terça-feira, 13 de novembro de 2012

Teoria do "Domínio do Fato" vira tema de fundo da Justiça brasileira


Os juízes do Supremo Tribunal Federal acabam de ser condenados. E pelo próprio teórico da argumentação usada no julgamento da Ação Penal 470. Criador da tese do "domínio do fato", o jurista alemão Claus Roxin concedeu importante entrevista à Folha de S. Paulo, publicada neste fim de semana – um depoimento, ao que consta, que estava pronto havia duas semanas, mas que só saiu agora, após as condenações. 

Segundo Roxin, para condenar alguém que ocupe posição hierárquica superior em determinada organização, não basta pressupor que este indivíduo tivesse a obrigação de saber o que faziam seus subordinados. "Quem ocupa posição de comando tem que ter, de fato, emitido a ordem. E isso deve ser provado". Roxin também fez um alerta sobre julgamentos transformados em espetáculo. "O juiz não tem que ficar do lado da opinião pública", alertou.

Um dia depois, nesta segunda-feira, o jornal Valor Econômico publicou outra reportagem de peso, informando que a nova jurisprudência do mensalão, usada para condenar José Dirceu, deixa bancos e empresas apreensivos.

E a maior preocupação diz respeito à leitura feita pelo STF – equivocada, segundo o autor da teoria – da tese do domínio do fato. "O temor de advogados e empresários é o de que a teoria passe a motivar uma série de processos por crimes econômicos que coloquem, entre os réus, executivos e administradores de empresas, pelo simples fato de que, em posição hierárquica superior, eles teriam, necessariamente, o domínio do fato", informa o Valor.

Dificilmente, o STF fará um mea culpa em relação ao uso equivocado da teoria. No julgamento, o ministro Luiz Fux chegou até a inverter o ônus da prova, sugerindo que cabia a alguns acusados comprovar que não tinham envolvimento com determinadas acusações. Na sessão desta segunda, que sacramentou as penas dos réus do núcleo político, Celso de Mello enfatizou que os réus não estavam sendo condenados em função de uma teoria qualquer, mas de provas colhidas nos autos – mas o fato é que o discurso mudou.

Em breve, o acórdão estará publicado e será consultado por centenas de juízes e promotores, em outras ações judiciais que transcorrem pelo Brasil afora. Na nova era judicial que se descortina no Brasil, o "teje preso" será muito mais comum do que se imagina. Com ou sem provas.


Entrevista na Folha de S. Paulo:

PARTICIPAÇÃO NO COMANDO DE ESQUEMA TEM DE SER PROVADA

Entrevista Claus Roxin

Um dos responsáveis por teoria citada no julgamento do STF, jurista alemão diz que juiz não deve ceder a clamor popular

CRISTINA GRILLO 
DENISE MENCHEN 
DO RIO

Insatisfeito com a jurisprudência alemã -que até meados dos anos 1960 via como participante, e não como autor de um crime, aquele que ocupando posição de comando dava a ordem para a execução de um delito-, o jurista alemão Claus Roxin, 81, decidiu estudar o tema.

Aprimorou a teoria do domínio do fato, segundo a qual autor não é só quem executa o crime, mas quem tem o poder de decidir sua realização e faz o planejamento estratégico para que ele aconteça.

Roxin diz que essa decisão precisa ser provada, não basta que haja indícios de que ela possa ter ocorrido.

Nas últimas semanas, sua teoria foi citada por ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) no julgamento do mensalão. Foi um dos fundamentos usados por Joaquim Barbosa na condenação do ex-ministro José Dirceu.

“Quem ocupa posição de comando tem que ter, de fato, emitido a ordem. E isso deve ser provado”, diz Roxin. Ele esteve no Rio há duas semanas participando de seminário sobre direito penal.

(…)

É possível usar a teoria para fundamentar a condenação de um acusado supondo sua participação apenas pelo fato de sua posição hierárquica?

Não, em absoluto. A pessoa que ocupa a posição no topo de uma organização tem também que ter comandado esse fato, emitido uma ordem. Isso seria um mau uso.

O dever de conhecer os atos de um subordinado não implica em co-responsabilidade?

A posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato. O mero ter que saber não basta. Essa construção ["dever de saber"] é do direito anglo-saxão e não a considero correta. No caso do Fujimori, por exemplo, foi importante ter provas de que ele controlou os sequestros e homicídios realizados.

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