terça-feira, 26 de novembro de 2019

UFMG homenageia líder histórico de trabalhadores rurais do norte de Minas

A UFMG - Universidade Federal de Minas Gerais, do ICA - Instituto de Ciências Agrárias, campus Montes Claros, presta uma homenagem ao líder histórico dos trabalhadores rurais do norte de Minas, Antônio Inácio Correa, de Januária, que completa 80 anos.

Antônio Inácio Correa nasceu em Januária, na região de Bonito de Minas, em 1939, em um pequeno sítio. Ele cursou até a terceira série, em turmas multisseriadas - 1ª, 2ª e 3ª séries numa sala só, com um quadro negro e uma professora -, na sua comunidade rural. Depois, fez a quarta série na Escola Caio Martins, na cidade. Ele conta que, desde criança foi curioso e lia tudo o que conseguia acessar de papel escrito. Escutando notícias no rádio e participando da vida comunitária foi atinando que as coisas estavam "fora de lugar". Como agricultor familiar frequentava reuniões no Sindicato dos Trabalhadores Rurais. Como católico foi um fervoroso participante de Comunidades Eclesiais de Base. 

Por ser um dos poucos lavradores com leitura e escrita, destacou-se a lavrar atas de reuniões diversas. Foi eleito Secretário do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Januária. Em pouco tempo, virou um ativista da Comissão Pastoral da Terra, na década de 80. E botou a boca no trombone, com força e coragem, ao denunciar as grilagens de terras e expulsão de trabalhadores rurais de suas glebas, em encontros e movimentos estaduais e nacionais.

Em 1984, foi um dos pioneiros ao participar da fundação do MST Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, tornando-se o representante do movimento no norte de Minas. Rodou a região em reuniões e Encontros de luta pela terra. Em ocupações e resistências históricas como em Cachoeirinha, em Varzelândia, e Vereda Grande, em Januária e São Francisco. Quase todos os dias, ele marcava ponto no Fórum de Januária, na Promotoria Pública, ao denunciar a perseguição dos grileiros aos lavradores. Junto com Elói Ferreira da Silva, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São Francisco, formou uma dupla de potentes lideranças daqueles que não tinham voz nem vez.
Eloy foi assassinado em 16 de dezembro de 1984 por grileiros e pistoleiros ligados ao maior latifundiário de Minas, Antônio Luciano. Latifundiários da região anunciavam que esse era um aviso para outras lideranças como Antônio Inácio de Januária e Valdeci de Varzelândia. Valdeci sofreu um atentado, mas sobreviveu.

Antônio Inácio sempre foi de bom diálogo, firme e de muita coragem. Um homem de paz. Conversava inclusive com os algozes, tocando em sua humanidade. Procurava e cobrava de autoridades - policiais, delegados, promotor de justiça, juiz de direito, prefeitos, vereadores - a garantia de direitos de posseiros e lavradores da região. 

Nas décadas de 70 e 80, grandes empresas chegavam na região e queriam tomar conta de tudo. Comprava alguns pedaços de terra e cercavam centenas, milhares de hectares. Ameaçavam os posseiros, queimavam casas, destruíam roças, expulsavam as famílias. Antônio Inácio enfrentava estas situações, denunciando, organizando os trabalhadores na resistência de ficar em suas terras. Sua liderança dava coragem aos companheiros que enfrentavam os invasores.

Em 1984, Antônio Inácio começou a escrever uma coluna no semanário Folha de Januária, jornal independente de uma pequena cooperativa de bancários que abriu espaços para as lutas populares. Em 1988, a Editora Vozes selecionou algumas das suas crônicas e publicou o livro "Um Lavrador no Reino do Latifúndio - a luta secular de Davi contra Golias".
Suas escritas incomodavam a elite local que pressionava a direção do jornal, cortando propaganda devido aos escritos de Antônio Inácio que virou leituras de formação e organização política nos grupos de trabalhadores da região. Alguns anos depois, escreveu  capítulos dos livros “Pioneiros do MST” e “História dos Gerais”.

Eleito presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Januária intensificou ainda mais o seu trabalho. Rodou a região, orientando na fundação de associações e sindicatos de trabalhadores. Participou da fundação da CUT - Central Única dos Trabalhadores como também do Partido dos Trabalhadores, em Januária.

Em palestras e debates públicos sobre questões do campo, em Januária, ele ia pra platéia, cheia de fazendeiros e trabalhadores rurais. Quando abriam a fala, lá estava ele colocando o contraponto, a vivência e parecer dos oprimidos. Criava um desconforto na elite dirigente local. Começou a ser chamado pra compor Mesa, mas não lhe davam a palavra. Ele levantava e falava sem microfone. Temido e respeitado, começaram a ouvi-lo. Puxava  a orelha de bispos e padres que não tinham preferência pelos pobres. 

Sua luta ia muito além da garantia e acesso à terra. Debatia a necessidade da criação de políticas públicas para os agricultores familiares; a formação política da juventude; a democratização dos usos da água; questionava o modelo de desenvolvimento na produção da miséria de muitos, na destruição dos cerrados e veredas. Participou ativamente da organização da Comissão de Direitos Humanos de Januária, nas décadas de 80 e 90.

Aposentou-se. Mas, não da luta e da vida. Tem muito o que ensinar às novas gerações.

Por esses e vários motivos, é justa a homenagem que a UFMG presta a essa liderança histórica dos trabalhadores rurais do norte de Minas e de todo o semiárido mineiro.

Com meu amigo Antônio Inácio, na sua casa, em Januária, saboreando um pouco a sua sabedoria e as lembranças de muitas lutas travadas no Vale do São Chico. 

Leia o convite da Homenagem. 
E vá lá!

Homenagem a Antônio Inácio Correia
O mestrado associado entre a UFMG e a Unimontes em Sociedade, Ambiente e Território 
convida para o Seminário em homenagem a Antônio Inácio Correia.
Nascido em 1939, Antônio Inácio Correia é agricultor, foi presidente do Sindicato de 
Trabalhadores Rurais de Januária. Autor do livro “Um lavrador no reino do latifúndio” e 
de capítulos dos livros: “Pioneiros do MST” e “História dos Gerais”.
Nos anos de 1970 e 1980, carvoeiros e grileiros chegaram aos gerais do Norte de Minas 
devastando os cerrados e expulsando agricultores da terra. Naquela época, Antônio dirigia 
o Sindicato de Trabalhadores Rurais de de Januária. Ele liderou a luta em defesa na 
natureza e da agricultura familiar da região, organizando a resistência à tomadas de 
terras e à destruição dos cerrados e veredas.

Data: 26 de novembro, às 14h
Local: Auditório do Bloco C – Instituto de Ciências Agrárias da UFMG
Avenida Universitária, 1.000 - Bairro Universitário - Montes Claros - MG 
Fone: (38) 2101-7710
O evento é gratuito e aberto ao público.

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