terça-feira, 10 de janeiro de 2012

“O ORIGINAL É QUE É O RICO”: O CONSUMO DO ARTESANATO DO VALE DO JEQUITINHONHA

“O ORIGINAL É QUE É O RICO”: O CONSUMO DO ARTESANATO DO VALE DO JEQUITINHONHA
Juliana Pereira Ramalho; Sheila Maria Doula - Universidade Federal de Viçosa
juliana.ramalho@ufv.br; sheila@ufv.br
O Vale do Jequitinhonha, região nordeste de Minas Gerais, se destaca no cenário estadual e nacional pela diversidade de sua produção artesanal, sendo possível encontrar peças em fibras, cerâmica, madeira, sucatas, tecelagem, etc. Cada tipologia apresenta suas especificidades e suas diferenciações de acordo com o estilo de cada artesão.


No caso deste estudo privilegiamos o artesanato mineral (argila) e o vegetal (madeira) e podemos classificar as peças produzidas em peças utilitárias, utilitárias-decorativas, peças religiosas e peças figurativas ou ornamentais. Estes termos são utilizados pelos próprios artesãos que, dependendo da situação, utilizam também os termos “enfeite” ou “escultura” para se referirem ao artesanato ornamental ou figurativo.

Estas categorias, que podemos entender como resultantes do discurso local em contraste com o discurso externo, também são as mesmas utilizadas para a classificação ou subdivisão das peças para confecção de propagandas ou de catálogos, no caso de exposições ou feiras.

Estas categorias também são adotadas neste estudo para classificarmos as tipologias de peças encontradas durante a pesquisa de campo. Na categoria de peças utilitárias, são produzidos no Jequitinhonha panelas, pratos, xícaras, colheres, moringas, potes para água, gamelas (que seria o corresponde às bacias de plástico). Este tipo de produção é muito consumida pelas comunidades locais, até mesmo pela acessibilidade dos preços.

Apesar de alguns estudiosos afirmarem que no Vale do Jequitinhonha este tipo de artesanato deixou de ser consumido pelas comunidades locais, devido à entrada dos utensílios em plástico e alumínio, podemos afirmar que ainda existe um consumo significativo, especialmente de panelas. Há inclusive artesãos que direcionam sua produção para este tipo de público local.


Já as peças utilitárias-decorativas são aquelas que apesar de terem uma função utilitária apresentam formas de escultura, como as moringas de três peças, os potes que muitas vezes são usados como vasos para ornamentação ou filtros com cabeças de bonecas e também ocupam a categoria de enfeite. Aqui mostra-se a mobilidade do artesanato entre o útil e o belo, detentor ainda de sua aura criativa.

Outra modalidade frequente de peças artesanais são as mágico-religiosas. As peças religiosas são aquelas que remetem ao universo religioso especificamente o católico, em que podemos encontrar tanto as imagens sacras utilizadas pelos fiéis, como também outros personagens que remetem a este universo, como, por exemplo, o diabo. Estas peças podem ser encontradas tanto entre os ceramistas quanto entre os entalhadores.

No entanto, percebe-se uma maior tendência entre os entalhadores na confecção de peças destinadas ao culto. Já entre os ceramistas, as imagens sacras apresentam um hibridismo do discurso religioso com discursos políticos, sociais e ambientais. Este tipo de produção é decorrente da experiência coletiva mágico-religiosa que o artesão transfere para as suas peças.

A última categoria das peças ornamentais é dividida em dois tipos: os enfeites e as esculturas. Os enfeites são aquelas peças menores que não apresentam fins utilitários, mas possuem baixo valor no mercado. São representativas deste universo as flores com os vasos modelados em argila, as galinhas com os pintinhos, os animais domésticos e silvestres de pequeno porte, representações da arquitetura local, como as casinhas etc.
Estes enfeites geralmente são confeccionados em tamanho pequeno e muitas vezes também estão relacionados ao lazer. Especialmente no caso dos entalhadores, encontramos muitas peças que ao mesmo tempo em que são enfeites também são utilizadas no mundo lúdico, como os carrinhos de madeira, os bonecos, as bicicletas e por aí uma infinidade de outros objetos.
Já as esculturas apresentam um trabalho estético mais elaborado, são modeladas ou entalhadas em porte médio, diferentemente das miniaturas dos enfeites e dos brinquedos.

O artesanato escultórico do Jequitinhonha pode ser classificidado como representante de duas tendências: uma realista e descritiva com predomínio do humano nas suas mais diversas situações cotidianas - cozinhando, orando, fiando, fazendo biscoito; e outra tendência voltada para o imaginário fantástico, proveniente das imagens dos sonhos, dos mitos, das lendas locais, como as figuras de corpo humano e cabeça de animais, animais de duas ou várias cabeças, máscaras etc.
Ocupando funções liberais e urbanas, os consumidores de artesanato do Jequitinhonha revelaram ter um interesse maior pelas peças ornamentais. Esse interesse perpassa por diferentes motivações que podemos agregar em três grandes grupos: o primeiro é composto por aqueles consumidores que entendem as peças decorativas como representativas de uma cultura tradicional;
o segundo grupo avalia as peças artesanais pelo seu valor estético; os critérios estão relacionados à raridade em contraposição com o primeiro grupo que dá um peso maior na expressão da matriz cultural local. Ou seja, o interesse pelas peças se baseia nos elementos que expressam a cultura local. É importante notar que aqueles consumidores que enfatizam o valor artístico das peças, entendem a produção artesanal como uma expressão individual de cada artesão. Estes consumidores estão em busca dos artistas/artesãos.


E por fim, existem os consumidores de peças utilitárias que conciliam o discurso do valor estético com o discurso de que as peças são portadoras de identidade cultural na prática de seu consumo.
Resumo de artigo publicado pelo site do Polo Jequitinhonha/UFMG. Leia o texto completo clicando em polojequitinhonha/o.original.que.é.rico .

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