terça-feira, 20 de dezembro de 2016

Em Minas, 14 mulheres são agredidas, por hora.

Ataque contra segurança e delegada em Três Corações expõe ainda mais o tipo de violência

Ferimento. A segurança Edvania Nayara divulgou nas redes sociais o resultado da agressão que sofreu


















Publicado em 20.12.16, às 03:00h, por Joana Suarez, no Jornal O TEMPO.
Já fazem sete anos que um vídeo com a imagem de um homem matando uma cabeleireira a tiros dentro de um salão de beleza em Belo Horizonte mostrou até onde a brutalidade contra a mulher pode chegar. Nesse fim de semana, um outro vídeo com imagens de um homem desferindo um soco e chutando a cabeça de uma vigilante caída ao chão, em Três Corações, no Sul de Minas, logo depois de agredir a própria mulher – uma delegada responsável pelo atendimento a vítimas de violência doméstica – provocou reação semelhante na sociedade, apesar de não ter sido fatal como o de 2010.


Mas, infelizmente, é longe das câmeras e dos olhos das pessoas que muitas mulheres sofrem diariamente com agressões causadas por homens. São, em média, 14 casos por hora no Estado registrados na polícia em Minas. A cada mês, 47 mulheres são assassinadas.



No primeiro semestre deste ano, de acordo com o último levantamento da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp), 62.567 vítimas foram agredidas, sendo 7.084 na capital. Cerca de 24 mil dessas mulheres foram atacadas pelo companheiro atual, e 20 mil pelo ex.

Segundo a Assistente Social Lizian Maria Silva Martins, somente na comarca de Araçuaí, no Médio Jequitinhonha,  foram registradas, em 2015, 120 casos de ameaças e lesão corporal e 136 pedidos de medidas protetivas.



O agressor de Três Corações, o comerciante Luis Felipe Neder, 34, foi preso em flagrante e teve a detenção convertida pela Justiça em prisão preventiva, ficando no sistema prisional, agora, por tempo indeterminado. Ele está respondendo por ameaça, lesão corporal leve e grave. A Polícia Civil instaurou dois inquéritos referentes a lesão corporal e a violência doméstica.



Relembre. Antes de agredir a vigia Edvania Nayara Ferreira Rezende, 23, com um soco no rosto que a derrubou no chão e depois chutar a cabeça dela, Neder discutia e agia agressivamente contra a sua mulher Ana Paula Kich Gontijo, 44, delegada da Polícia Civil.



O crime ocorreu no último sábado dentro do Clube dos Subtenentes e Sargentos do Exército da cidade, mais conhecido como Clube Atalaia, onde Edvania trabalhava como segurança particular e foi defender Ana Paula quando viu a briga com Neder. O comerciante deu ainda um soco na boca de um outro segurança, quebrando dois dentes dele. Neder chegou a sacar um canivete e ameaçar a todos no local.



A Polícia Militar foi chamada pelas pessoas que presenciaram as agressões e filmaram tudo. As imagens foram parar nas redes sociais, onde provocaram repercussão em todo o país.



A Lei Maria da Penha prevê que seja instaurado inquérito mesmo que a vítima de violência doméstica não faça a denúncia. Como houve lesão, registrada nas imagens, a investigação ocorre independentemente da vontade da delegada.



A mulher do agressor não quis falar sobre o caso. Ela prestou depoimento nesse domingo (18) e, ao deixar a delegacia, evitou os repórteres. No dia da agressão, ela fugiu de Neder no meio da confusão, como relatou o boletim de ocorrência da Polícia Militar. Horas depois da fuga, Ana Paula ligou para o 190 e perguntou se o companheiro havia sido preso. A PC não informou se ela continuará responsável pelo atendimento a mulher no município.

Especial. Em outubro de 2015, O TEMPO publicou uma semana de matérias sobre violência doméstica, com vítimas e especialistas. Veja em www.otempo.com.br/hotsites/que-amor-é-esse


ONDE BUSCAR AJUDA

Coordenadoria dos Direitos da Mulher (Comdim) e Conselho Municipal dos Direitos da Mulher. Rua Tupis, 149, 10º andar, Centro. Tel.: 3277-9758/56; 3277-4346.


Benvinda – Centro de Apoio à Mulher. Rua Hermílio Alves, 34, Santa Tereza. Tel.: 3277-4379.



Casa de Direitos Humanos. Avenida Amazonas, 558,Centro. 1º andar. Centro Risoleta Neves de Atendimento. Tel.: 3270-3235; 2º andar. Núcleo de Defesa da Mulher (Nudem). Tel.: 3270-3202.



Consórcio Mulheres das Gerais. Rua Adamina, 155, Santa Tereza. Tel.: 3484-2387;



Delegacia Especializada de Crimes contra a Mulher. Avenida Augusto de Lima, 1942, Barro Preto. Tel.: 3275-1269.



Promotoria da Justiça e Defesa da Mulher. Avenida Álvares Cabral, 1.881, Santo Agostinho. Tel.: 3337-6996. Subsecretaria de Políticas para Mulheres de Minas Gerais. Cidade Administrativa. Edifício Gerais, 2º andar, Serra Verde. Tel.: 3916-8006


Internautas criam páginas de apoio à vigia e contra agressor

Após a divulgação do vídeo da agressão, várias páginas foram criadas no Facebook, algumas com mais de 15 mil curtidas, em apoio à vigia Edvania Nayara e contra o agressor Luiz Felipe Neder. Revoltadas com a atitude do comerciante, as pessoas divulgaram telefones dele que aparecem em um panfleto de propaganda de uma loja de material de construção. Ninguém atendia e a caixa postal de um dos números estava cheia.


Há informações de que Neder teria pelo menos três passagens pela polícia nos últimos anos por agressões e ameaças, inclusive contra funcionários dele, mas a Polícia Civil não confirmou. Na internet, Neder é chamado de monstro, covarde, psicopata e canalha.



O ator Alexandre Frota publicou apoio a Edvania em sua página, e o governador Fernando Pimentel (PT) também se manifestou: “Toda a minha solidariedade a Edvania, jovem agredida violentamente por um covarde (...)”.


PROJETO

Casa da Mulher não sai do papel

A proposta de integrar todos os órgãos de atendimento à mulher de Belo Horizonte em um só prédio, que se chamaria Casa da Mulher, não saiu do papel e não tem previsão. O projeto, que seria implantado neste ano, previa unir acolhimento e triagem, apoio psicossocial, delegacia, Juizado, Ministério Público, Defensoria Pública, promoção de autonomia econômica, cuidado das crianças, alojamento e central de transportes, e funcionaria durante 24 horas.


Ao invés de se juntarem, as instituições que amparam as vítimas estão agora ainda mais separadas. Até o ano passado, a delegacia de plantão da Mulher da capital ficava na Casa de Direitos Humanos, onde estão o Núcleo de Defesa das Mulheres (Nudem) e Centro Risoleta Neves de Atendimento (Cerna), na avenida Amazonas, 558, no Centro. Mas a unidade de plantão policial retornou para à Divisão de Atendimento à Mulher, Idoso e Pessoa com Deficiência da Polícia Civil (PC), no bairro Barro Preto, que investiga milhares de inquéritos.



A mudança pode ser compreendida como um retrocesso, pois, para concluir uma denúncia, a mulher tem que ir a diferentes lugares, incluindo a vara da Justiça e a promotoria especializadas, que também ficam em outros endereços.



Informações apuradas pela reportagem garantem que a delegacia de plantão saiu do imóvel conjunto no Centro por causa da cela que havia lá para os agressores presos em flagrante, o que ia contra a filosofia de uma casa de Direitos Humanos. Procurada no fim da tarde dessa segunda-feira (19), a PC não confirmou o motivo da mudança.

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