sexta-feira, 1 de abril de 2011

As profundas mudanças no campo popular brasileiro

As profundas mudanças no campo



popular brasileiro

Estou procurando retratar,
em notas recentes, a profunda mudança que vem revirando o
campo popular brasileiro.

Estamos virando uma página importante da história política
do país.
Na década de 1980, as pastorais sociais, movimentos sociais e sindicatos se constituíram no
bastião das lutas por direitos e democratização do país. Contudo,
na década seguinte houve uma inflexão importante.
As pastorais sociais acusaram o golpe da crise de identidade (que se
arrasta até hoje). Não sabiam mais se eram apoio, motivação ou
assessoria. As bases sociais que apoiaram, mobilizaram e formaram
tinham ganhado asas. Se transformaram em CUT, em MST e outras mega-organizações, com financiamento próprio.

Algumas pastorais chegaram a exigir respeito a alguns desses movimentos, sentindo que se transformavam em meros suportes moral e material, sem
qualquer direito a falar.
Em seguida, veio a crise de financiamento das ongs e movimentos sociais.

O MST foi um dos poucos que conseguiram se manter independentes.
A grande maioria capitulou e passou a firmar convênios com governos
para poder sobreviver financeiramente. Se alteraram por dentro. Se
transformaram em pequenas empresas de serviços públicos
terceirizados.

A composição interna mudou. De luta por direitos, a grande maioria dos
funcionários dessas ongs passaram a se perceber funcionários. O ideal
político foi substituído pelo ideal profissional.
Muitas ongs (antes movimentos sociais) vivem à beira de um racha
interno, entre a diretoria da velha guarda politizada e os técnicos
jovens despolitizados e com aspirações profissionais.

O MST, agora, já acusa o golpe da ascensão social dos últimos anos.
Sua base de arregimentação seca aceleradamente. O campo é o setor
econômico que mais perde pobres, agora classe média baixa.
Os acampamentos em beira de estrada minguam.

O movimento sindical, por seu turno, ingressou na era do
neocorporativismo. Definem ministros e seus assessores, recebem
verbas milionárias a partir de convênios com o governo federal, dirigem
o FAT, tornam-se conselheiros de estatais, indicam ou controlam
agências reguladoras. Não se trata do jargão direitista da "República
Sindical", gasto pelo uso e abuso pelo golpe militar.

Trata-se de um fenômeno de tipo europeu que Phillippe Schimitter
denominou de neocorporativismo, quando a estrutura sindical opera
recursos em arenas de negociação com agências públicas, grandes
corporações e empresas nos segmentos e arranjos setoriais da
indústria, comércio, serviços, agricultura.
Definem, enfim, a pauta governamental.

A resultante política desta nova prática sindical é o afastamento
gradativo da direção em relação à sua base sindical e a mudança
gradativa de sua pauta.
As direções diminuem a alternância de poder e a preocupação com
a formação de novas lideranças. Envelhecem. Passam a disputar
seus privilégios como se fossem direitos. Não admitem que suas
indicações e pautas sejam rejeitadas pelos governos, qualquer que
seja o partido ou ideologia de plantão.

Enfim, a mudança em nosso país é das mais radicais. E temos que
compreender que o que era inovação na redemocratização do país
pode ser, hoje, anacrônico.

Texto do Rudá Ricci, professor universitário, sociólogo, doutor
em ciências sociais. Publica o Blog De esquerda em Esquerda,
de onde foi lambido essa análise.

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