terça-feira, 24 de novembro de 2015

Direitos minerários x direitos sociais: que as mineradoras paguem o justo

    O presente artigo trata das benesses tributárias concedidas ao setor minerário que tanto explora 
24/11/2015
Por Eulália Alvarenga*

Minas Gerais, mais que qualquer outro estado brasileiro, sofre o efeito colonizador desde que o Brasil foi “descoberto”. O Estado Brasileiro antecedeu à formação da sociedade, tornando-se um instrumento de colonização e dominação. No Brasil, as camadas dominantes jamais renunciaram a seus privilégios, suprimindo desde cedo qualquer levante popular por mais direitos sociais. Tais elites atuam no sistema legal, político e econômico visando manter esses privilégios. Em teoria, o Estado existe para prover a seus cidadãos uma boa qualidade de vida, como disse Aristóteles, mas no entanto, o Estado Brasileiro serve a um seleto grupo de privilegiados.
Minas respondeu por aproximadamente 50% da arrecadação minerária do Brasil [1] em 2013. No entanto, essa arrecadação deveria ser maior, posto que o Brasil é um dos países que cobra os menores royalties sobre a mineração no mundo [2].
Para resolver essa defasagem na arrecadação, é necessário que o Congresso Nacional elabore e aprove o novo marco regulatório para o setor, com respeito a sociedade e ao meio ambiente, e não atendendo aos interesses daqueles que financiam campanhas eleitorais [4]. Também é necessária uma mudança na legislação tributária para que sejam revistas as benesses tributárias para este setor e a implantação de uma fiscalização eficiente. Em MG, um estado com grande atividade minerária o órgão fiscalizador Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPMpossui somente 4 funcionários.
De acordo com relatório do TCU (2011)  [5], de cada quatro áreas onde há extração de minério no País, apenas uma faz o devido recolhimento do royalty de mineração, a chamada Compensação Financeira pela Exploração dos Recursos Minerais –CFEM. O mesmo relatório aponta a quase inexistência de fiscalização desta contribuição pelo DNPM. Presume-se que quem pratica a sonegação de royalties, o faça também com relação a outros tributos, sobretudo imposto de renda (IR) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
A falta de fiscalização é um grande facilitador para estas práticas. Em MG, onde somente a extração de ferro atingiu o volume declarado de 265,7 milhões de toneladas em 2013 [6], é impossível acreditar que,com o número de fiscais que o DNPM possui, seja capaz de efetuar a fiscalização do setor minerário de todo o Estado de MG.
Diversas organizações internacionais têm feito denúncias a respeito de supostas irregularidades (sonegação fiscal decorrente de subfaturamento e/ou preços de transferências com recebimento das diferenças em paraísos fiscais) na exportação dos minérios do Estado de MG e do restante do Brasil (nióbio, ouro, minério de ferro e outros).
Quando se fala em pagamento justo, a proposta vai além do simples pagamento de tributos. Pressupõe-se uma base tributária que proporcione a implementação políticas públicas que assegurem os direitos das pessoas e consiga reverter as desigualdades [7]. Se os recursos minerais são propriedade do Estado, é legítimo exigir que os benefícios da
exploração destes recursos, cujos impactos negativos podem ganhar a dimensão de catástrofes em muitos casos, 
sejam revertidos a favor da sociedade. É necessário que a sociedade, que é a razão de ser do Estado e não o 
contrário, tenha sua contrapartida em função da exploração de recursos minerais.
Minas Gerais: 10 maiores empresas  em relação a Lucro Líquido / 
Recolhimento de Tributo  – Exercício 2014
 
  
Analisando os dados da tabela acima, constata-se que a Samarco Mineração S/A, empresa responsável pelo 
maior desastre ambiental do Brasil ocorrido em Mariana/MG em 05-11-2105 [8], teve, em 2014, lucro líquido 
de mais de R$ 2,8 bilhões, ano em que pagou cerca de R$ 614 milhões em tributos (impostos, taxas e contribuições), 
para os três níveis de governo, gerando apenas2.969 empregos diretos. A Samarco está também na segunda 
colocação no Estado em EBTIDA (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortizações), com cerca de 
R$ 3,7 bilhões [9].
É evidente que as mineradoras brasileiras contam com vantagens significativas, posto que conseguem obter 
rentabilidades extremamente altas com relação a outras atividades industriais, ao mesmo tempo que provocam 
impactos ambientais profundos nas áreas onde a atividade minerária é exercida. O Estado de MG, por ser o 
maior produtor de minérios do Brasil, é o mais prejudicado por tais atividades, sobretudo porque quando os 
recursos escassearem ou perderem valor de mercado em função de redução da demanda, não tem sido 
beneficiado na medida justa em função da exploração dos seus recursos minerais.
O cenário ainda pode piorar em breve, caso seja aprovado o projeto em tramitação no Congresso brasileiro 
do novo código de mineração (Projeto de Lei 5.807/2013 [10]), que tem sido debatido sem considerar as vozes 
da sociedade (movimentos sociais e comunidades envolvidas com a exploração mineral). Há outros agravantes,
como estabelecer que caberá à Agência Nacional de Mineração a autorização de qualquer atividade que cause 
impedimento de atividades minerárias (unidades de conservação, terras indígenas e quilombolas). 
Vale ressaltar que o relator do Projeto de Lei (deputado eleito em MG) recebeu R$ 380 mil das empresas do setor 
minerário na sua campanha eleitoral o mesmo ocorrendo com a maioria dos 31 parlamentares que compõem 
a comissão especial [11].
A sociedade mineira tem, urgentemente, que discutir os rumos do Estado, revendo sua condição eterna de 
colônia, exportadora de minérios brutos sem nenhum valor agregado e exigir que a sua participação seja efetiva 
na discussão do novo Marco Regulatório da Mineração. Exigir que as mineradoras paguem o justo e, o justo vai 
muito além de tributos [12]
Que a atividade minerária possa devolver a sociedade tudo que lhe foi tirado. Que as riquezas do Brasil e de Minas 
sejam para o seu povo!
*Eulália Alvarenga é auditora fiscal de tributos municipais (aposentada), especialista em direito tributário e 
economista; com a colaboração de Rafael Machado,  Geógrafo, Engenheiro Ambiental e Urbano, Auditoria 
Cidadã da Dívida – Núcleo São Paulo. 
Artigo originalmente publicado na página da Auditoria Cidadã da Dívida.
Fonte: Brasil de Fato

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