segunda-feira, 22 de março de 2010

Bastião, crônica de Fernando Brant

Bastião
Fernando Brant
O cientista político, no meio à descrição da vida de determinado governante brasileiro, lembra sua lutas nos bastiões da esquerda. Pronto,é hora de mudar de leitura. Certas palavras têm o poder de me afugentar. Há quanto tempo não lia ou ouvia tão pomposa palavra Bastião, ,como se sabe,é um posto avançado de defesa de um território e, figurativamente, um lutador em prol de uma causa.
Mas foi também moeda de Goa, de 300 réis, cunhada em homenagem a dom Sebastião, rei de Portugal, que morreu em combate e é esperançosamente aguardado, até hoje, por muitos
portugueses.
O sebastianismo é uma crença, quase doença, que acomete muitos povos amigos.
Bastião é também personagem do bumba meu boi. E tem a ver com o poeta Tião Nunes, com Sebastião Nuvens e todos os xarás que ele tem no mundo. Aí, eu fui procurar um precioso
livro que ganhei em recente visita a Itamarandiba. Trata-se do Dicionário Fanadês, jequitinhonhês e mineirês de Carlos Mota.
O certo é que me conforta, mais dos que
as muralhas e fortalezas defendidas por
divisões militares, a imagem que o menino
de Minas Novas via em sua infância

Fanadês, esclareço, vem do Rio Fanado, que corta a cidade de Minas Novas. Fanado quer dizer circuncidado e o rio foi assim chamado pelo bandeirante Sebastião (olha ele aí
outra vez) Leme do Prado, que, ao chegar a Minas Novas, encontrou muitos judeus portugueses que, tradicionalmente, circuncidavam seus filhos.
Mas o que eu estava procurando mesmo era mais notícias sobre os tais bastiões. Empanturrei-me com minha curiosidade. Reproduzo, pois o livro é raro pelas bandas das metrópoles, o que
diz Carlos Mota, que não sei se é parente do Beco do Mota: “Além de variação de tantos Sebastiões é também sutiã. Certa vez, ao balcão da loja do meu pai, ouvi uma moça da roça me sussurrar:
‘Oi fi, tira pra mim um parapeito’.
Não entendi e ela retificou: ‘Quero comprar um bastião.’ Revirei o depósito, não achei nem parapeito nem bastião. Ela, na verdade, queria comprar um sutiã.”
Os bastiões da esquerda e da direita não passam de suportes que os cronistas políticos, esses enganadores com pose de sábios, desfilam diante de nossos olhos e ouvidos, na ânsia de nos convencer de que eles sabem tudo o que ocorre e ocorrerá na vida política do país. Erram
tanto e com a mesma cara de pau dos cronistas esportivos e dos críticos de arte.
O certo é que me conforta, mais dos que as muralhas e fortalezas defendidas por divisões militares, a imagem que o menino de Minas Novas via em sua infância.
Mulheres lavando roupas dentro do rio, com os peitos à mostra, despidas da cintura para cima. No fim da tarde, quando o calor parecia o desses nossos dias, como quase nenhuma casa tinha chuveiro, quase toda a pequena cidade se mudava para dentro do rio. Homens, mulheres e crianças.
Naqueles bons tempos, bastião era só para os dias de festa..
Fernando Brant é poeta, cronista e compositor musical. Grande, permanente e principal parceiro de Milton Nascimento, com quem fez mais de 200 canções como Travessia, Maria, Maria, Coração de Estudante, Itamarandiba e muitas outras.
Esta crônica foi publicada no jornal Estado de Minas, caderno de Cultura, página 10, no dia 10 de março de 2.010.

Sugestão de publicação do amigo minasnovense, meio turmalinense, José Pinheiro Neto, o Zé de Tristão, Assistente Social que trabalha e mora em BH.

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