terça-feira, 9 de julho de 2013

Receita Federal: Ex-prefeitos presos foram alertados de ilegalidade, mas tocaram o negócio crentes na impunidade

Os ex-prefeitos José Benedito Nunes Neto (de Janaúba) e Warmilon Fonseca Braga (Pirapora) e Luiz Tadeu Leite (de Montes Claros) foram presos pela Polícia Federal.

MONTES CLAROS (por Luís Cláudio Guedes) – Recomenda-se a leitura da sentença da juíza da Comarca de Pirapora, Arlete Aparecida da Silva Coura, no processo que ganhou o nome fantasia de operação ‘Violência Invisível’. O texto será especialmente interessante para estudantes de Direito, jornalistas acomodados, advogados e, sobretudo, aos novos e atuais prefeitos. A narrativa da magistrada é excelente libelo contra a malandragem travestida do extenuante serviço dos agentes públicos para o bem-comum.

Desencadeada na terça-feira, dia 2 de julho, pela Polícia Federal, a operação 'Violência Invisível' levou para a cadeia sete pessoas, das nove que tiveram a prisão decretada, entre elas o empresário Mateus Roberte Carias, apontado como mentor do esquema e os ex-prefeitos de Pirapora, Warmillon Fonseca Braga (DEM), e de Janaúba, José Benedito Nunes (PT). O ex-prefeito de Montes Claros, Tadeu Leite (PMDB), também está com prisão decretada. Ele está refugiado em Miami, nos Estados Unidos.

O texto da juíza Arlete Aparecida relata as peripécias de Mateus Roberte Carias, ora trancafiado em um presídio de Vitória, nos Espírito Santo, e de como ele deu baixa na empresa Instituto de Gestão Pública (Urbis) para criar a Digicorp Consultoria e Sistemas Ltda. A Digicorp é responsável por levar gente graúda e que se julgava muita esperta de 11 estados da federação, aí incluído o Norte de Minas Gerais, para a cadeia.

Entre elas, os ex-prefeitos José Bendito Nunes (Janaúba), Warmillon Braga (Pirapora) e Luiz Tadeu Leite (Montes Claros), este último é dado como foragido pela Polícia Federal em lugar incerto e não sabido, quiçá os Estados Unidos da América. Os três têm em comum o fato de que caíram em legítimo conto do vigário aplicado por Mateus Roberte e seus asseclas. Os envolvidos no esquema são acusados pela juíza Arlete Coura da prática dos crimes de peculato, lavagem de dinheiro, quadrilha ou bando, falsidade ideológica e fraude à licitação. A Urbis, e depois a Digicorp do falsário Mateus Roberte, vendia aos prefeitos incautos precatórios judiciais e títulos podres para fins de compensação junto à Receita Federal e ao INSS.

Durante as investigações, a Polícia Federal identificou rastros da Digicorp também nos municípios Rio Pardo de Minas, Capelinha, Várzea da Palma, Águas Vermelhas, Varzelândia, Itambacuri, Ipatinga e também no Consórcio Intermunicipal de Saúde da Rede de Urgência do Norte de Minas (Cisrun), além, claro de Pirapora, Janaúba e Montes Claros.

PREFEITOS SABIAM DA ILEGALIDADE...
O mundos, como se sabe, é dos mais espertos. Mateus Roberte embolsava comissões que podiam chegar a até 30% do valor das licitações – direcionadas, diga-se de passagem – em troca de papéis sem nenhum valor. Em contrapartida pelo serviço, ele entregava aos prefeitos bocós reles protocolos da Receita Federal, sem nenhuma garantia de abatimento efetivo das dívidas dos municípios com o Tesouro Nacional. Os supostos títulos da dívida pública federal eram adquiridos pelos municípios com um bom deságio em relação ao valor de face, mas os pedidos de compensação fiscal eram indeferidos e o povo dos municípios governados por essa gente lesada, lesado permanece em prejuízos milionários.

Agora o mais grave, segundo relata a juíza Arlete, com base nas investigações da Polícia Federal e do Ministério Público: José Benedito, Luiz Tadeu Leite e Warmillon Braga sabiam o que estavam fazendo. A história é longa e por isso será resumida para efeito de texto jornalístico: os ex-prefeitos norte-mineiros foram alertados pela Polícia Federal e por auditores fiscais da Receita Federal (Gilmar da Silva Medeiros, Hamilton de Medeiros Leite e Antônio Roberto de Souza) para a ilegalidade das licitações e seus efeitos.

E mesmo assim tocaram em frente seus negócios com a Digicorp, talvez na certeza da impunidade assegurada a quem tem dinheiro suficiente para contratar bons advogados em defesa de suas contendas.
Após consultas feitas à Receita Federal do Brasil o então presidente da Comissão Permanente de Licitação da Prefeitura de Pirapora Eduardo Souza Bezerra cancelou, no dia 23 de março de 2012, a licitação para comprar dos precatórios oferecidos pela Digicorp. O jeito de enxofre no ar não impediu que, duas semanas depois, em 09 de abril do mesmo ano, outro processo licitatório com o mesmo objeto fosse instalado.

Em seu depoimento, um dos titulares da comissão de licitação Cláudio Tadeu Fernandes Teixeira disse que o ex-prefeito Warmillon Braga determinou a revogação da primeira licitação por "indícios quanto à falsidade da documentação apresentada pela Digicorp". Segundo Cláudio, foi o próprio Warmillon Braga que determinou a reabertura do procedimento licitatório, nos mesmos termos do procedimento anterior, que foi novamente vencido pela mesmíssima Digicorp.

CERTIDÃO FALSA
Em Montes Claros não foi diferente. O auditor Gilmar Medeiros disse que foi procurado pelo então prefeito de Montes Claros Luiz Tadeu Leite. Na ocasião o teria “advertido e às pessoas que o acompanhavam, sobre a manifesta ilegalidade das compensações que estavam sendo efetivadas e dos graves problemas que certamente seriam acarretados ao município de Montes Claros”. Tadeu ouviu e fingiu que o assunto não era com ele. “Mesmo após a nossa reunião, o município de Montes Claros efetivou compensação de crédito tributário judicial", diz o auditor Medeiros.

O retrato do ex-prefeito Luiz Tadeu Leite que emerge das linhas da juíza Arlete Aparecida não é lá muito lisonjeiro. A Receita Federal e a Polícia Federal dizem ter fortes elementos para supor que o ex-prefeito de Montes Claros falsificou uma certidão para contrapor a impugnação da tentativa de compensação tributária com os papéis podres que a Prefeitura comprou da Digicorp.

Segundo depoimento do auditor Gilmar Medeiros, o documento apresentado por Tadeu Leite “é absolutamente falso e foi utilizado como suposta prova da legalidade das compensações, pelo próprio e então prefeito do município de Montes Claros”. Na sentença, a juíza anota que “todos os documentos apresentados tanto pelo município de Montes Claros, quanto os demais municípios que trataram com a Digicorp e que se basearam em comunicação de habilitação de crédito subscrita por Cláudio Maia Silva são absolutamente falsas". A sentença não dá mais informações sobre quem possa ser esse Cláudio Maia. Se é que existe.

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