O peso das regalias do poder
Qual a justa medida para determinar o quanto devem receber de salário integrantes do Executivo, Legislativo e Judiciário
Publicado em 15/04/2012 | ROGERIO WALDRIGUES GALINDO E SANDRO MOSER
Na última semana, vieram à tona em reportagem do Fantástico, da Rede Globo, por exemplo, casos de políticos que recebem até 18 salários por ano e que têm diárias de mais de R$ 4 mil para fazer viagens. Também se tornaram comuns histórias de servidores públicos que, burlando a lei, conseguem incorporar jetons e outras gratificações, e passam a receber mais do que o teto legal de R$ 26,7 mil.
Abusos
Injustiça é cometida quando há benessese penduricalhos
A semana que passou foi pródiga em revelar benesses absurdas concedidas a políticos. Reportagem do Fantástico mostrou, por exemplo, que deputados estaduais do Amapá recebem R$ 2,6 mil por dia para fazer viagens dentro do estado. A matéria revelou que o hotel mais caro do Amapá cobra R$ 280 por noite e o prato mais caro (para seis pessoas) custa R$ 100. Sobram mais de R$ 2,1 mil por dia.
Uma outra conta, feita pelo site Congresso em Foco, mostrou que o pagamento de 14º e 15º salários a deputados federais e a senadores custa ao país R$ 252 milhões por ano. Há um projeto tramitando no Congresso para reduzir o número de salários anuais a 13 – como acontece com a maior parte dos trabalhadores brasileiros.
Para o enconomista e diretor da organização não-governamental Contas Abertas, Gil Castello Branco, os “penduricalhos” são exatamente o que torna a remuneração dos políticos injusta. “O salário é alto, mas até não é exorbitante. O problema são essas gratificações que, sob vários nomes, vão aumentando o bolo que temos de pagar a eles”, diz.(RWG)
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Afinal, políticos ganham bem?
No mês passado, durante as discussões sobre um possível corte no pagamento dos 14.º e 15.º salários para congressistas, uma declaração do senador Ivo Cassol (PP-RO) gerou polêmica: “O político no Brasil é muito mal remunerado”, disse o senador.
Justa medida
Mas, afinal, existe uma medida justa para determinar quanto um juiz, um deputado ou um membro do Executivo pode receber? Os especialistas dizem que não há como fazer um cálculo preciso. Porém, garantem que há modos de encontrar um meio termo entre o governo gratuito (que não existe) e o governo pesado demais (que a sociedade não está disposta a bancar).
Por um lado, o professor de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) David Fleisher afirma que é importante pagar bons salários a políticos. “Primeiro, existe o argumento de que isso diminui o risco de corrupção. Mas o mais importante é permitir que pessoas que não fazem parte da elite econômica possam disputar os cargos”, afirma.
Na Grã-Bretanha, por exemplo, só a partir dos anos 1890 foi possível que trabalhadores chegassem ao Parlamento. E, para Fleisher, ao contrário do que ocorria com os lordes, era fundamental que recebessem salário. Por outro, diz o professor, é necessário impedir abusos, como o recebimento de 18 salários por parte dos deputados estaduais do Maranhão. “Não pode pagar pouco, mas é nítido que existem exageros.”
De acordo com Roberto Romano, professor de Ciência Política e Ética na Unicamp, outro modo de determinar qual é o valor justo a se gastar com os integrantes do poder público é fazendo uma comparação do Brasil com outros países. “Tem que observar quanto pagam países de economia sólida, como Estados Unidos, Alemanha, França, e comparar com o Brasil”, diz ele. “E estamos ganhando”, afirma.
A organização não-governamental Transparência Brasil, publicou em 2007 um estudo que analisou gastos com as casas parlamentares de 11 países. O levantamento elaborado pela entidade revelou que o Brasil tinha o segundo custo mais alto para manter cada parlamentar, ficando atrás apenas dos Estados Unidos. Dividindo o custo do Parlamento pelos 594 integrantes – ou seja, 81 senadores e 513 deputados que compõem o Congresso Nacional – o Brasil gastava em média, por ano, R$ 10,2 milhões com cada parlamentar.
Influência é mais valiosa que remuneração
Muito além dos valores pagos pelo Estado como salários e dos benefícios do exercício de cargos e mandatos, a atuação política no setor público possibilita a manifestação de uma rede de “poderes ocultos”. Difíceis de mensurar, estes poderes “intangíveis”, segundo especialistas, superam a remuneração financeira paga aos agentes públicos.
Entre eles estão a “carteirada”, a barganha em votações, o tráfico de influência e outras formas de desvio da função pública para atender a interesses particulares. Para o cientista político Fernando Azevedo, estas prerrogativas “extrapolam o valor nominal do holerite e dos benefícios” e seriam a principal força de atração para ingresso no setor público. “É o poder de pressionar, de colocar ou retirar assuntos da agenda política de criar politicas públicas para atender a algum interesse.”
Ele destaca também outro benefício escondido do poder público é a “valorização do passe” do ex-agente público que acumula “experiência e capital social” durante a sua função pública para usá-las posteriormente no setor privado.
Já o cientista político Ricardo Caldas, da Universidade de Brasília (Unb), o que leva as pessoas para a política acaba sendo a ascensão social e a busca de prestígio e poder. Ele acredita que o político brasileiro, muitas vezes, serve-se do setor público como meio para aumentar seu patrimônio. Segundo Caldas, há ainda uma falha sistêmica na raiz do serviço público. “Temos que verificar o que não está funcionando, pois o nosso sistema político não está gerando representantes, ele está gerando oportunistas.”
Colaborou: Antonio Carlos Senkowski, especial para a Gazeta do Povo
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