terça-feira, 24 de dezembro de 2019

A benzeção e a cura pelas plantas

AS PLANTAS E A BENZEÇÃO
Imagem se encontra na obra " Caminhos da Arte Popular: O Vale do Jequitinhonha" de Ângela Mascelani

Os jovens estudantes secundaristas da EFA apontam, de acordo com o Plano de Estudos, manifestações que ainda existem com certo vigor nas comunidades, e outras que, ao contrário, estão enfraquecendo ou já se extinguiram como as manifestações de pastorinhas, quadrilhas e brincadeiras infanto-juvenis.
Interessante notar que os jovens secundaristas, preocupados com as ameaças de extinção de algumas manifestações culturais, parecem motivados para resgatar as tradições, como é o caso do uso das plantas medicinais e as benzeções. Tal posição ficou evidente a partir de uma roda de conversa entre os universitários e os secundaristas da EFA que levaram amostras de plantas medicinais e discorreram sobre suas características.

Na continuidade das atividades, houve momentos, também, de conversas acerca do ato de "benzer" ou "rezar", como alguns ainda falam. Trata-se de um processo que pressupõe conexão espiritual por meio de orações e outros rituais, como com plantas, voltados para a cura. A benzeção está diretamente ligada a fé, independente da religião que a pessoa professe, e é comum na região do Vale Jequitinhonha, bem como em outros lugares do estado e até do país. Procurar a pessoa que reza para cuidar de um mal-estar, enfermidades, ou até mesmo quando se perde algo importante, é tradição na região que se recorra à benzeção. No ato de benzer em sim, os benzedores e benzedeiras usam sempre um objeto em suas mãos, seja ele um ramo de planta, uma fita, uma peça de ferro. Justificam que o objeto absorve a malignidade e favorece, assim, o equilíbrio do corpo e do espírito do benzido. Ainda, ao final do ritual, costuma-se recomendar chás e remédios alternativos, naturais, conservados em garrafas, homeopáticos ou fitoterápicos, sejam para beber ou passar no corpo. Assim, as plantas compõem o cenário destas práticas.
Ainda como atividade do TC, foi debatido também se a fé das pessoas está comprometida, o que, teoricamente, atrapalharia na preservação da tradição. Na trilha das crenças pessoais, os participantes foram levados a refletir sobre algumas questões. Perguntados sobre o que fariam se fossem acometidos por uma picada de uma cobra venenosa, 50% dos jovens presentes chamariam o SAMU. No entanto, 33% procuraria o rezador ou rezadeira. No debate sobre o ofício de benzedor/benzedeira poderia ser reconhecido como profissão, 75% consideram que não sob a justificativa de que se trata de uma dádiva, um dom, em que o(a) escolhido(a) não repassa para qualquer pessoa, da mesma forma que não se aprende. Entendem que há uma espiritualidade envolvida e que o benzedor ou benzedeira são predestinados. Os demais, sobre essa última questão, consideram sim o ato de benzer uma profissão, pois apesar do rezador (rezadeira) não ser remunerado(a), dedicam a vida inteira em ajudar o próximo, em um trabalho de muita responsabilidade.
Na continuidade das discussões, o tópico passou a ser a efetividade das plantas medicinais e os benefícios do remédio de farmácia. Nesse debate surgiram vários exemplos de efeitos curativos das plantas medicinais, mas compreendem que uma planta não consegue resultados emergenciais, com rapidez, enquanto o alopático atende melhor às emergências. Citaram exemplos como o de uma das estudantes que sofreu depressão e, apesar dos vários chás caseiros preparados pela mãe não melhorava. Por outro lado, a partir do momento que iniciou um tratamento alopático sentiu-se melhor.
Ao final dos debates propostos no encontro, nota-se que o interesse desses jovens em conhecer melhor as plantas medicinais - quanto ao uso, o cultivo e à manipulação - impressiona, bem como a curiosidade pelas tradições da benzeção. Embora divirjam-se no quesito de resolução imediata, demonstram muito respeito e consideração por aqueles que conduzem ensinamentos tão valiosos para as comunidades.
REFERÊNCIAS:
MASCELANI, Ângela. Caminhos da Arte Popular: O Vale do Jequitinhonha/Ângela Mascelani. Rio de Janeiro: Museu Casa do Pontal, 2008

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