quarta-feira, 3 de novembro de 2010

A tarefa do governo Dilma

A tarefa do governo Dilma
Roberto Unger

A tarefa do governo Dilma Rousseff é construir um novo modelo de desenvolvimento, baseado em ampliação de oportunidades econômicas e educativas.

A democratização de oportunidades e o fortalecimento de capacitações não dependem apenas de investimentos e de obras. Dependem, também e sobretudo, de novas instituições e de
novas ideias.


Em educação, o tema prioritário, este projeto passa por iniciativas que reconciliem a gestão das escolas pelos Estados e municípios, com padrões nacionais de investimento e de qualidade; que substituam o enciclopedismo informativo superficial por ensino analítico e capacitador e que criem, em torno desta prioridade nacional, uma mística capaz de entusiasmar e de unir os brasileiros.

Em indústria e serviços, a tarefa do novo governo requer ações que abram em favor de dezenas de milhares de pequenas e médias empresas, a parte mais importante de nossa economia, o acesso a crédito, tecnologia, conhecimento e práticas avançadas.

Em agricultura, na qual nossas condições incomparáveis de sol, solo e água nos reservam papel preeminente, exige dar atributos empresariais para a agricultura familiar. E recuperar, em favor de uma lavoura eficiente e sustentável, as pastagens degradadas que hoje constituem grande parte do território nacional.

Nas relações entre capital e trabalho, demanda mudanças nas leis para resgatar da informalidade cerca de 40% da população economicamente ativa e para proteger a parte crescente de assalariados na economia formal em situação de trabalho precarizado: temporários, terceirizados ou autônomos.

Consubstancia-se a tarefa no desenvolvimento das políticas regionais -para o Nordeste, a Amazônia, o Centro-Oeste e o Sul-, entendidas e conduzidas como construção convergente do novo projeto nacional, adaptado às circunstâncias de cada um dos "Brasis".

Em todos os setores, aponta para a necessidade de adensar os vínculos entre nossas vanguardas produtivas e culturais e o resto do país. Esta obra libertadora e democratizante repousa sobre dois pressupostos: um, macroeconômico; o outro, político.

O pressuposto macroeconômico é o de reafirmar o realismo e a responsabilidade fiscais (não viver além de nossos meios), combinados com aumento duradouro da poupança pública e privada, a ser canalizada para o investimento produtivo de longo prazo.

O pressuposto político é o de tomar medidas que tirem a política da sombra corruptora do dinheiro: financiamento público das campanhas eleitorais, consolidação das carreiras de Estado e revisão do processo orçamentário, resgatado do pântano que continua a ser hoje e posto a serviço do planejamento estratégico de longo prazo.

A viabilidade da obra resulta, de um lado, dos avanços alcançados no governo Lula; de outro lado, da transformação social do Brasil. Mais importante ainda, entre aqueles avanços, do que as políticas sociais é que, ao se identificar com Lula, o povo brasileiro aceitou-se a si mesmo.

Na transformação social, o que mais importa é o surgimento de uma segunda classe média, vinda de baixo e comprometida com uma cultura de autoajuda e de iniciativa. Já está no comando do imaginário popular. Praticar as inovações que permitam à maioria seguir o exemplo destes emergentes é o sentido da obra a executar.

Não basta popularizar oportunidades para consumir. É preciso capacitar os brasileiros, ao ampliar-lhes as oportunidades para aprender, trabalhar e produzir. E, deste modo, assegurar a primazia dos interesses do trabalho e da produção.

O atributo mais importante do Brasil é sua vitalidade: desmesurada, anárquica, quase cega. Dar braços, asas e olhos a essa vitalidade é a tarefa do governo Dilma.

Roberto Unger é professor titular na Universidade Harvard (EUA) e foi
Ministro Extraordinário de Assuntos Estratégicos (governo Lula).
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