Lei sancionada nesta quarta-feira (23.04) pela presidenta Dilma Rousseff consolida o protagonismo do Brasil na governança mundial da web. Por Najla Passos.
Brasília - A
presidenta Dilma Rousseff sancionou o marco civil da internet brasileira
nesta quarta (23.04), na abertura do Encontro Multissetorial Global Sobre o
Futuro da Governança da Internet (NetMundial). Aprovada pelo Sendo na
noite de ontem, a legislação consolida o protagonismo do Brasil na luta
global por uma internet mais democrática e segura. E, internamente,
mostra que, com articulação política e mobilização popular, o governo
petista pode sim avançar na polêmica pauta das comunicações.
“O Brasil tem muito a contribuir, a partir do amplo processo interno que resultou na lei do marco civil da internet, aprovada ontem pelo congresso nacional e que tenho a honra de sancionar, aqui, neste evento. A lei, que Tim Berners-Lee [tido como o pai da Internet] considerou um presente para a web em seu 25º aniversário, demonstra a viabilidade e o sucesso de discussões abertas e multissetoriais, bem como da utilização inovadora da Internet como plataforma interativa de debates”, afirmou Dilma aos participantes do encontro, que reúne representantes de 80 países.
A presidenta ressaltou a importância do processo de democratização da governança da internet, hoje hegemonizada pelos Estados Unidos, que deve respeitar princípios elementares aos direitos humanos, como o da privacidade. “O Marco Civil, exemplo de que o desenvolvimento da Internet não pode prescindir dos estados nacionais, é uma referência inovadora porque, em seu processo de elaboração, ecoaram as vozes das ruas, das redes e das instituições”, disse ela.
Legislação com DNA popular
A proposta de um marco civil para a internet brasileira começou a ser construída ainda no governo Lula, a partir de um eficiente processo de consulta à sociedade civil, que envolveu não só governo, como também especialistas e movimentos organizados. Por isso, desde o início, recebeu a chancela dos movimentos de luta pela democratização da comunicação, que batalharam pela aprovação do marco em todos os níveis.
Poderia ter ficado esquecida nos arquivos do Planalto como outras propostas populares de legislação para o setor, mas ganhou contornos de prioridade, no ano passado, após as denúncias formuladas pelo ex-funcionário da NSA Edward Snodew sobre a espionagem norte-americana nas comunicações e dados de cidadãos brasileiros, incluindo o próprio governo Dilma.
A presidenta denunciou a violação à ONU e ao mundo, ganhou apoio de representantes dos outros países vítimas da mesma prática e passou a encabeçar o descontentamento mundial com a hegemonia dos Estados Unidos no controle da rede de computadores. Para fazer jus ao posto, insistiu na aprovação do marco civil brasileiro e encaminhou à Câmara, em caráter de urgência, em outubro do ano passado, um projeto assinado pelo governo.
Apesar dos esforços da oposição em tentar vender a falsa ideia de que o marco era uma forma do governo tentar controlar o espaço, a população aderiu em massa à defesa do projeto. Dentre as inovações propostas e aprovadas, constam medidas protetivas do usuário, que impõem maior rigor punitivo contra a espionagem, ressaltando o caráter inviolável das comunicações, salvo por ordem judicial específica.
No restante, muda muito pouco a relação que o brasileiro já possui com a internet. Seu maior mérito, inclusive, é impedir que as empresas de comunicação possam cercear a livre circulação que hoje existe na rede, com base em demandas de mercado. O princípio da neutralidade, o mais polêmico, garante que o usuário possa acessar qualquer tipo de conteúdo disponível a partir do pacote contratado, à revelia do que era proposto pelas empresas de telecomunicações.
“A lei é importante porque afirma direitos dos usuários e estabelece limites para a atuação de operadoras e sites. Ela garante a liberdade de expressão na Internet ao prever a retirada de conteúdos apenas com decisão judicial. E, mais importante, deixa claro que a rede tem que ser neutra, impedindo que operadoras de telecomunicação possam vender pacotes com serviços diferenciados e discriminem os conteúdos que trafegam na rede”, esclarece Jonas Valente, da coordenação do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal.
Crise na Câmara X agilidade no Senado
Criticada pela oposição, a rápida tramitação do projeto no Sendo, de apenas um mês, comprovou que o assunto já saiu exaurido da Câmara, onde tramitou por mais de dois anos e chegou a se transformar no estopim da maior crise entre governo e base aliada. Apesar da forte resistência de siglas como DEM e PSDB, foi Eduardo Cunha (PMDB-RJ), líder do maior partido que dá sustentação à base aliada depois do PT, quem personificou no parlamento a oposição ao projeto encabeçada pelo mercado.
Sob o risco de não conseguir maioria de votos, o marco civil da internet travou a pauta da Câmara por cinco meses, até que o trabalho de negociação do governo conseguisse reverter o placar, com o acolhimento de emendas que não alteravam a essência do projeto: neutralidade, liberdade e proteção na rede. Cunha lutou enquanto pode contra a aprovação da matéria, em especial contra a o princípio da neutralidade, que tanto desagradou o mercado, mas acabou vencido. Com ele, as outras vozes que amplificava.
No Senado, a matéria encontrou ambiente já propício à aprovação. Na audiência pública convocada para discutir a matéria, nenhuma voz se levantou contrária.
Apenas alguns parlamentares da oposição tentaram atrasar o processo, alegando que a matéria merecia mais debate. A maioria, porém, não comprou a alegação e aprovou sem alterações o texto encaminhado pela Câmara, que já tinha o aval do governo e dos movimentos populares.
Por mais avanços
Enquanto comemoram o sucesso da empreitada, os movimentos pela democratização da comunicação já pensam além: se o governo Dilma conseguiu driblar opositores importantes como as empresas de telecomunicações para aprovar a legislação da internet, por que não ousar e encaminhar para o debate também a que prevê nova pactuação para a comunicação em geral?
Construído a partir de ampla participação popular na 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), em 2009, o projeto de marco civil da comunicação, que democratiza especialmente as concessões públicas eletrônicos, como a TV e o rádio, chegou a merecer uma análise criteriosa do então ministro da Secretária de Comunicação do governo Lula, Franklin Martin. Porém, desde então encontra-se engavetado pelo Planalto. A alegação mais corriqueira do governo é que não existe ambiente no parlamento para aprová-lo.
“A aprovação do marco civil da internet é uma evidência de que quando o governo quer pautar um tema há espaço para avanços no parlamento. Isso deveria ocorrer também no caso do marco legal das comunicações. Assim como é preciso garantir os direitos dos usuários da Internet, é necessário assegurar os direitos dos usuários das demais mídias. E este é o espírito de um novo marco regulatório de cunho democrático”, afirma Jonas Valente.
“O Brasil tem muito a contribuir, a partir do amplo processo interno que resultou na lei do marco civil da internet, aprovada ontem pelo congresso nacional e que tenho a honra de sancionar, aqui, neste evento. A lei, que Tim Berners-Lee [tido como o pai da Internet] considerou um presente para a web em seu 25º aniversário, demonstra a viabilidade e o sucesso de discussões abertas e multissetoriais, bem como da utilização inovadora da Internet como plataforma interativa de debates”, afirmou Dilma aos participantes do encontro, que reúne representantes de 80 países.
A presidenta ressaltou a importância do processo de democratização da governança da internet, hoje hegemonizada pelos Estados Unidos, que deve respeitar princípios elementares aos direitos humanos, como o da privacidade. “O Marco Civil, exemplo de que o desenvolvimento da Internet não pode prescindir dos estados nacionais, é uma referência inovadora porque, em seu processo de elaboração, ecoaram as vozes das ruas, das redes e das instituições”, disse ela.
Legislação com DNA popular
A proposta de um marco civil para a internet brasileira começou a ser construída ainda no governo Lula, a partir de um eficiente processo de consulta à sociedade civil, que envolveu não só governo, como também especialistas e movimentos organizados. Por isso, desde o início, recebeu a chancela dos movimentos de luta pela democratização da comunicação, que batalharam pela aprovação do marco em todos os níveis.
Poderia ter ficado esquecida nos arquivos do Planalto como outras propostas populares de legislação para o setor, mas ganhou contornos de prioridade, no ano passado, após as denúncias formuladas pelo ex-funcionário da NSA Edward Snodew sobre a espionagem norte-americana nas comunicações e dados de cidadãos brasileiros, incluindo o próprio governo Dilma.
A presidenta denunciou a violação à ONU e ao mundo, ganhou apoio de representantes dos outros países vítimas da mesma prática e passou a encabeçar o descontentamento mundial com a hegemonia dos Estados Unidos no controle da rede de computadores. Para fazer jus ao posto, insistiu na aprovação do marco civil brasileiro e encaminhou à Câmara, em caráter de urgência, em outubro do ano passado, um projeto assinado pelo governo.
Apesar dos esforços da oposição em tentar vender a falsa ideia de que o marco era uma forma do governo tentar controlar o espaço, a população aderiu em massa à defesa do projeto. Dentre as inovações propostas e aprovadas, constam medidas protetivas do usuário, que impõem maior rigor punitivo contra a espionagem, ressaltando o caráter inviolável das comunicações, salvo por ordem judicial específica.
No restante, muda muito pouco a relação que o brasileiro já possui com a internet. Seu maior mérito, inclusive, é impedir que as empresas de comunicação possam cercear a livre circulação que hoje existe na rede, com base em demandas de mercado. O princípio da neutralidade, o mais polêmico, garante que o usuário possa acessar qualquer tipo de conteúdo disponível a partir do pacote contratado, à revelia do que era proposto pelas empresas de telecomunicações.
“A lei é importante porque afirma direitos dos usuários e estabelece limites para a atuação de operadoras e sites. Ela garante a liberdade de expressão na Internet ao prever a retirada de conteúdos apenas com decisão judicial. E, mais importante, deixa claro que a rede tem que ser neutra, impedindo que operadoras de telecomunicação possam vender pacotes com serviços diferenciados e discriminem os conteúdos que trafegam na rede”, esclarece Jonas Valente, da coordenação do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal.
Crise na Câmara X agilidade no Senado
Criticada pela oposição, a rápida tramitação do projeto no Sendo, de apenas um mês, comprovou que o assunto já saiu exaurido da Câmara, onde tramitou por mais de dois anos e chegou a se transformar no estopim da maior crise entre governo e base aliada. Apesar da forte resistência de siglas como DEM e PSDB, foi Eduardo Cunha (PMDB-RJ), líder do maior partido que dá sustentação à base aliada depois do PT, quem personificou no parlamento a oposição ao projeto encabeçada pelo mercado.
Sob o risco de não conseguir maioria de votos, o marco civil da internet travou a pauta da Câmara por cinco meses, até que o trabalho de negociação do governo conseguisse reverter o placar, com o acolhimento de emendas que não alteravam a essência do projeto: neutralidade, liberdade e proteção na rede. Cunha lutou enquanto pode contra a aprovação da matéria, em especial contra a o princípio da neutralidade, que tanto desagradou o mercado, mas acabou vencido. Com ele, as outras vozes que amplificava.
No Senado, a matéria encontrou ambiente já propício à aprovação. Na audiência pública convocada para discutir a matéria, nenhuma voz se levantou contrária.
Apenas alguns parlamentares da oposição tentaram atrasar o processo, alegando que a matéria merecia mais debate. A maioria, porém, não comprou a alegação e aprovou sem alterações o texto encaminhado pela Câmara, que já tinha o aval do governo e dos movimentos populares.
Por mais avanços
Enquanto comemoram o sucesso da empreitada, os movimentos pela democratização da comunicação já pensam além: se o governo Dilma conseguiu driblar opositores importantes como as empresas de telecomunicações para aprovar a legislação da internet, por que não ousar e encaminhar para o debate também a que prevê nova pactuação para a comunicação em geral?
Construído a partir de ampla participação popular na 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), em 2009, o projeto de marco civil da comunicação, que democratiza especialmente as concessões públicas eletrônicos, como a TV e o rádio, chegou a merecer uma análise criteriosa do então ministro da Secretária de Comunicação do governo Lula, Franklin Martin. Porém, desde então encontra-se engavetado pelo Planalto. A alegação mais corriqueira do governo é que não existe ambiente no parlamento para aprová-lo.
“A aprovação do marco civil da internet é uma evidência de que quando o governo quer pautar um tema há espaço para avanços no parlamento. Isso deveria ocorrer também no caso do marco legal das comunicações. Assim como é preciso garantir os direitos dos usuários da Internet, é necessário assegurar os direitos dos usuários das demais mídias. E este é o espírito de um novo marco regulatório de cunho democrático”, afirma Jonas Valente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário