sexta-feira, 15 de maio de 2020

Dráuzio Varella: Valorizar o SUS e combater desigualdades são as lições da pandemia

O médico Dráuzio Varella debateu as consequências da pandemia 

com Carmen Silva, ativista pelo direito à moradia, 

que ressaltou que a falta de habitação adequada favorece 

a proliferação de doenças, dentre elas a COVID-19. 

Por Tiago Pereira, da Rede Brasil Atual

Reprodução/Youtube

"Nessas condições, todos nós vamos depender do SUS"
São Paulo – Para o médico oncologista Drauzio Varella, a valorização do Sistema
Único de Saúde (SUS) e o combate às desigualdades sociais no Brasil são as
principais “lições” que devem ser tiradas da crise representada pela pandemia de
covid-19. Segundo ele, o país deve se tornar, nas próximas semanas, o epicentro 
mundial da doença, superando os Estados Unidos, dada a elevada taxa de
disseminação e o total de casos registrados.
“A única arma que temos no momento é o isolamento social. Mas é muito difícil,
com a desigualdade que nós temos. Estamos agora pagando a conta de ter
aceitado a desigualdade social”, disse Drauzio, nesta quinta-feira (14), em debate
virtual realizado pela Oxfam Brasil. (Veja video completo no final do post).
O médico disse que é “mais fácil” manter o isolamento social para aqueles que
contam com moradia digna e acesso a serviços essenciais, o que não ocorre
nas regiões periféricas. “Se você mora num bom apartamento, com internet em
casa, com acesso à Netflix, fica mais fácil. Agora, num lugar sem internet, num
único cômodo, com crianças pequenas, como é que segura todo mundo dentro
de casa? É uma dificuldade”, ressaltou.
Por outro lado, ele afirmou que “é ilusão” defender a reabertura da economia
nesse momento. “A carga de doentes vai ser enorme. Os hospitais vão todos
entrar em colapso. As pessoas vão ficar com medo. Quando morre um familiar
ou amigo, todo mundo fica assustado. Assustado, você não vai trabalhar”, disse
o médico.
Drauzio também afirmou que, sem o SUS, a chegada do novo coronavírus teria
trazido também “barbárie e caos” no país. “Você não pode pensar – porque fez
um plano de saúde – , que nunca mais vai pôr o pé no SUS. Mas pode acontecer
que o hospital particular a que você tem direito não tenha mais vaga. Periga de
acontecer realmente. Nessas condições, todos nós vamos depender do SUS.”
O médico pediu o engajamento de toda a sociedade, incluindo políticos e
empresários, no combate às desigualdades. Segundo ele, até mesmo os mais
ricos pagam um “preço alto”, em função do abismo entre os mais ricos e os mais
pobres no Brasil.
“Vivem com casa toda cercada, têm que andar com seguranças. Se um filho ou
filha sai à noite, ficam desesperados e só vão conseguir dormir quando a filha
chegar. Por que o país tem que ser assim? Porque aceitamos isso com essa
naturalidade?”

Moradia digna

Já a coordenadora do Movimento Sem-Teto do Centro (MSTC) e da Frente de
Luta por Moradia (FLM) Carmen Silva destacou que habitação digna é a “porta
de entrada” para todos os outros direitos sociais, inclusive a saúde. “Um prédio
abandonado é uma questão de saúde pública. A falta da moradia é questão de
saúde. É um direito básico que não poderia ser negado a nenhum cidadão”.
Ela afirmou que a precariedade das habitações não é uma questão exclusiva
das favelas e periferias das grandes cidades, destacando que existem cortiços
e bolsões de miséria no centro de São Paulo. Num mesmo cômodo pequeno,
podem viver até mais de cinco pessoas, com adultos, crianças e idosos dividindo
o mesmo espaço, o que facilita a transmissão da covid-19, bem como de outras
doenças, como a pneumonia.
Pesquisa da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), em
parceria com a Fundação Getulio Vargas (FGV), divulgada no ano passado,
indica que o déficit habitacional no país é de 7,78 milhões de moradias.
Carmem citou que a primeira providência tomada após a ocupação de um
imóvel abandonado que não cumpre a função social da propriedade é fazer a
higienização do local. Além da retirada de lixos e entulho, os moradores fazem
a calafetação das paredes, para conter a disseminação do bacilo de Koch,
bactéria causadora da pneumonia.
“Direitos não podem ser mercadorias. Moradia, saúde, educação e cultura
são direitos básicos para a sobrevivência. Não precisamos criar nada. Temos
uma Constituição Federal que nos garante esses direitos. Vamos aprender a
exigir o que está na Constituição. Ouço falar muito em desobediência civil.
Ao contrário, temos que fazer a obediência civil”, afirmou.

Confira o debate:

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