segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

Privatização do saneamento básico deixará milhões de sem-água

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O Futuro Incerto dos Sem-Água

por Elias Haddad Filho*

Em 2020 acontecerá no país a coleta dos dados do Censo Demográfico de 2020, a maior pesquisa de campo realizada decenalmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e cujos resultados preliminares deverão ser conhecidos ainda em 2021.
As informações  que virão do Censo 2020 mostrarão que a vida dos brasileiros terá regredido ou pouco avançado em vários aspectos, dentre eles em um setor praticamente esquecido pelas políticas públicas, o saneamento básico.  
Indicadores referentes ao período de 2010 até 2017 publicados no painelsaneamento.org.br apontam um quadro crítico do saneamento nos estados da Federação.  Dois desses indicadores se destacam: (a) a população total que mora em domicílios sem acesso à água tratada; e, (b) a população total que mora em domicílios sem acesso ao serviço de coleta de esgoto. Ambos melhoraram no País[1], tanto em termos percentuais, como em números absolutos.  Por outro lado, os mineiros sem água tratada ou sem serviço de esgoto aumentaram em números absolutos, embora tenha ocorrido pequena redução no percentual de mineiros sem coleta de esgoto[2]. Tais números indicam que Minas Gerais vivenciou uma década perdida na cobertura dos serviços de saneamento.
Sempre que se evidencia a situação de crônica baixa cobertura do abastecimento de água e do esgotamento sanitário – problemas recorrentes no Brasil e em vários estados da federação -, surgem pessoas, bem-intencionadas ou não, que apresentam como “a solução” do problema diversas propostas que incentivam a participação de empresas privadas no setor e a privatização das empresas estaduais de saneamento. É o que vimos de meados de 2018 para cá, no Congresso Nacional, inclusive com a tramitação de um projeto de lei (PL 3261/2019), bastante avançado na Câmara de Deputados, após aprovação a jato no Senado Federal.  Seria essa a solução?

No caso de Minas Gerais, a abertura do capital da empresa estadual de saneamento, COPASA MG, ocorrida em 2006, transformou uma empresa pública em uma empresa “quase” privada, uma vez que, a partir daquele episódio, sua gestão norteou-se sempre na busca por lucros cada vez maiores, sem se importar adequadamente com a universalização dos serviços no estado.  O sucesso nesta atuação tem se dado às custas da morosidade em assumir as concessões de municípios menores, bem como de pequenas localidades e comunidades rurais, que apresentam, via de regra, projeção de resultados deficitários. Com isso, perpetuam-se em nossas terras, as mineiras e as demais, uma legião de “Sem-Água”, desassistidos e invisíveis à insensibilidade de todas as esferas de governo.
Afinal de contas, quem são os “Sem-Água” que as concessionárias estaduais públicas têm deixado de fornecer seus serviços? Os estudos mais recentes têm mostrado que falta saneamento adequado às populações de mais baixa renda: pequenas localidades, áreas rurais e periferias das grandes cidades. No já citado Painel do Saneamento, como exemplo, é possível verificar que 65% dos habitantes de domicílios sem água tratada vivem em áreas rurais do estado de Minas. 
E o que tem feito o estado para resolver ou mitigar este problema? Com exceção da criação da COPANOR em 2007, empresa subsidiária da COPASA para a região dos vales do Jequitinhonha, Mucuri e São Mateus, e que tem sobrevivido a duras penas com seus constantes resultados negativos, a política estadual tem sido o que foi desde sempre – deixar a política de saneamento do estado de Minas Gerais à cargo da COPASA e suas ações. Política definida justamente pela empresa que colocou suas ações na bolsa de valores e luta diuturnamente para ampliar sua lucratividade e se recusa a atender aos pedidos angustiados de pequenos municípios que não conseguem nem investir, nem mesmo manter seus sistemas de abastecimento de água e de esgotamento sanitário.
A pergunta que fica é a seguinte: Quem poderá acudir os Sem-Água em nosso estado? Não será a COPASA de hoje ou uma COPASA efetivamente privatizada.  O problema mais grave é que água é um bem essencial à vida, não é algo do qual podemos abrir mão. Cabe aos nossos dirigentes estaduais, executivo, legislativo e judiciário responderem a esta questão aflitiva que toca profundamente as vidas dos mineiros mais humildes e desassistidos.
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 [1] No Brasil, a população total que mora em domicílios sem acesso à água tratada era de 34,6 milhões em 2010 e reduziu para 33,3 milhões em 2017, representando, respectivamente, 19,0% e 16,6% em 2010 e 2017. População total que morava em domicílios sem acesso ao serviço de coleta de esgoto era de  99,6 milhões em 2010 e reduziu para 95,8 milhões em 2017, reduzindo de 54,6% para 47,6% da população total.
[2] Em Minas Gerais, a população total que morava em domicílios sem acesso à água tratada era de 2,6 milhões em 2010 e aumentou para 3,8 milhões em 2017, passando de 13,9% para 18,2%. A população total que morava em domicílios sem acesso ao serviço de coleta de esgoto também subiu de 6,0 milhões para 6,3 milhões, entre 2010 e 2017, representando, em termos relativos, 31,8% e 30,0% da população nestes anos, respectivamente.
*Elias Haddad Filho é engenheiro e sanitarista.

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