Ditadura Militar (1964-1985): lembrar e aprender para não repetir jamais.
Tristes lembranças da Ditadura Militar
31 de março de 1964 a 15 de março de 1985: golpe militar, perseguições, prisões, mortes e falta de liberdades democráticas.
"As nossas mortes não são nossas,
são de vocês.
Elas terão o sentido que vocês lhes derem".
Do filme "Lamentamos informar"
A noite de 31 de março para 1º de abril foi uma das mais tenebrosas da história do Brasil. Até assumir um presidente civil, em 15 de março de 1985, durante 21 anos, o governo militar cometeu atrocidades, perseguiu, prendeu, matou, proibiu reuniões, manifestações, qualquer coisa que pudesse ter cheiro de liberdade.
Foram proibidos livros, revistas, jornais, comunicações, reuniões que pregassem democracia, participação, solidariedade, justiça. Havia censura prévia para tudo: música, livro, peça de teatro, obras artísticas, jornais, rádios, TV. Só podia circular o que os militares permitiam.
são de vocês.
Elas terão o sentido que vocês lhes derem".
Do filme "Lamentamos informar"
A noite de 31 de março para 1º de abril foi uma das mais tenebrosas da história do Brasil. Até assumir um presidente civil, em 15 de março de 1985, durante 21 anos, o governo militar cometeu atrocidades, perseguiu, prendeu, matou, proibiu reuniões, manifestações, qualquer coisa que pudesse ter cheiro de liberdade.
Foram proibidos livros, revistas, jornais, comunicações, reuniões que pregassem democracia, participação, solidariedade, justiça. Havia censura prévia para tudo: música, livro, peça de teatro, obras artísticas, jornais, rádios, TV. Só podia circular o que os militares permitiam.
As reuniões de grupos familiares, amigos e militantes políticos eram vigiadas e proibidas, principalmente se discutissem política e fizessem críticas ao governo.
Associações, Sindicatos, as pastorais da Igreja Católica, os movimentos de reivindicações. Era tudo vigiado, pressionado, muitas vezes fechado. Greve e manifestações por direitos eram proibidos.
Associações, Sindicatos, as pastorais da Igreja Católica, os movimentos de reivindicações. Era tudo vigiado, pressionado, muitas vezes fechado. Greve e manifestações por direitos eram proibidos.
Pessoalmente, senti na pele e no coração os tempos sombrios da ditadura militar. Cheguei em Belo Horizonte, em janeiro de 1970, aos 15 anos, e tive informações ainda piores das que chegavam através de amigos e militantes políticos que resistiam à opressão. Tínhamos poucas notícias que chegavam pelo rádio, em Berilo e Minas Novas, no Vale do Jequitinhonha, no nordeste de Minas Gerais.
Matriculei-me no 1º ano do antigo científico do Colégio Estadual, no bairro Santo Antônio, onde o fervedor do movimento estudantil questionava os militares, os diretores e professores da escola que, segundo alguns alunos, eram agentes do DOPS, um órgão policial de vigilância política.
Movimento estudantil e sindical
Participava de reuniões do Grêmio Estudantil, meio desconfiado e com receio de ser preso. Colegas contavam que uma certa Dilma Roussef, de codinome Vanda, estudou lá e estava clandestina. Alguns meninos mais atrevidos participavam de reuniões de grupos políticos que praticavam guerrilhas urbanas. Alguns sumiam da escola e o zum-zum-zum de desaparecido político rondava em nossas cabeças e corações.
Aprendi novas lições, novos cantos, novas lutas.
Vários movimentos sociais surgiam, principalmente o de jovens estudantes nos colégios e universidades. Mas também os sindicais, contra a carestia, pela volta dos exilados, pela educação libertária.
Eu participava das manifestações de rua, contra o AI-5 ( lei militar que proibia tudo e ameaçava todo mundo), denunciando mortes, torturas, desaparecidos políticos, exílio de lideranças.
Tínhamos encontros frequentes nas escadarias da igreja São José, na Avenida Afonso Pena, com o Movimento Feminino pela Anistia, coordenado por Dona Helena Greco.
Como trabalhador do Banco Real, entrei no Sindicato dos Bancários, em 1976. De leve, fomos nos organizando um Grupo Cultural: cine-clube, teatro, exposição de artes, poesias e criações artísticas dos bancários.
No cine-clube, a censura do governo proibia filmes políticos. Quando conseguíamos dobrar a polícia secreta e, atrevidamente, rodávamos os filmes, a película era roubada pela polícia federal.
Descobrimos dentro do nosso grupo de teatro um agente federal infiltrado e o expulsamos. Começamos a ser ainda mais perseguidos, ameaçados diretamente ou por telefonemas. Eu trabalhava na agência da Avenida Paraná, onde os policiais federais recebiam seus salários. Quando identificava algum infiltrado nos movimentos, denunciava-os para as lideranças, de forma discreta. Alguns me identificaram e me interrogaram. Saía pela tangente. Os policiais identificados eram transferidos de BH.
Sobra o momento vivido pelos brasileiros Chico e Milton se manifestaram através da arte musical:
CÁLICE - Chico Buarque y Milton Nascimento - YouTube
www.youtube.com › watch
Dec 26, 2008 - Uploaded by lodedonbetoYou need Adobe Flash Player to watch this video. ... CÁLICE -Chico Buarque y Milton Nascimento
As idéias, as articulações, as agitações, as organizações fervilhavam ali mesmo. No murinho, nos DAs, nos Centro de Estudos, nas festas, nas reuniões infindáveis que varavam noite afora.
Nós, estudantes, fizemos o grande encontro de reorganização da UNE – União Nacional dos Estudantes, no Campus da Escola de Medicina, em 4 de junho de 1977. Vieram milhares de estudantes de todo o Brasil. Como os militares proibiram o Encontro, mais de 400 estudantes dormiram no pátio da Escola de Medicina.
No dia seguinte, quando achávamos que aquilo ali já era um começo de revolução democrática, o Exército, com a Polícia Federal e as polícias de Minas Gerais, cercaram tudo, prenderam as lideranças nacionais e os organizadores estaduais.
Fizeram um corredor polonês, com saída pro Hospital Borges da Costa, para quem quisesse deixar o local. Cada um de nós que passava levava pancadas e xingamentos de subversivos, comunistas, agitadores, filho da puta e outros nomes que não atrevíamos a contar para nossas mães.
Saímos pra rua e nos organizamos em passeata com gritos de Abaixo a Ditadura. Quando menos se esperava olha lá os tanques de guerra, as metralhadoras, os fuzis apontados pra nós, jovens que lutavam pelas liberdades democráticas.
Corríamos e entramos na Igreja São José. Criamos uma tática. Ao ser atacados apresentávamos a bandeira do Brasil como escudo protetor, como o toureiro se protege do touro. Os militares ensandecidos recuavam, assustados, com receio de ferir o símbolo da pátria.
Quem se atreveu a ficar na Escola de Medicina, foi preso. Mais de 4 mil estudantes presos e levados para o Parque da Gameleira.
Confira aqui: Quem se atreveu a ficar na Escola de Medicina, foi preso. Mais de 4 mil estudantes presos e levados para o Parque da Gameleira.
http://www.documentosrevelados.com.br/repressao/forcas-armadas/em-4-de-junho-de-1977-a-realizacao-em-belo-horizonte-do-iii-encontro-nacional-dos-estudantes-foi-impedido-de-acontecer-pela-ditadura-militar/
Greve era proibido fazer, ainda mais contra os vorazes banqueiros, financiadores do regime ditatorial.
Em agosto de 79, fizemos a primeira greve dos bancários na ditadura militar.
Alguns dias antes, no dia 28 de julho, no restaurante do Sindicato dos Bancários de BH, em nossa mesa de almoço, Lula, o lider metalúrgico de São Bernardo do Campo, dizia:
“ Sindicato pode pouca coisa para conquistar direitos dos trabalhadores. Temos que organizar um partido nosso, que defenda os nossos interesses. Mas, greve é um tipo de guerra. Quem mais perde são os trabalhadores. Só se faz quando não tem mais jeito, quando esgota todas as possibilidades de acordo". E nos aconselhou a negociar até esgotar todos os recursos.
Em negociação com banqueiros, em São Paulo, cobramos 24,3% de aumento salarial para reposição da inflação. Banqueiros deram a metade. Lideranças não aceitaram e categoria também não.
Greve geral, nos dias 16 e 17 de agosto de 1979.Em agosto de 79, fizemos a primeira greve dos bancários na ditadura militar.
Alguns dias antes, no dia 28 de julho, no restaurante do Sindicato dos Bancários de BH, em nossa mesa de almoço, Lula, o lider metalúrgico de São Bernardo do Campo, dizia:
“ Sindicato pode pouca coisa para conquistar direitos dos trabalhadores. Temos que organizar um partido nosso, que defenda os nossos interesses. Mas, greve é um tipo de guerra. Quem mais perde são os trabalhadores. Só se faz quando não tem mais jeito, quando esgota todas as possibilidades de acordo". E nos aconselhou a negociar até esgotar todos os recursos.
Em negociação com banqueiros, em São Paulo, cobramos 24,3% de aumento salarial para reposição da inflação. Banqueiros deram a metade. Lideranças não aceitaram e categoria também não.
Governo militar se sentiu desafiado.
Fizemos piquetes e fechamos diversas agências. Organizamos passeata em direção à agência do Banco do Brasil, na Rua Rio de Janeiro, em BH. Lá se dava toda a compensação de transação financeira diária de todos os Bancos. Era estratégico. Os milicos ficaram bravos. Partiram pra cima da gente. Na rua Tamoios, pelotão de choque. Bombas de gás lacrimogêneo, cassetete, pancadaria, prisões.
O Sindicato dos Bancários foi fechado pelo Ministério do Trabalho e ocupado pelo Exército e Polícia Federal. Prenderam 4 líderes do Comitê de Greve. Escondi-me na casa da namorada e de amigos.
Eu e vários companheiros fomos demitidos. Fui incluído entre os perigosos agitadores.
Embora tivesse uma boa ficha de trabalho, sem faltas ou atrasos, durante 6 anos no Banco Real, fui pra lista negra dos empregadores. Era barrado em todas as seleções profissionais.
Resolvi me virar dando aulas particulares e monitorias na UFMG, até me formar, em 1981.
Neste mesmo mês, agosto de 79, a lei da anistia foi publicada.
Muitos exilados voltaram para o Brasil. Eram nossos ídolos e nossos heróis. Outros saíram da clandestinidade.
Leonel Brizola, Miguel Arraes, José Dirceu, Betinho, Fernando Gabeira, Apolo Lisboa, o nosso presidente do Sindicato dos Bancários, Armando Ziller, preso, cassado e exilado. Tantos outros.
Faziam palestras, contando as agruras daqueles tempos bicudos.
E nos animavam com lições de luta e esperança, nos incitando a continuar pela democratização do país.
A música "O bêbado e o equilibrista", de João Bosco e Aldir Blanc, gravada por Elis Regina, virou o hino da anistia. Leonel Brizola, Miguel Arraes, José Dirceu, Betinho, Fernando Gabeira, Apolo Lisboa, o nosso presidente do Sindicato dos Bancários, Armando Ziller, preso, cassado e exilado. Tantos outros.
Faziam palestras, contando as agruras daqueles tempos bicudos.
E nos animavam com lições de luta e esperança, nos incitando a continuar pela democratização do país.
Ouça aqui:
http://letras.mus.br/elis-regina/45679/
O Bêbado e a Equilibrista- Elis Regina
mais.uol.com.br › view
Oct 5, 2011O Bêbado e A Equilibrista Elis Regina Caía a tarde feito um viaduto E um bêbado trajando luto Me ...
E assim foi, o que muitos ainda não sabem.
Meus filhos se assustam quando conto estas histórias. Incrédulos, não acreditam que tanta coisa fosse proibida de viver.
Cantamos:
“Caminhando e cantando e seguindo a canção,
somos todos iguais braços dados ou não.
Nos quartéis lhes ensinam antigas lições,
de morrer pela pátria e vive sem razão.
Vem, vamos embora que esperar não é saber,
quem sabe faz a hora não espera acontecer...” Canto-hino de Geraldo Vandré.
“Caminhando e cantando e seguindo a canção,
somos todos iguais braços dados ou não.
Nos quartéis lhes ensinam antigas lições,
de morrer pela pátria e vive sem razão.
Vem, vamos embora que esperar não é saber,
quem sabe faz a hora não espera acontecer...” Canto-hino de Geraldo Vandré.
Ou
"Hoje você é quem manda, falou tá falado, não tem discussão, não/ A minha gente hoje anda, falando de lado, olhando pro chão, viu/ Você que inventou esse estado e inventou de inventar toda a escuridão/ Você que inventou o pecado, esqueceu-se de inventar o perdão/
Apesar de você, amanhã há de ser outro dia/ Eu pergunto a você onde vai se esconder da enorme euforia/ Como vai proibir quando o galo insistir em cantar/ Água nova brotando
e a gente se amando sem parar". Apesar de você, de Chico Buraque.
Ouça a música aqui:
e a gente se amando sem parar". Apesar de você, de Chico Buraque.
Ouça a música aqui:
Chico Buarque - Apesar de Você - YouTube
www.youtube.com › watch
May 22, 2011 - Uploaded by Victor CarvalhoApesar De Você Chico Buarque Composição : Chico Buarque(Crescendo) Amanhã vai ... You need Adobe ...
É claro, Geraldo Vandré.
Algumas lembranças da ditadura no Vale do Jequitinhonha
No Vale do Jequitinhonha, muita gente era perseguida, presa, morta ou desaparecida.
O jornal Geraes surgiu, em 1978, para denunciar a opressão da ditadura militar na região e defender os valores genuínos do Vale. Seus diretores e colaboradores eram perseguidos pelo coronelismo politico da região.
Tadeu Martins e Carlos Figueiredo, de Itaobim; Aurélio Silby, de Santana do Araçuaí, de Ponto dos Volantes; e George Abner, de Pedra Azul, eram estudantes universitários em BH e, com a cara e a coragem, desvendaram a ditadura na região, e , ao mesmo tempo, promovia o movimento de identidade cultural e política do Vale do Jequitinhonha.
Leia mais aqui: http://cantaminas.blogspot.com.br/2011/05/jornal-geraes-veiculo-de-resistencia.html
Em Diamantina (MG), Paulo Freire era vedado nos colégios de 2º grau de formação de professores, conta o pedagogo Sinésio Bastos:
— Era uma obra tão proibida que uma vez , em 1971, fui acusado de pregar revolução armada por ter falado de Freire na faculdade de filosofia da cidade.
José Prates, ex-prefeito de Salinas, estudante de Arquitetura da UnB - Universidade de Brasília., foi exilado pro Chile, após manifestação em frente à Embaixada dos Estados Unidos, em Brasília.
Apolo Lisboa, professor de Medicina da UFMG, também de Salinas, era exilado para a Argélia, na África. Hoje, é candidato ao governo de Minas, pelo PSB-Rede.
Idalício Soares Aranha Filho, militante do PC do B, foi assassinado na Guerrilha do Araguaia, em 1972. Ele era de Rubim, no Baixo Jequitinhonha. Estudou Psicologia, na UFMG, tendo sido liderança estudantil.
Nilmário Miranda, jornalista, de Teófilo Otoni, foi preso e torturado. Depois de 2 anos, foi solto. É deputado federal (PT-MG), tendo sido Ministro dos Direitos Humanos, no governo Lula.
Capitão, amigo carioca de Inocêncio Leite, de Minas Novas, dava aulas no Ginásio Minas Novas. Foi perseguido e assassinado pelo Exército, na Estrada Definitiva, hoje BR 367, perto do hoje Posto Chapadão, em Turmalina, no Alto Jequitinhonha.
O professor Manoel Viana, de Padre Paraíso, foi preso, torturado e tirado de circulação por vários meses. Ameaçado de morte, não soube ou não pôde contar onde esteve. Faleceu em Itaobim, há 3 anos.
Quem viveu e queria viver mais corria risco de morte.
A morte era a sina. Mas a vida saiu por cima.
Embora tantas mortes, tantos cortes.
Criamos o clima,
Da liberdade,
Da solidariedade,
Da manifestação,
Da libertação.
Embora tantas mortes, tantos cortes.
Criamos o clima,
Da liberdade,
Da solidariedade,
Da manifestação,
Da libertação.
O jornalista, ex-ministro dos Direitos Humanos e hoje deputado federal Nilmário Miranda (PT-MG) escreveu um livro que conta bem esta história de mortos e desaparecidos políticos durante a Ditadura Militar, em todo o Brasil. "Dos filhos deste Solo" é o nome do livro. De registro, documentário de páginas tristes da nossa história.
Os jovens têm muito a conhecer e aprender. Os adultos também.
E não permitir que aconteça nunca mais ambientes sombrios de falta de liberdades democráticas.
Para que a vida floresça e a esperança cresça.
Publicado em 1° de abril de 2010, neste Blog. Republicado em 29.03.2014 e atualizado em 30.03.14, às 09:40 h.
Conheça mais sobre a Ditadura Militar aqui:
http://blogdobanu.blogspot.com.br/2014/03/dez-razoes-para-nao-ter-saudades-da.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário