem determinar o que e onde gastar. Há Secretário que cuida das contas da Prefeitura como se fosse seu particular. E cuida mal. O pior é que muitos prefeitos gostam disso, centraliza tudo em uma ou duas pessoas. 


Quem assim age costuma dizer o seguinte: panela que muita gente mexe pode azedar o feijão. Eu, de cá, digo: panela que só um quer colocar tempero para servir pra muita gente pode produzir coisa que o povo não quer, pois ele não foi consultado, nem ouvido.


Muitas vezes, o orçamento é feito sem sequer consultar o Secretário de Educação. E sua execução também é feita assim. O que dirá se alguém ousar propor um Orçamento Participativo, com audiências públicas, o povo dando opinião e decidindo. Será excomungado. Coisa de outro mundo. "Cê tá ficando doido, moço?", é o que se ouve.

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