Livros na mão e pé na estrada Em contrapartida, alunos mineiros conquistam vagas em outros estados
O mineiríssimo “uai” não é mais soberano nos câmpus das instituições federais no estado. Ao lado dele, expressões como painho, mainha e até o “tchê” ocupam cada vez mais espaço. Na era do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) e do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), uma mistura de sotaques tomou conta de universidades, institutos e centros tecnológicos, graças a uma espécie de “êxodo estudantil” cada vez mais consolidado. Afinal, com uma única prova ficou mais fácil se candidatar a vagas no ensino superior de qualquer parte do país, pagando uma inscrição apenas e, muitas vezes, tendo de se deslocar somente para fazer a matrícula. Os números dão a dimensão da nova cara do ensino superior: a quantidade de alunos vindos de outras unidades da federação para estudar em Minas cresceu 45% nos dois primeiros anos do Sisu.
Em todo o Brasil, o número de matrículas de alunos que se mudaram de estado aumentou 30% na comparação das primeiras edições do Sisu. Em Minas Gerais, do total de 2.907 estudantes que ingressaram nas federais do estado por meio do sistema no primeiro semestre do ano passado, 26,5% vieram de outros estados, de acordo com o Ministério da Educação (MEC). Os campeões da imigração são os paulistas (1.080 matrículas), seguidos por capixabas (84) e fluminenses (80). Os números do primeiro semestre deste ano ainda não estão fechados, mas o balanço dos anos anteriores dá a ideia de que a tendência dessa migração é de crescimento.
A primeira edição do Sisu contou em todo o país com 51 instituições, 47.913 vagas e 793.910 inscritos. No primeiro semestre do ano passado, 83 estabelecimentos de ensino aderiram, 83.125 cadeiras foram ofertadas e mais de 1 milhão de candidatos concorreram a cada uma delas. Este ano, cerca de 1,7 milhão de estudantes puderam escolher entre 95 instituições e disputar quase 110 mil vagas.
Vindo de Fortaleza (CE), Vítor Eduardo Laureano Dalle Piagge, de 18 anos, é um dos estudantes que deixaram seu estado para cursar uma universidade mineira. Os colegas da república Ninho do Amor, onde ele mora, se apressaram a rebatizar o novato: Inhambu, nome de um pequeno pássaro. O apelido agradou a Vítor, que está no segundo período de engenharia civil na Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), cidade à qual chegou em agosto de 2010. O rapaz, que é paulista, mas residia no Nordeste, foi selecionado por meio do Sisu.
Ele planejava ingressar na Universidade Federal do Ceará (UFC), mas não obteve pontuação suficiente. Não se arrepende de ter escolhido a Ufop. “Não achei que tivesse uma estrutura tão boa. Os laboratórios são bem equipados”, elogia. Na capital cearense, ele morava com os pais, com quem fala uma ou duas vezes por semana, por telefone. “Sinto saudade da família, da praia, mas sempre quis viver em república e o pessoal me recebeu muito bem. Aqui as pessoas são mais abertas para fazer amizade, a convivência está me ajudando a perder a timidez. Fiquei mais independente, meu amadurecimento se acelerou.”
No Rio
Mas, se tem gente vindo, tem muitos mineiros indo e, literalmente, “invadindo a praia” dos outros. Depois de São Paulo, Minas Gerais é o segundo estado que mais exportou estudantes no ano passado – 1.405 contra 4.327. O destino principal: o Rio de Janeiro, onde houve 529 matrículas. E é para lá que foi o estudante do primeiro período de farmácia Arthur Henrique Pimentel Lopes, de 20. Ele foi selecionado para uma cadeira na Universidade Federal Fluminense (UFF), em Niterói, Região Metropolitana do Rio. Na época, tentou também medicina na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mas não passou na segunda etapa.
O efeito da migração dos universitários é sentido na composição da turma: apenas cinco alunos são de Niterói. Além de Minas, tem gente de São Paulo, Pará e Rio Grande do Sul. “Andando pela faculdade dá para perceber que são muitos os sotaques”, conta. Para Arthur, o grande desafio foi a adaptação. “O mais difícil é estar longe da família, dos amigos, da namorada e em um lugar onde você não conhece nada. Tem que adaptar a alimentação, comer em restaurante e fazer o
próprio macarrão. Tem dias que saio de casa às 7h e volto às 19h. Quero comer, mas a última coisa que quero é cozinhar”, brinca. O jovem mora numa república, com outros três estudantes de períodos finais da faculdade. Na casa, é proibido beber, fumar e levar pessoas que não sejam moradoras.
Arthur garante que os tempos de farra ficaram para trás e, agora, a vida se resume à casa e aos estudos para dar conta das oito disciplinas por semestre. Nos fins de semana, ele aproveita os momentos de folga para ir à praia no Rio e a algum bar. “Procuro opções que me possibilitem não chegar tarde em casa, pois não tenho confiança ainda de ficar andando por lá”, afirma.
Para Arthur, o Sisu foi uma comodidade: “De BH mesmo consegui acompanhar o processo e fazer quase tudo. Precisei ir a Niterói só para fazer matrícula”. Agora, ele está em BH esperando as definições da greve parcial a que a universidade aderiu. Com algumas aulas e outras não, ele ainda estuda para manter o ritmo nas matérias que deverá repor. O mineiro tem na ponta da língua o resumo da experiência de estar longe de casa: “Não me arrependo de ter ido, embora a adaptação tenha sido puxada para mim. Sempre morei com meus pais e nunca tinha saído de casa, fiz isso de uma hora para outra. Mas nada é impossível. O estudo me prende, pois, se não pegar no livro, não saio do primeiro período.” (Com Tiago de Holanda)
Em todo o Brasil, o número de matrículas de alunos que se mudaram de estado aumentou 30% na comparação das primeiras edições do Sisu. Em Minas Gerais, do total de 2.907 estudantes que ingressaram nas federais do estado por meio do sistema no primeiro semestre do ano passado, 26,5% vieram de outros estados, de acordo com o Ministério da Educação (MEC). Os campeões da imigração são os paulistas (1.080 matrículas), seguidos por capixabas (84) e fluminenses (80). Os números do primeiro semestre deste ano ainda não estão fechados, mas o balanço dos anos anteriores dá a ideia de que a tendência dessa migração é de crescimento.
Fiquei mais independente, meu amadurecimento se acelerou - Vítor Eduardo, paulista que estuda em Ouro Preto |
A primeira edição do Sisu contou em todo o país com 51 instituições, 47.913 vagas e 793.910 inscritos. No primeiro semestre do ano passado, 83 estabelecimentos de ensino aderiram, 83.125 cadeiras foram ofertadas e mais de 1 milhão de candidatos concorreram a cada uma delas. Este ano, cerca de 1,7 milhão de estudantes puderam escolher entre 95 instituições e disputar quase 110 mil vagas.
Vindo de Fortaleza (CE), Vítor Eduardo Laureano Dalle Piagge, de 18 anos, é um dos estudantes que deixaram seu estado para cursar uma universidade mineira. Os colegas da república Ninho do Amor, onde ele mora, se apressaram a rebatizar o novato: Inhambu, nome de um pequeno pássaro. O apelido agradou a Vítor, que está no segundo período de engenharia civil na Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), cidade à qual chegou em agosto de 2010. O rapaz, que é paulista, mas residia no Nordeste, foi selecionado por meio do Sisu.
Ele planejava ingressar na Universidade Federal do Ceará (UFC), mas não obteve pontuação suficiente. Não se arrepende de ter escolhido a Ufop. “Não achei que tivesse uma estrutura tão boa. Os laboratórios são bem equipados”, elogia. Na capital cearense, ele morava com os pais, com quem fala uma ou duas vezes por semana, por telefone. “Sinto saudade da família, da praia, mas sempre quis viver em república e o pessoal me recebeu muito bem. Aqui as pessoas são mais abertas para fazer amizade, a convivência está me ajudando a perder a timidez. Fiquei mais independente, meu amadurecimento se acelerou.”
No Rio
Mas, se tem gente vindo, tem muitos mineiros indo e, literalmente, “invadindo a praia” dos outros. Depois de São Paulo, Minas Gerais é o segundo estado que mais exportou estudantes no ano passado – 1.405 contra 4.327. O destino principal: o Rio de Janeiro, onde houve 529 matrículas. E é para lá que foi o estudante do primeiro período de farmácia Arthur Henrique Pimentel Lopes, de 20. Ele foi selecionado para uma cadeira na Universidade Federal Fluminense (UFF), em Niterói, Região Metropolitana do Rio. Na época, tentou também medicina na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mas não passou na segunda etapa.
O efeito da migração dos universitários é sentido na composição da turma: apenas cinco alunos são de Niterói. Além de Minas, tem gente de São Paulo, Pará e Rio Grande do Sul. “Andando pela faculdade dá para perceber que são muitos os sotaques”, conta. Para Arthur, o grande desafio foi a adaptação. “O mais difícil é estar longe da família, dos amigos, da namorada e em um lugar onde você não conhece nada. Tem que adaptar a alimentação, comer em restaurante e fazer o
Andando pela faculdade dá para perceber que são muitos os sotaques - Arthur Pimentel, mineiro que estuda em Niterói |
Arthur garante que os tempos de farra ficaram para trás e, agora, a vida se resume à casa e aos estudos para dar conta das oito disciplinas por semestre. Nos fins de semana, ele aproveita os momentos de folga para ir à praia no Rio e a algum bar. “Procuro opções que me possibilitem não chegar tarde em casa, pois não tenho confiança ainda de ficar andando por lá”, afirma.
Para Arthur, o Sisu foi uma comodidade: “De BH mesmo consegui acompanhar o processo e fazer quase tudo. Precisei ir a Niterói só para fazer matrícula”. Agora, ele está em BH esperando as definições da greve parcial a que a universidade aderiu. Com algumas aulas e outras não, ele ainda estuda para manter o ritmo nas matérias que deverá repor. O mineiro tem na ponta da língua o resumo da experiência de estar longe de casa: “Não me arrependo de ter ido, embora a adaptação tenha sido puxada para mim. Sempre morei com meus pais e nunca tinha saído de casa, fiz isso de uma hora para outra. Mas nada é impossível. O estudo me prende, pois, se não pegar no livro, não saio do primeiro período.” (Com Tiago de Holanda)
Jornal Estado de Minas
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