Crime é crime em qualquer circunstância e seja lá quem o cometa. Corrupção é corrupção, independentemente da filiação política, religiosa ou sindical de quem roube. Esse é o entendimento das pessoas comuns que, mesmo as com maior nível de instrução formal, têm um raciocínio simples e objetivo acerca do que é certo e do que errado e de como as coisas devem funcionar. Rejeitam a complexidade do raciocínio jurídico que complica o que é simples, as dificuldades burocráticas que infernizam suas vidas, o discurso prolixo que parece estar sendo feito apenas para embromar e enrolar. As pessoas comuns, especialmente as de bem, também não gostam de privilégios para alguns e manifestações externas de poder.
Não tem nenhum sentido revestir ou encobrir um crime ou um roubo de dinheiro público pela luta política. Os que procuram fazer isso já deveriam ter entendido que, além de não levar a nada, essa não é a percepção da população. O criminoso e o corrupto têm de se submeter a todos os ritos policiais e judiciais, sejam governistas ou oposicionistas, de esquerda ou de direita, petistas ou tucanos, e assim por adiante.
As tentativas feitas no Senado para livrar o senador Delcídio do Amaral da prisão decretada pelo Supremo Tribunal Federal não deixaram bem os que defenderam o voto secreto e a soltura do parlamentar. Estava claro que o voto secreto estava sendo defendido para dar aos senadores uma chance de livrar Delcídio da prisão sem prestar contas aos eleitores. As alegações de respeito à Constituição e defesa da soberania do Legislativo foram meros pretextos para que os senadores protegessem o colega e se autoprotegessem de ter de encarar o mesmo destino.
Os deputados e senadores que fizeram e aprovaram a Constituição de 1988 estabeleceram, convenientemente, que só podem ser presos em flagrante. Certo, é o que está vigente, mas é claro que fizeram isso para terem um privilégio negado às pessoas comuns, pois a imunidade parlamentar deveria estar restrita à manifestação de opinião, por palavras e votos. De qualquer maneira, o Supremo Tribunal Federal entendeu que o crime continuado, com o objetivo de obstruir a ação da justiça, justifica a prisão preventiva em flagrante.
A soberania do Legislativo não se estende à extraterritorialidade ou à proteção de criminosos que se abrigam no Congresso. É absurda a existência de uma aberração denominada “polícia legislativa”, que se sente no direito de impedir o acesso de agentes da Polícia Federal aos prédios do Congresso ou a residências de parlamentares. A necessária soberania do Legislativo também nada tem a ver com impedir o cumprimento dos ritos policiais e judiciais pelos suspeitos de terem cometidos crimes, ainda que sejam “excelências” que usem os ridículos broches de parlamentar na lapela.
Não interessa se Delcídio é do PT ou se foi do PSDB. As gravações mostram que cometeu um crime. Não interessa se o banqueiro André Esteves é mais amigo de Lula e Mantega ou de Aécio e Serra. Pelo jeito, é também suspeito de crime grave.
Não tem sentido querer impedir ou desqualificar as investigações da Lava-jato ou da Zelotes, ou qualquer outra, porque a maioria dos suspeitos esteja vinculada ao PT e partidos aliados do governo. Mas têm razão os que reclamam da seletividade das investigações da Lava-jato, que parecem se limitar aos governos petistas, deixando de lado os tempos tucanos. Têm razão também os que protestam contra a marcha lentíssima em que andam os processos referentes aos mensalões tucanos e do DEM e à notória corrupção nos contratos ferroviários de São Paulo.
A chamada grande imprensa também politiza as operações contra a corrupção, ao enfatizar as vinculações governistas dos acusados e minimizar as ligações com o PSDB e seus próceres. Mas há tempo a grande imprensa tomou uma clara posição política e, em diferentes graus, não esconde isso.
A corrupção desenfreada não começou em 2002, com Lula, nem se limita à esfera federal. Houve corrupção em governos anteriores e ainda há em governos estaduais e prefeituras de partidos que fazem oposição ao governo federal. Mas é bobagem os petistas e aliados quererem reduzir a importância do que está sendo investigado e apurado como se fosse apenas luta política.
A maioria da população não aceita mais a corrupção, nem as firulas jurídicas e os discursos politizados para defender os corruptos. Não aceita também que parlamentares que, além de tudo são comandados por Renan Calheiros e Eduardo Cunha, tenham privilégios e se coloquem acima das pessoas comuns.
A postura dos partidos diante das investigações, de um lado e de outro, só tem contribuído para desmoralizar cada vez mais a política e os políticos. Não é só o PT que está perdendo, e muito. São todos. Isso já poderá ser verificado nas eleições do ano que vem.
Fonte: Brasil 247
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