sexta-feira, 23 de março de 2018

O poder é podre!


Celso Freire*


Minhas amigas, meus amigos: quero conversar com vocês sobre o poder; essa coisa que quer ser mais do que tudo. 

Com licença... Hobbes, Arendt, Foucault, Weber, Bourdieu e tal e tal... Quero falar por mim mesmo, pelo sangramento que esse trem, esse troço, esse trosso tem causado às minhas alegrias.

O poder é podre. Nem é preciso trocar de lugar, o “erre” e o “e “, para o “poder” ficar “podre”: O poder já é podre por natureza. Ele nasce podre na raiz, motivo motriz pra sobreviver... O dito cujo, agarra-se na lama e afana a fama pra esconder sua essência. Alastra-se e enrama nos cofres, nos catres, nos ralos, nas rampas, nas camas... Nas malas e nas ralas cuecas de ratos, rainhas e reis.

Ah! O poder não sacia: sua garganta é profunda; sua barriga, um poço sem fundo. O danado não tem a saída da bunda, não tem “culo”, não defeca: infecta! E de tanto engolir: empanzina, decompõe e recompõe-se do seu esterco interior!

Festivo, ferino, felino, fedido, fétido: tem glamour, é esperto, cheira mal! O poder caga dentro de si mesmo. É a parte estragada da coisa, ou melhor: o poder é a própria coisa! E a coisa é feia! Permeia-lhe uma teia de aranha e seu visgo nojento arranha mentes e corações.

O poder submete as fracas vidas à sua doutrina e as domina... molha as mãos das rés, na propina.... Desatina, afina e desafina... A mim: desanima! Invade os cortiços da lei e a assassina! Sabe: O poder não morre: regenera... Mina! Combalido: no suspiro final, reanima. Muda de roupa, muda de fala, muda de dono, muda de pênis, muda de vagina, muda de clima: mas não larga sua tática de rima.

O poder dificulta, facilita, impõe, faz de conta, mas não abre mão, da sua podridão! O poder precisa de rebanhos pra pastorear! O poder seduz, é narciso. O poder é caralho: ejacula na nossa cara o pus da sua inflamação.

Se há poder, há mau cheiro aprisionado: mais longe ou mais perto; mais simples ou mais complexo, a granel ou no atacado, há poder cagado, há poder mijado.

É podre o poder de César. Fede o poder do Czar. É podre o poder do carrasco. Fede o poder do código...
É podre o poder da guerra. Fede o poder da trégua. É podre o poder da regra. É podre o poder da força bruta... É podre o poder invisível que não se vê!
Fede o poder do tribunal, fede o poder da catedral... É fétido o poder do Salão Oval... 
É podre o poder no planalto central do país!
Cheira mal o poder da esquina. Fede o poder da latrina, sob as pálpebras do meu nariz...
O poder da política é podre... O poder do capital é podre... Fede o poder da mídia... O poder da fome apavora!


Sabe, gente: Poder não rima com liberdade!

A justiça, essa sim, é livre e cheira a cravo... A paz é livre e cheira a lírio... A fé é livre e cheira a água.... A verdade é livre e cheira a terra... O amor é livre e cheira a canela...
Foda-se o poder: eu vivo de liberdade!
Texto de Joaquim Celso Freire Silva. Original presente em "Um Silva de A a Z", Alpharrabio Edições, 2007, como narrativa do personagem Jose Silva. 
Essa versão, de março de 2018, com pequenas alterações no texto, se mantém fiel à ideia original.
Publicado em 22.03.2018, na sua página de Facebook.


*Quem é Celso Freire 

Joaquim Celso Freire Silva nasceu em 19 de maio de 1952, na comunidade rural de Olhos D´Água, em Coronel Murta, no Vale do Jequitinhonha, nordeste de Minas. Aos 7 anos,  seus pais mudaram-se pra cidade para os filhos estudarem. Lá , passou sua infância e adolescência. Foi professor do primário, em  Fronteira dos Vales, no Vale do Mucuri. Mudou-se pra São Paulo, onde vive há mais de 40 anos.
É professor, poeta, escritor, compositor, administrador de empresas, mestre da PUC SP em políticas públicas e desenvolvimento regional. É professor da USCS - Universidade Municipal de São Caetano do Sul. Foi pró-Reitor de Extensão da USCS, por 12 anos.
Presidente do Conselho Diretor da Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC, de junho de 2016 até abril de 2017.
Publicou os seguintes livros: Fazendo poeira, Poesias, 1997; Versos Avessos, 2004; Políticas Públicas no Vale do Jequitinhonha: a difícil construção da nova cultura politica regional, 2005;  Um Silva de A a Z, poesia e prosa, 2007; O rio das minhas manhãs, poesia e prosa, 2013; Meu pé de alecrim deu fulô, prosa, 2015.

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