Representante da sociedade civil da câmara técnica do Conselho Ambiental de Minas, Maria Teresa Corujo, foi a única a votar contra a ampliação da mina de Feijão, onde ocorreu o rompimento da barragem.
26 de janeiro de 2019 Aline Maciel
Apenas um
projeto minerário foi barrado na câmara técnica do Conselho Estadual de Política Ambiental de Minas Gerais (Copam) em 40 reuniões realizadas entre fevereiro de 2017 e janeiro de 2019, revelou Maria Teresa Corujo, representante do Fórum Nacional de Comitês de Bacias Hidrográficas (Fonasc), em entrevista Agência Pública.
Ela foi a única componente da Câmara Técnica Especializada em Mineração (CMI) que votou contra a ampliação e continuidade até 2032 das minas de Jangada e Córrego do Feijão, localizadas em Brumadinho, na grande Belo Horizonte, em 11 de dezembro de 2018, que terminou com placar de 8 a 1 para a Vale/SA.
Ontem, pouco mais de um mês depois, a barragem da mina Córrego do Feijão se rompeu espalhando um mar de lama. Foi como um déjà vu do desastre de Mariana ocorrido em novembro de 2015, aumentando ainda mais o temor de todos os mineiros que moram na mira de uma barragem de rejeitos.
Apenas um projeto minerário foi barrado na câmara técnica do Copam, informou Maria Teresa Corujo.
O órgão é composto por 13 membros, sendo cinco representantes
do governo do Estado, dois do governo Federal, três de entidades ligadas ao
setor produtivo – Instituto Brasileiro de Mineração, Sindicato da Indústria
Mineral do Estado de Minas Gerais, Federação das Associações Comerciais e
Empresariais do Estado de Minas Gerais – e outros três divididos entre Fonasc,
Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais e Conselho Regional de
Engenharia e Agronomia (Crea). “Nunca vi nenhum licenciamento que não
tenha sido aprovado, com exceção da última reunião em que foi o meu suplente,
do dia 16 de janeiro [passado], quando apareceu um parecer da Supram
(Superintendência Regional de Meio Ambiente) pelo indeferimento e eles votaram
pelo indeferimento. Eu até estranhei
porque todos os outros foram aprovados. Foi o primeiro parecer que eu vi em 40
reuniões da CMI que era pelo indeferimento”, diz.
Segundo Maria Teresa, considerada a única ambientalista que representa a sociedade civil no
grupo, a maioria de seus colegas costumam seguir os pareceres da Secretaria de
Meio Ambiente, como no caso envolvendo a mina de Córrego do Feijão, em que os
técnicos do Estado foram favoráveis ao empreendimento, apesar de denúncias
contrárias ao projeto feitas por organizações da sociedade civil. A mineradora
saiu da reunião com todas as licenças necessárias para seguir adiante com seu projeto.
De acordo com a ata, também foi pauta de
debate durante a votação o fato de o empreendimento, antes com classe 6 (grande
porte e potencial poluidor), ter passado para classe 4 (médio impacto
ambiental), o que facilita a obtenção da licença ambiental por mais dez anos.
Como foi a aprovação das licenças de ampliação das minas
de Jangada e Córrego do Feijão?
Em dezembro fizemos tudo para que não houvesse aquela licença, ainda mais [porque era] uma
licença ao mesmo tempo prévia, de instalação e operação, tudo no mesmo dia. Com
classe 4, um empreendimento que sempre foi classe 6, e uma ampliação para
aumentar a produção em mais de 70%. Nós fizemos tudo que era possível, não
adiantou de nada e teve a licença.
Vocês têm conhecimento se a Vale S.A. tinha iniciado as obras?
Não vamos
poder saber se com essa licença na mão, eles começaram a mexer alguma coisa
nessa barragem que rompeu. Pode ser que eles tenham começado outras partes
dessa ampliação. Isso nós não vamos saber, a
Vale nunca vai dizer. O importante é que na época nós questionamos a forma como
estava sendo licenciado [o projeto] a toque de caixa porque muitas questões
graves tinham que ser tratadas antes. Por exemplo, não foi apresentado balanço
hídrico para saber se essa ampliação iria continuar consumindo muita água subterrânea,
impactando aquíferos, se isso não ia precipitar mais ainda a segurança hídrica
ali do entorno. A comunidade Córrego do Feijão já depende de caminhão pipa
várias vezes por ano, [o município de] Casa Branca tem tido problema de acesso
à água. Nós apontamos várias questões graves e dissemos que, antes de qualquer
ampliação daquele complexo, tinha que ter uma avaliação sistêmica de tudo
aquilo para não se tomar decisões sem o devido cuidado.
Qual foi a reação dos outros conselheiros em relação às
denúncias apresentadas pelo Fonasc?
O empreendedor
e os técnicos da Suppri, que é Superintendência de Projetos Prioritários do
Estado, davam o tempo todo a entender que estava tudo certo, que o controle
ambiental estava ótimo, que as medidas mitigadoras estavam ok, que estava
perfeito aquele complexo, que era um exemplo. [Isso] para desqualificar a
preocupação manifestada por nós e pelas pessoas que se
manifestaram. Se o complexo Jangada/ Feijão estava tão ótimo que podia ter uma
ampliação como classe 4, e ao mesmo tempo receber LP (licença prévia) mais LI
(licença de instalação) mais LO (licença de operação), como se justifica o
rompimento dessa barragem hoje? E outra coisa: essa barragem estava com
estabilidade garantida pelo auditor, igualzinho a de Mariana, que também tinha
estabilidade garantida.
Como você avalia a aprovação de projetos minerários pelo Conselho?
Nós estamos em
uma situação catastrófica porque temos um estado (Minas Gerais), qualquer que
seja o governo, que dá pareceres a favor de conceder licenças para projetos
minerários com barragens, mas diz que não tem responsabilidade sobre o que o
empreendedor apresenta nos estudos, sobre a tecnologia, e sobre as barragens.
Isso o estado fala o tempo inteiro ‘que isso é responsabilidade do DNPM
(Departamento Nacional de Produção
Mineral). O DNPM diz que não tem funcionários suficientes para fiscalizar todas
as barragens, mas [diz] que o empreendedor apresentou todos os documentos
pedidos. E nós temos um Crea, lá no Conselho, que diz que a parte deles é só
ver se os Arts (Anotações de Responsabilidade Técnica) foram apresentados. E
nós temos barragens sendo licenciadas e ampliações a rodo. Ninguém querendo
pagar o pato do que aconteceu.
Algum licenciamento já foi barrado no Conselho de
Atividade Minerária?
Nunca
vi nenhum licenciamento que não tenha sido aprovado, com exceção da última
reunião em que foi o meu suplente, do dia 16 de janeiro, quando apareceu um
parecer da Supram (Superintendência Regional de Meio Ambiente) pelo
indeferimento e eles votaram pelo indeferimento. Eu até estranhei porque todos
os outros foram
aprovados. Foi o primeiro parecer que eu vi em 40 reuniões do Conselho que era
pelo indeferimento.
Na sua avaliação, de quem é a responsabilidade desta
tragédia?
A
responsabilidade é compartilhada. O Estado tem responsabilidade porque ele é o
órgão licenciador, cabe a ele fiscalizar, e cabe a ele apresentar os tais
pareceres, e ele apresenta sempre a favor – tanto é que ele apresentou a favor
desse complexo. O DNPM tem responsabilidade porque ele é quem trata da questão
da segurança de barragens, de todo o complexo de barragens. O Crea, nós
entendemos que iria se posicionar de uma forma mais crítica. O que adianta
essas anotações de responsabilidade técnica, desse tanto de papelada. Esse
monte de papelada adiantou para evitar mais essa tragédia?
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