Terra Deu, Terra Come encantou o Brasil e o mundo
Direção: Rodrigo Siqueira
Pedro de Almeida, garimpeiro de 81 anos de idade, comanda como mestre de
cerimônias o velório, o cortejo fúnebre e o enterro de João Batista, que morreu
com 120 anos. O ritual sucede-se no quilombo Quartel do Indaiá, distrito de Diamantina,
Minas Gerais.
Com uma canequinha esmaltada, ele joga as últimas gotas de cachaça sobre
o cadáver já assentado na cova: "O que você queria taí! Nós não bebeu ela não, a sua taí.
Vai e não volta pra me atentar por causa disso não. Faz sua viagem em paz".
Dessa maneira acaba o sepultamento de João Batista, após 17 horas de velório,
choro, riso, farra, reza, silêncios, tristeza. No cortejo, muita cantoria com os versos dos
vissungos, tradição herdada da áfrica. Descendente de escravos que trabalhavam na extração
de diamantes, nas Minas Gerais do tempo do Brasil Império, Pedro é um dos últimos conhecedores
dos vissungos, as cantigas em dialeto banguela cantadas durante os rituais fúnebres da região,
que eram muito comuns nos séculos 18 e 19.
Garimpeiro de muita sorte, Pedro já encontrou diamantes de tesouros enterrados pelos
antigos escravos, na região de Diamantina. Mas, o primeiro diamante que encontrou, há 70 anos,
o tio com quem trabalhava o enterrou e morreu sem dizer onde. Depois disso, vive sempre em uma
sinuca: para reencontrar o diamante só se invocar a alma de seu tio João dos Santos. "É um
diamante e tanto, você precisa ver que botão de mágoa." Ao conduzir o funeral de João Batista,
Pedro desfia histórias carregadas de poesia e significados metafísicos, que nos põem em dúvida
o tempo inteiro: João Batista tinha pacto com o Diabo?; O Diabo existe?; estamos sozinhos, ou
as almas também estão entre nós?; como Deus inventou a Morte?
A atuação de Pedro e seus familiares frente à câmera nos provoca pela sua dramaturgia espontânea,
uma auto-mise-en-scène instigante. No filme, não se sabe o que é fato e o que é representação, o que
é verdade e o que é um conto, documentário ou ficção, o que é cinema e o que é vida, o que é
africano e o que é mineiro, brasileiro.
Terra Deu, Terra Come é um filme cheio de encantos e encantamentos. Pedro de Alexina, 81 anos,
comanda como mestre de cerimonias o funeral de João Batista, morto aos 120 anos. Documentário,
memória e ficção se misturam para tecer uma história fantástica que retrata um canto metafísico do sertão
mineiro. É preciso ver para crer.
Entre 2010 e 2011 o Terra Deu, Terra Come conquistou os mais relevantes prêmios consagrados aos
documentários no Brasil. Também recebeu o reconhecimento dos mais importantes críticos de cinema
do país.
TERRA DEU TERRA COME venceu o prêmio International Young Talent Competition - Generation DOK -
no 53º DOK LEIPZIG, Alemanha, um dos mais tradicionais e importantes festivais de documentários da
Europa. Eis as palavras do júri do festival: "O filme vencedor levou os juízes a um mundo completamente
desconhecido (e evidentemente quase esquecido). Seu personagem central —um indivíduo admirável
e mesmerizante— é o tipo de pessoa que provavelmente só aparece uma vez na vida de um documentarista.
O registro de sua ligação com um mundo de rituais e mitos, à beira do desaparecimento, é a um tempo
fascinante e de relevância histórica. O filme claramente se beneficiou do acesso exclusivo (do diretor ao
personagem), ganho ao longo de um período de tempo extenso e trabalhado com grande senso artístico.
O filme expõe um mundo sobre o qual nada conhecíamos, e o faz de uma maneira encantadora, prazerosa e, por vezes, emotiva, que certamente descortina um novo território e abre as portas para uma verdadeira experiência de documentário."
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