Poucos candidatos conseguem se eleger com gastos franciscanos nas disputas eleitorais.
Grandes empresas tem lucro 8,5 vezes maior quando financiam candidaturas.
Chico Alencar, deputado federal pelo PSOL - RJ.
Chico Alencar, deputado federal pelo PSOL - RJ.
Publicado no jornal O Globo, domingo, 20.04.14
‘Financiadores pressionam políticos para evitar CPIs’. ‘Deputados articulam aprovação a toque de caixa da PEC 172, para garantir o financiamento eleitoral pelas empresas’. As notícias mostram as primeiras reações à decisão do STF, ainda inconclusa, acolhendo a ADI 4650, da OAB, e vedando o financiamento de campanhas por pessoas jurídicas. Essas mal chamadas doações abrem portas para a corrupção, pavimentam o tráfico de influência e consolidam a desigualdade na disputa.
‘Eleição de um deputado federal no Rio custa, pelo menos, R$ 2 milhões’ é frase tão corriqueira quanto absurda! As somas variam de acordo com o eleitorado de cada estado, afrontando a Lei 9840, que proíbe a compra de votos. A cada eleição, a influência do poder econômico na esfera política aumenta: do pleito de 2002 ao de 2012, que consumiu R$4,5 bilhões, o crescimento foi de 471%!
Cristalizou-se a captura da política pelas forças econômicas: nas eleições proporcionais os recursos gastos com propaganda são gigantescos e os que se elegem com campanhas ‘franciscanas e claras’, exceção. Nas disputas majoritárias, para prefeituras de cidades médias e grandes, governos estaduais e da União, só vence quem consegue fundos milionários. Democracia de cartas marcadas. Apenas 1.900 pessoas jurídicas financiam 95% dos recursos das campanhas: plutocracia!
As maiores doadoras são empreiteiras e construtoras (2/3 das contribuições), bancos, frigoríficos, siderúrgicas e empresas do agronegócio – além de firmas de fachada, vinculadas a doleiros. Chamá-las doadoras é polidez: são investidoras. Estudos indicam que após financiar uma campanha vitoriosa para Executivos, as empresas obtém retorno 8,5 vezes superior ao dispêndio, em contratos de obras públicas, serviços ou desonerações. Confirma-se o “there is no free lunch” de Milton Friedman.
Embate eleitoral elevado é confronto de programas e visões, assumidos pelos partidos. Uma campanha em bases doutrinárias e ideológicas seria bem mais barata do que as da rotina eleitoral bienal, formal e banal, onde o marketing e o clientelismo predominam e a verba supre a carência do verbo. Candidato-sabonete: quanto mais atraente a embalagem maior a vendagem. Eleito, será despachante de quem o financiou. É até bíblico: ‘onde está o teu tesouro, lá está teu coração’...
Alegar que a proibição do financiamento empresarial de campanha estimulará o Caixa Dois é desacreditar na Justiça Eleitoral, no Ministério Público e nas possibilidades de se construir uma democracia substantiva no Brasil. Nela, quem burla as regras do jogo teria o registro de sua candidatura cassado. O próprio partido ficaria impedido, por um tempo, de disputar as eleições. Dura lex, sed lex!
Só pessoa física constitui a cidadania real, fonte e razão da nossa República. É do povo, não de estamentos econômicos, que emana o Poder, como dispõe o pétreo Parágrafo Único do Art. 1º de nossa Constituição.
*Chico Alencar é professor de História e deputado federal (PSOL/RJ)
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